30.5.05

Já sonho com Ngorongoro XVI


Joris van Daele

Ninguém conhece a história da próxima aurora.
(provérbio africano)

Ontem sentei-me no jardim a falar com o Andwele. Tu dormias, assim como o Bagaço, e nenhum sonho parecia querer despertar-vos. Pedi-lhe que me falasse da sua aldeia. Ele falou num tom sério, falava de saudade e de desgosto, mas terminava sempre todas as frases com uma nota de alegria. Não me cansava de ouvir falar de Magadi. Os olhos dele ficavam cada vez mais límpidos, e através dos seus olhos, também os meus. O Andwele tem uma boca bonita e um sorriso gracioso, emana paz. E assim com ele, pouco a pouco, xhuia-xhuia, a paz voltou.
Por volta das seis horas da manhã, acordei com o pássaro que canta debaixo da minha varanda. Existe uma gaiola dourada enorme e sobre ela pousa sempre esse pássaro. É uma ave canora rara. Pensei decidiu desafiar o mundo tomando posse dessa gaiola. E com esse pensamento, descobri que sorria novamente.

Depois o reflexo desta luz, deste amanhecer nas águas da piscina. E não resisti a apossar-me dela. Durmam todos e que nenhum sonho vos desperte. Não quero tudo. Só este momento. Assim.

Ouço ao longe uma música.


Banda sonora de Le Grand Blue, Eric Serra.

28.5.05

Confissões Sexuais de Um Anónimo Português V


Joris van Daele

Repeti o 11° ano, repeti o 12°, voltei a repetir o 12° para melhorar a média, mas com 20 anos consegui entrar em Engenharia dos Têxteis na Covilhã.

Não se pode dizer que não me tenha servido para nada essa experiência. Para além de ter ficado a odiar climas frios, nunca mais perdi um certo pragmatismo que me foi muito útil para o resto da vida. E lamentavelmente, foi pouco tempo depois de sair da Covilhã que descobri que estava com um início de tuberculose. Aqueles ares até me podiam ter feito bem.

Mas mal vi a Paola percebi que tinha que a seguir. A Paola era uma estudante de design industrial que apareceu na Covilhã para pesquisar técnicas de tecelagem tradicionais e a evolução dos processos de fabrico a partir das formas originais. Eu vi logo que era imperativo conhecer e pertencer ao mundo que produzira uma pessoa com aquela beleza e encanto e mistério e reserva e sentido estético. Tive dificuldade em acreditar quando me disse que era virgem e ainda mais, quando salientou que estava noiva. A minha história com ela é longa e marcada por rudes afastamentos e ternas aproximações. Foram necessários mais de doze anos para que ela aceitasse deitar-se comigo.

Vivi assim numa castidade quase absoluta entre os vinte e os trinta e dois anos. De início, a abstinência era-me penosa, mas depois fui-me habituando e deixei de pensar nas mulheres. Em contrapartida, as minhas ocupações e as minhas leituras profissionais, as conversas com gente instruída e inteligente, que não falta em Milão, tornavam-me a vida interessante. A minha saúde era bastante boa; continuava a ter um peito débil e a ser nervoso, mas a tuberculose já não me ameaçava. As poluções nocturnas iam rareando; ocorriam, ao princípio, uma vez por semana, depois uma vez de quinze em quinze dias, e por último, à volta dos trinta anos, uma vez de vinte em vinte dias ou de mês a mês. Eram sempre acompanhadas por imagens dos orgãos sexuais da mulher. Contrariamente ao que tinha lido em livros, verifiquei, pela minha própria experiência, que o instinto sexual é tanto mais estimulado quanto mais satisfeito for e que se apazigua, se acalma, quando se presta menos atenção aos seus apelos. Embora pareça estranho, é indubitavelmente assim que se passam as coisas. Quantas mais vezes se pratica o coito, tanto mais se deseja renová-lo.

Comprovei-o bem nas minhas relações com a Paola. Era logo após vários coitos seguidos e esgotantes que o desejo se tornava mais acutilante, mais agudo, à medida que se tornava difícil satisfazê-lo. E o coito normal já não satisfaz a imaginação excitada: procura-se toda a sorte de refinamentos, de perversões. Neste aspecto, não sou uma excepção, todos os homens me disseram que tiveram uma experiência idêntica.

[Neste capítulo as Confissões sexuais de um anónimo português e de um anónimo russo colaram-se uma à outra. Se preferirem as do russo, e estão no vosso direito, repito que é a ASA que as publica.]

26.5.05

Já sonho com Ngorongoro XV


Henk Braam

Devia juntar-me às outras pessoas e sentar-me no chão para comer o arroz e os legumes. Mas o que desejava era comer sozinha à sombra das árvores. O Sacerdote olhou para mim fixamente. Era impossível permanecer indiferente àquele olhar tão antigo. Percebi que deveria segui-lo. Olhei para a minha mãe que susteve a respiração. Sem palavras, transmitiu-me a mensagem. Não faças disparates, não fales, escuta apenas. Em silêncio segui-o. Andamos mais de uma milha. Não proferiu uma única palavra. E assim chegamos às margens do Ganjes, sei que era o Ganjes. Então ele continuou a caminhar. Seguiu em frente, atravessando a pequena maré, como se esta não exigisse uma pausa. E quando pensava que talvez tivesse enlouquecido, parou, virou-se e, olhando à sua volta, disse: dharma! dharma!
Ali, naquele local sagrado, lembrava-me que havia um modo correcto de viver.

Delirei bastante certamente. Mas estas imagens eram recorrentes. O rosto desse Sacerdote, eu menina. E depois ouvir a tua voz e perceber aquele rosto. O meu Sacerdote era o Imam! Hinduismo e Islamismo tinham o mesmo rosto! Templos e Mesquitas, Brama e Alá, Vedas e Alcorão, fundidos no sonho delirante de uma católica romana perdida em Zanzibar. Mas sei que o meu passado distante tocou todos esses mundos. Terei sido algum dia aquela menina? Esse homem será aquele que me guia em todas as vidas?

Começo a sentir-me mais forte mas continuo confusa. No meu sonho o Sacerdote cantava um hino: "tocai a concha, acendei o incenso". E o Imam dizia "toda a ventura que te ocorra emana de Deus; mas toda a desventura que te açoita provém de ti." Avisos. Sob a forma destas vozes profundas, tão meigas. Avisos. Vocês sentem esta humidade? bin, bagaço, Andwele!
Acho que preciso de mais repouso!

A Divina

Afinal também vão poder ouvir a interpretação da Divina Callas



E quem resiste?

25.5.05

Mon coeur s'ouvre à ta voix


Keith Nicolson

Sansão e Dalila

Eu disse que era a mais bela das canções de amor. Não a consegui encontrar cantada pela Maria Callas. Para compra, é obrigatório que seja ela. Hoje, aqui, vamos ouvir Cindy Boote. Mon coeur s'ouvre à ta voix. A canção de Dalila.

Adenda:
Afinal consegui a Callas...




Mon coeur s'ouvre à la voix, (My heart opens to your voice)
comme s'ouvrent les fleurs (like the flowers open)
Aux baiser de l'aurore! (To the kisses of the dawn)
Mais, ô mon bienaimé, (But, o my beloved)
pour mieux sécher mes pleurs, (To dry my tears the best)
Que ta voix parle encore! (Let your voice speak again)
Dis-moi qu'à Dalila (Tell me that to Dalila)
tu reviens pour jamais, (You will return forever)
Redis à ma tendresse (Repeat to my tenderness)
Les serments d'autrefois, (The oaths of other times)
ces serments que j'aimais! (the oaths that I loved)
Ah! réponds à ma tendresse! (Ah! respond to my tenderness)
Verse-moi, verse-moi l'ivresse! (Pour out to me the drunkeness)

Ainsi qu'on voit des blés (Like one sees the wheat)
les épis onduler (the blades undulate)
Sous la brise légère, (Under the light breeze)
Ainsi frémit mon coeur, (So trembles my hear)
prêt à se consoler, (ready to be consoled)
A ta voix qui m'est chère! (by your voice which is dear to me)
La flèche est moins rapide (The arrow is less quick)
à porter le trépas, (to carry death)
Que ne l'est ton amante (Than is your love)
à voler dans tes bras! (to fly into my arms)
Ah! réponds à ma tendresse! (Ah! resond to my tenderness)
Verse-moi, verse-moi l'ivresse! (Pour out to me the drunkeness)

Já sonho com Ngorongoro XIV na Mega Fauna


Zanzibar
Sã e salva!

Marhaba, invasor!
Deixo-te esta música para que compreendas como me sinto em paz. E fico a aguardar que abandones este lugar que ocupaste de forma tão abusiva.


Rokia Trouré

24.5.05

À escuta #5

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O companheiro de viagens da Maria, um tal de bin_tex, diverte-se a fazer-lhe estas perguntas. A minha sorte foi ele não o ter feito em árabe.

Tamaño total de los archivos de música en mi ordenador?
Tamanho total dos arquivos no meu computador?
Não acedo ao disco duro da MRF. Mas hei-de conseguir.

Último disco que me compré:
Último disco que comprei:
Damien Rice.

Canción que estoy escuchando ahora:
Canção que estou a escutar agora
Sorry, mas nenhuma, é tarde, e os vizinhos já ameaçaram várias vezes chamar a polícia.

5 canciones que escucho un montón o que tienen algun significado para mí:
5 canções que ouço frequentemente ou que têm algum significado para mim
Brel, Brel, Brel. A última mais ouvida: Les coeurs tendres.
Elis Regina, Elis sempre. A que ando a trautear: Bocochê (com Baden Powell) minina bonita pr' onde é q' você vai, vou procurar o meu grande amor no fundo do mar.
Mercedes Sosa. Do primeiro álbum: Gracias a la vida. E todas as que se seguiram.
Camille Saint-Saëns, retirada de Sansão e Dalila, Mon coeur s'ouvre à ta voix. A mais bela canção de amor de todos os tempos. (mas tem de ser a Callas a cantá-la)
Gustav Mahler, Do Canto da Terra, A canção do Adeus. Conheço ao detalhe os 31 minutos desta ária. Para ficar em lágrimas: os minutos 17 a 21. (aconselhável uma versão com Janet Baker e James King)

E sim, estes são gostos que partilhamos, eu e a MRF.

Y como no quiero ser menos que mi predecesor, aquí lanzo el testigo a otros 5 bloggers:

E como não quero ser menos do que o meu predecessor, aqui lanço o testemunho a outros cinco bloggers:
O Bagaço
O Batatas
O Januário
O Kimikkal
A Ananda

Razões para a escolha:
Todos odeiam estes questionários (a MRF iria poupá-los, de certeza)
... mas sei que nos vão dar excelentes sugestões.

Confissões Sexuais de Um Anónimo Português IV


Keith Nicolson

Mas foi por essa altura que a ideia de despir uma rapariga e ver e tocar e sentir o corpo feminino apareceu. Nunca mais me vi livre dessa ideia.

Entre os treze e os vinte anos, tive frequentes experiências sexuais. Foram sete anos de satisfatória exploração. Houve, no entanto, por razões involuntárias, períodos de abstinência. Nessas ocasiões, à razão de três ou quatro vezes ao dia, recorria à masturbação e, em média, tinha duas ou três poluções nocturnas. A minha cabeça fervilhava com imagens eróticas, tudo era fetiche, ficava horas a imaginar situações estranhas e exóticas. Todas estas fantasias resultaram, obviamente, em dificuldades escolares.

Repeti o 11° ano, repeti o 12°, voltei a repetir o 12° para melhorar a média, mas com 20 anos consegui entrar em Engenharia dos Têxteis na Covilhã.

23.5.05

Os espelhos do tempo


Guy Bourdin

P: Como são as memórias que surgem durante a regressão?
R: Existem duas maneiras de aceder às memórias de vidas passadas e de as descrever. A primeira é através do padrão clássico, em que a pessoa entra apenas numa vida e é capaz de captar uma imagem extremamente completa e pormenorizada dessa vida e dos seus acontecimentos. O dia é 22 de Maio de 2005, vejo um estádio cheio de gente, o Benfica está a jogar...
O segundo padrão de evocação de vidas passadas é aquele a que chamo encadeamento de momentos-chave. 38'- Golo do Benfica. Simão na marcação de uma grande penalidade, por mão na bola de Cadú dentro da grande área do Boavista, fez o 0-1.
42'- Golo do Boavista. Na sequência de um canto do lado esquerdo do ataque do Boavista, Éder, sem marcação, rematou de cabeça e fez a igualdade a 1-1.
45'- Termina a 1ª. Parte: Boavista-Benfica (1-1).
“FLASHES” DO JOGO (2ª Parte):
57'- Substituição no Boavista. Entrou Hugo Almeida e saíu Cafú.
61'- Substituição no Boavista. Entrou Diogo Valente e saíu Guga.
69'- Substituição no Benfica. Entrou João Pereira e saíu Geovanni.
77'- Substituição no Benfica. Entrou Mantorras e saíu Nuno Assis.
86'- Substituição no Boavista. Entrou Nélson e saíu Zé Manuel.
90'- Substituição no Benfica. Entrou Bruno Aguiar e saíu Nuno Gomes.
90'- Termina o jogo: Boavista-Benfica (1-1).
O BENFICA SAGRA-SE CAMPEÃO NACIONAL!

A MRF deve estar verde de raiva, mas nas minhas próximas vidas, mesmo que assuma a forma de uma mulher, este dia ainda vai ter uma importância qualquer. Para mim, para ele e para todos os benfiquistas de gema! como este e este e este e este e este e Este! e Esta! e...
[cumprimentos ao Brian Weiss e ao jornal O Jogo]

Confissões Sexuais de Um Anónimo Português III


Theo Keijzers

Antes de começar a dominar a situação fui vítima de abuso sexual e isso deixou-me um pouco confuso.

Aconteceu quando uma vizinha mais velha do que eu - ela teria uns treze e eu onze ou doze anos -, me apalpou. Fomos para a Torreira fazer um piquenique e como o pai dela não tinha carro, viajamos todos no Fiat 600 do meu pai. No banco de trás iam as duas mães e quatro crianças, a minha irmã e a irmã dela ao colo e nós os dois entalados contra uma das janelas. Foi aí que com a maior lata do mundo, ela começou a tactear e encontrou algumas vezes o que queria encontrar. Eu fiquei paralisado. Chegados ao destino, era como se não tivesse acontecido nada!? Na volta, tentei escapar mas sentaram-nos no mesmo sítio. A sorte foi que ela entretanto tinha apanhado um escaldão e até passou o tempo todo a queixar-se de que ia apertada. Comecei aí um ódio de estimação e até tinha pesadelos em que ela me aparecia. Mas foi por essa altura que a ideia de despir uma rapariga e ver e tocar e sentir o corpo feminino apareceu. Nunca mais me vi livre dessa ideia.

20.5.05

Confissões Sexuais de Um Anónimo Português II


Isach Oslo via Imagens

Por volta dos dez anos apaixonei-me.
Até aí gostava apenas de estar com ela, a Alice chegava e começavam logo as brincadeiras e as gargalhadas. Com a paixão, as coisas complicaram-se. Sonhava com ela, sofria se ela não aparecia aos Domingos, estranhava uma espécie de agitação que começava a acontecer no meu corpo. Mas só soube que era paixão porque a minha irmã, involuntariamente, me disse. Com um ar trocista perguntou-me se eu não andava pelo beicinho e então percebi que finalmente estava a acontecer essa coisa a que todos davam alguma importância, tanta que desde miúdo me perguntavam se tinha namorada. Mas a paixão deu cabo da minha relação com a Alice. Como era minha prima ninguém achou muita piada, além de que a certeza de que ela já sabia ou ia saber que eu passava o tempo todo a pensar nela - e como isso era humilhante! -, fez com que eu começasse a agir de forma tão brusca e violenta com a Alice, que ela passou - imaginava -, a não gostar de mim, e ninguém pode continuar apaixonado por alguém que não gosta de nós.

O pior de tudo foi a conversa que o meu pai teve comigo. Explicou-me meia dúzia de coisas sobre os factos da vida, sendo que a moral da história era "aindas és um puto mas daqui a pouco vais deixar de ser, e o melhor é arranjares namoradas que não sejam da família, espero que muitas, as mulheres são todas diferentes, cada uma tem o seu encanto, e um tipo só vive uma vez, não sejas burro, goza muito antes de casar, que depois de casar também é possível mas é mais complicado, e mais depressa do que imaginas envelheces e depois um tipo já não é o mesmo, mas és muito novo para perceberes isto, e portanto já sabes que se quiseres falar comigo estás à vontade, sou o teu pai, já vivi muito, ahahah, por acaso diverti-me à brava com as miúdas quando era novo, eu e o teu tio, o pai da Alice, que a tua mãe e a tua tia nem sonham, ahahah, epá rapaz mais uns anitos e chega a tua vez, e agora dorme bem, está bem?"

Antes de começar a dominar a situação fui vítima de abuso sexual e isso deixou-me um pouco confuso.

Confissões Sexuais de Um Anónimo Português I


Angela Berlinde - Hope I Can Find You

Pode parecer um lugar comum mas a vida está cheia dessas coisas. A verdade é que comecei a pressentir a importância de ser homem ou de dar provas de que se é homem, através do futebol. Por volta dos quatro anos o meu interesse pela bola aumentou e o que me dava mais prazer era imaginar que marcava grandes golos. Via os jogos na televisão, com o meu pai e o meu avô, e gostar daqueles movimentos e daquelas imagens parecia-me natural. Mas, pouco a pouco, fui percebendo que aquele interesse também me garantia a entrada no mundo da cumplicidade masculina. Quando as mulheres da casa nos pediam para parar de gritar, ouvia frases como "elas não podem entender, não é rapaz?". Além de me agradar o orgulho que o meu pai e o meu avô sentiam, e que eu percebia, quando me ouviam dizer "sou do Benfica"! É claro que me deram um equipamento completo, com uns calções enormes, camisola, cachecol, boné, que eu vestia de cada vez que o Benfica jogava! Tinha um clube, era homem e ainda por cima podia mascarar-me! Fui gostando cada vez mais de futebol.

Uma vez perguntaram-me porque é que era um menino e não uma menina, e eu respondi: "porque sou do Benfica". E essa minha saída ficou para sempre no rol das histórias da família.

Por volta dos dez anos apaixonei-me.

Moi


W. Ropp

Não me enganas... emana de ti um perfume tão feminino..., um homem não reparava na chávena de café suja... Adorei os comentários! Amiguinhos da Diva, desenganem-se. Aquele era eu, deixo a minha última foto só por causa das dúvidas. E acrescento. Sou o cabrão que deu cabo da template. Ok, o blogue era dela mas agora a tipa continua sem conseguir aceder ao blogger. E enquanto a asnice dela continua, aproveito para postar mais umas coisas. Aguenta-te aí na tua fauna, continua a comer batatas, manda vir mais uns bagaços, que eu tenho umas coisinhas muito literárias para comunicar ao mundo.

Então é assim, visitantes, já ouviram falar num livro que se chama Confissões Sexuais de Um Anónimo Russo? Para ser rapidinho leio o que vem escrito na contracapa: Esta insólita autobiografia erótica, enviada por um anónimo russo, em 1912, ao sexólogo H. Elis, despertou desde então um vivo interesse no círculo restrito dos que a conheciam. Françoise Dolto consagrou-lhe um estudo e Nabokov serviu-se dela como uma das fontes do seu celebrado romance Lolita. etc.. (é da ASA, comprem se quiserem, que eu não digo mais nada porque trabalhar de borla para editoras nunca foi o meu estilo)

Pois vou fazer as Confissões de Um Anónimo Português, até a MRF descobrir como resolver esta invasãozinha. E só vou dizer isto uma vez. E só vou dizer isto uma vez. E só vou dizer isto uma vez. Hoje. O Anónimo c'est moi! Moi!

19.5.05

Leave no regrets on the field.

(cartaz fixado nos vestiários dos estádios de futebol americanos)

Perfil


MG, O Poeta

Previno-vos já: se calhar não vão gostar. Mas aconselho-vos a ler com atenção. Alguns detalhes vão interessar-vos. Não são frases que vou atirar para o ar. Eu não sou poeta nem escritor. Para mim, as letras têm um sentido. Elas são seguidas de um efeito. Vocês vão ver, tenho a certeza de que tudo isto não vos vai agradar.
Já reconheceram a minha maneira de escrever. Ligaram o computador, clicaram no rato, escolheram este sítio. Não tenham pressa. Já agora, como é que têm passado? É ainda demanhã, ou estão na hora do almoço, ou é fim de tarde, ou já bocejam em frente ao écran? Doem as costas? Provavelmente estão a ler isto a 100, 200, 300, milhares de quilómetros daqui. Mas não fazem ideia de quem eu sou.
Sentem-se bem na vossa cadeira. É daquelas que rodam? Se for ainda manhã, já beberam o vosso café e a chávena vazia está aí ao lado, e agora parece suja. Mas só está vazia.
Confesso que tenho alguma dificuldade em falar dela no passado. É natural. Não olhei suficientemente para ela. Devíamos olhar sempre com muita atenção para as pessoas. Mas não foi assim e depois, no meu trabalho, quase que somos obrigados a olhar para elas como se fossem idiotas. É uma questão de vida ou de morte.
Sinceramente a primeira vez que a vi, nem a reconheci. Tinha uma desculpa, dela só existiam velhas fotografias a preto e branco. E no início ela não me disse quem era, usou prudência. Já vocês não foram nada prudentes. Leram o meu nome, viram o meu rosto duplo no perfil, mas nem sonharam que aquela era uma foto do Sokolsky e que eu podia ter inventado o nome.
Lembro-me de que ela me disse: és um homem bonito para a idade que tens! Essa mancha branca, os ombros um pouco caídos, típico dos homens que medem mais de 1,80m, dão-te um certo charme. Bebi a minha cerveja e comecei a pensar que ía adorá-la ou detestá-la. Ela não prestava atenção às minhas reacções, começou a ler o jornal do dia.
Já vocês, não sei. Prestam atenção às minhas respostas, desabafos, agrados, desagravos? Pois deviam.
Isto já vai longe e vocês já estão a pensar no blogue seguinte que têm que visitar, por cortesia ou porque se divertem mais, ou porque querem saber qual é a notícia do dia. Paciência. Estou aqui há seis meses, precisamente seis meses, a fazer de conta que sou a vamp do lado ou de lá de baixo, consoante usem o Internet Explorer ou o Mozilla, e na verdade, essa é ela.
Perceberam? O tipo lá de baixo no post "sou um homem" existe mesmo. Sou eu! E achei que era tempo de vos dizer a verdade.
Eu disse que não iam gostar. Mas há mentiras piores. Esta começou por vingança. Mas é patético vingar-me de uma tipa que saboreei e me saboreou. Quando se foi embora, ela abriu a porta, olhou para trás, abanou a cabeça mas não disse nada. Façam o mesmo se quiserem. Mas às vezes um sujeito tem vontade de por tudo em pratos limpos. Foi o que fiz. Bom dia! Boa tarde! ou Boa noite!

P.S.: Obrigada pá! Mas agora já sabes...

18.5.05

Does every one know? II

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James Wolfe

A banda a que está ligado: Jettatura. Mas aqui, ouvimos alguns dos seus trabalhos a solo. Wolfe sang, wrote, and played all the guitars and bass on these tracks, which were recorded at Rebar Sound in San Francisco, with percussion work from ex-Creeper Lagoon drummer Dave Kostiner, and keyboards by ex-Big Blue Hearts pianist and organist John Krogh.

Unravelling

Ouçam unravelling mas entrem na rave. a música é boa. a template não mata. e eu sou um homem.

17.5.05

Fiquei sem template de um momento para o outro. Salvou-me uma cópia antiga para conseguir editar o blogue. Aos poucos vou reconstituir a página. Os posts ficaram intactos. Agradeço que me ajudem a perceber o que pode ter acontecido.

Hoje sou um homem


Andreas Bitesnich via Imagens

Inspirado num post do Yardbird, o nikonman lançou um repto. Escrever mudando de sexo. Aceite. HOJE, SOU UM HOMEM.


Ando para te dizer isto há já algum tempo. Sou um homem sem qualidades. E não há aqui nenhuma filosofia, Musil é outra coisa. Imagina alguém a andar e a perder pedaços. Como a menina Martini que ia desfiando a saia. Um fio preso num prego e adivinhamos que ficará nua. Eu desfio ambições, músculos, emoções, tesão. Seiva e linfa que se liquidificam e pressentimos o fim.

Ainda tenho uma ideia do que poderia ter tido. Uma grande carreira, uma mulher à maneira, dois ou três putos, poder e consolo. Não tenho nada disso. E nos últimos tempos ando com um sabor a pouco que te vai saber a nada. Por isso digo-te já: sou um homem sem qualidades.
Choro quando o Benfica ganha, aborreço-me no teatro, tenho ganas de saltar para cima de todas as meninas - as boas de famílias más e as más de famílias boas, mesmo se, é claro, já não garanta nada, odeio todos os chefes que se armam aos cucos - e eles fazem-no sempre, e deixam-nos em cacos, repudio a autoridade. Queria liberdade e agora estou entalado.
Às vezes enceno o que poderia ter sido. Já percebi que isso basta para atrair algumas mulheres. Mas a ti não vai bastar.

Diz-me - se gostar tanto de ti não fosse pouco - e eu gosto, eu gosto, não desgosto - aceitavas-me sem qualidades?

Masculino/Feminino


Victor Ivanovski via Imagens


A Humanidade está dividida em Homens e Mulheres... ou talvez não. Esta é apenas uma visão divertida.

16.5.05

Sua letra revela quem você é

A Simone VB mandou-me este link. É um teste de grafologia que vem na revista brasileira ISTO É. E este é o meu resultado:

A inclinação de sua letra mostra que você parece ser uma pessoa equilibrada, educada. Mas é um pouco “fria” com quem acaba de conhecer. A ligação de sua letra revela organização, raciocínio lógico e razoável capacidade de adaptação. A direção de sua letra indica controle, constância e organização, especialmente nas tarefas cotidianas. A pressão que usa ao escrever sinaliza estabilidade e equilíbrio. As áreas valorizadas na sua escrita destacam controle emocional, tolerância, um certo imediatismo e tendência ao comodismo. A forma de sua letra demonstra firmeza, decisão, perseverança e agressividade.

Vou destacar os defeitos: fria com quem acabo de conhecer, um certo imediatismo, tendência ao comodismo, agressividade.
Agora não digam que não avisei! ;)

À escuta #4


Larry Wiese

[Lei de Código de Trabalho, Concertação Social]

- Entramos num novo período, estamos a viver uma revolução no comércio mundial. A competitividade aumentou, as deslocalizações são uma ameaça. Neste contexto de globalização é inevitável discutir sobre a necessidade de flexibilização dos horários de trabalho ou dos salários. Mas muitas propostas por parte do patronato não têm sentido. Estas resultam apenas da dinâmica neo-liberal que domina o mundo.
- É preciso desdramatizar, as deslocalizações não existem em massa e não são um problema exclusivo de Portugal. Este é um problema europeu. Em Espanha, a zona da Catalunha está a ser bastante afectada, nomeadamente no sector automóvel. E o Norte de Itália também está em crise.
Mas a tendência é para continuar e o número vai crescer. Então temos que pensar no melhor recurso de Portugal, que são os recursos humanos - todos reconhecem que temos uma caracterítica muito valiosa, que é a adaptabilidade. Muitas empresas já fazem acordos laterais que permitem satisfazer necessidades pontuais, responder a encomendas especiais, etc., através por exemplo do trabalho ao Sábado. Mas é claro que estas soluções ainda são muito caras e há dúvidas quanto à sua legalidade.
- Temos o exemplo da Auto-Europa e não, a lei não proíbe o acordo que foi feito. Em regra, os acordos até são informais e normalmente os trabalhadores disponibilizam-se para isso. Mas a lei geral não deve instituir certos princípios que permitam abusos. Dialogar com os trabalhadores é fundamental, é preciso perceber que existem sempre dois parceiros e que a regra da pressão ou da ameaça não é eficaz. As empresas devem apresentar propostas e estas devem, é claro, incluir contrapartidas que motivem os trabalhadores.
- Há um princípio a ter em conta: não negociar significa fechar as portas da empresa, significa criar desemprego.
- Mas existem poucos empresários com disponibilidade para discutir, apresentar propostas, negociar com os sindicatos.
É necessário desmistificar a imagem da intervenção dos sindicatos. Talvez as pessoas não saibam mas as empresas que têm sindicatos são mais cumpridoras das suas responsabilidades e são mais estáveis.
- A verdade é que a maior parte das empresas já flexibilizaram os seus tempos de trabalho, agora só falta legalizar.
- Sim, mas a competitividade não deve ser feita através da redução de regalias. Muitas vezes, o que é preciso é começar pela reestruturação da empresa. Por exemplo, quando se sabe que as cabelagens vão desaparecer (no sector eléctrico), o que é prioritário é repensar o negócio e não os baixar salários, porque senão está apenas a adiar-se um problema.


- A concertação actual dá ensinamentos. Acho que não se deve ser muito ambicioso. O actual acordo bi-partido tem apenas uma página e meia. Reduziram-se ao mínimo os objectivos e vai controlar-se o mais possível o cumprimento do que ficou estabelecido.
- Existem matérias em que se pode avançar a partir da concertação, é o caso da Formação Profissional.
- Nós precisamos agora do Estado porque é o Estado que legisla.
- O Estado deve tratar com delicadeza o déficit mas não pode esquecer a questão da coesão social. É preciso criar riqueza mas também é necessário pensar na distribuição da riqueza.


[Inspirado num debate moderado por Sérgio Figueiredo na 2: que contou com as presenças de Francisco van Zeller, Presidente da CIP, e Manuel Carvalho da Silva, Secretário-Geral da CGTP-IN. A iniciativa desta concertação bi-partida é para aplaudir. Francisco van Zeller terminava dizendo que "mesmo que não haja acordo, o debate em si foi muito útil". E Carvalho da Silva sabe enquadrar as questões laborais numa óptica macro-económica! ]

Does every one know?

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James Wolfe

Este cantor-compositor nova-iorquino tem um som Beatlesiano, ou Elliot Smithiano ou Jeff Buckleyano ou... não interessa. É bom!

Chasing my shadow

15.5.05

À escuta #3


Sokolsky

- Adoro morangos!
- Eu sou alérgico.
- Eu sou alérgica a gatos.
- Ah, eu adoro gatos!
- Nunca poderíamos viver juntos... :)
- Não?
- Sabes que todas as razões são boas para fugir a compromissos! ;)
- Ah, és alérgica a compromissos!
- E tu não?
- Não, só a morangos.

Resignada, pois!


Chantal Heijnen

Que crise de nervos, que jogo mais caótico de ambos os lados, que sequência de falhas, para esquecer! E a agressividade dos jogadores sportinguistas esteve mal... dirigida!!! Boas defesas de Ricardo e depois aquele frango! É a vida! Parabéns aos benfiquistas e (esta custa-me mais) aos portistas! Resta-nos quarta-feira, a ver vamos!

Nós por cá, apesar de tudo, rodeada de simpatizantes de todas as cores, divertimo-nos q.b. durante o jogo!

14.5.05

É hoje!


Chantal Heijnen

Não, eu não sigo os campeonatos, mal sei o nome dos jogadores, mas há dias em que me deixo contagiar e HOJE é um desses dias! Sporting glorioso, por favor não me deixes ficar mal! Senhor árbitro, por favor não tenha culpa de nada! Fervorosos adeptos, por favor portem-se bem! Encham as duas bancadas, façam a festa... e que saiam do estádio verdes de raiva os benfiquistas e vermelhos de entusiasmo os sportinguistas!

E vocês, vão para a bancada da esquerda ou para a da direita?

De tão leve

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Não digo que mentisse: pelo que sei, afirmações do género tanto podiam ser falsas como verdadeiras. Estava provado que de vez em quando passávamos ao largo de um universo (ou que um universo passava ao largo em relação a nós). Italo Calvino, Cosmicómicas


Hay-Kay _____de tão leve pisa sem marcar a pele


O que eu espero_____desconfie de mim em seu olhar não acredite se eu lhe digo não

Canta Nancy Galvão
Às vezes apetece esta insegura e doce leveza.

13.5.05

George Cassiel

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Não estava por cá mas tinha que felicitar o
George Cassiel pelo primeiro aniversário. É que este blog, centrado nas Letras & Signos, na Literatura & Artes, é sublime no bom gosto e no saber!

Meninas na varanda


MRF

Dalí pintou um óleo de que gosto muito, chama-se Menina à Janela. Nele, Ana María Dali, a irmã que foi o seu modelo preferido durante muitos anos, é pintada de costas, debruçada numa janela, olhando Cadaqués. Nesse quadro, pintado em 1925, Dali introduz um novo paralelismo entre o ser humano e a arquitectura. Há um conceito quase onírico da realidade circundante. Mas o que gosto mesmo nesse quadro é da postura da figura feminina e das várias tonalidades de azul. Quando era estudante viajei até Cadaqués e trouxe de lá essa imagem, que emoldurei. Fez-me companhia durante anos.

Naquele dia, o mar de Cadaqués reapareceu entre estas minhas meninas. Mas não estávamos no Mediterrâneo. Era um fim de tarde no reino dos Algarves. Tirei a fotografia e agora é essa imagem que viaja sempre comigo. Fechada há dias neste minarete, olho para ela. A temperatura estava amena, corria uma ligeira brisa, cheirava a mar e a erva molhada, e elas foram conversar para a varanda. Descobria-as assim, entretidas a comentar a paisagem e as proezas do dia. Castelos de areia, mergulhos com olhos fechados e abertos, atirar a bola para muito longe, biquinis cor de rosa como os da Barbie, penteados como os da sereia Ariel, dois gelados que eram mesmo frios, o gato no jardim...

Família


Desenho da S.

Em que pensamos quando nos sentimos sozinhos e com medo? Na família. Por isso gosto deste desenho da S.. Ela tinha feito 5 anos há pouco tempo. Está entre o pai e a mãe, pôs a mãe entre as duas filhas, é claro que ela é maior que a irmã, todos de mão dada muito sorridentes e com o mesmo número na camisola! Uma borboleta esvoaça, e há um ventinho cor-de-rosa apesar de ser um dia de tanto sol, mas de tanto sol, que todos têm que usar óculos, até o sol!

Como desenharia ela a Mesquita Malindi?

Magia


Desenho da A.

Estou a precisar do pó mágico da Sininho para sair deste lugar sã e salva! A., espero ser uma daquelas figuras que desenhaste para poder voar como a Wendy e os outros meninos amigos do Peter Pan!

Quando me deste este desenho, perguntando se eu acreditava em magias, devia ter-te respondido que me bastava pensar em ti! Meti-o na minha sacola e neste lugar, em Zanzibar, tenho olhado muito para ele. Quando sair daqui, vou contar-te mil e uma histórias mágicas de princesas que ficaram presas em minaretes e de príncipes que as vieram salvar!

12.5.05

Já sonho com Ngorongoro XII - S.O.S.

Atravessei a porta da frente, vi o mausoléu, e depois a curiosidade matou o gato!

bin, estou fechada, escondida - há quantos dias? - no minarete da mesquita Malindi. Não resisti a invadir este pequeno grande território proibido de Zanzibar. Via a mesquita com aquela forma cónica, ouvia a voz que várias vezes ao dia chamava para a oração e num impulso comecei a subir a escadaria. Entretanto ouvi passos e o barulho de uma porta a fechar-se. Só tive tempo para me esconder numa espécie de nicho. Vi-o passar.

Se chegar a ti um destes pedaços de papel que vou atirando para a rua, vou passar a acreditar em milagres! A garrafa de água está no fim, já não tenho comida. Estou a pensar entregar-me ao Iman que sobe a mesma escadaria cinco vezes por dia. Poderá esse Santo Homem perdoar-me?

E o Bagaço, será que o encontraste no Mambo Club? Fico mais tranquila quando imagino que os dois estão juntos.

6.5.05

Viajar

Acontece que vieste e sussurraste-me ao ouvido.
Ivar Corceiro
Numa Avenida de Merda


Da Lata cantam Alice no país da malandragem
Do álbum Serious

Bilhete em Zanzibar

Gravitação

Latente gravitação
E depois de corpo imóvel,
Pianando a areia com os dedos dos pés,
Seduzes a praia com a desbasta luz tardia.
Que sobre a costa se alonga.

in Ivar Corceiro
Numa Avenida de Merda


Eu sabia que o Bagaço andava por aqui. Será que ele vai logo ao Mambo Club?

Já sonho com Ngorongoro IX


Ras Nungwi Beach Hotel, Zanzibar

bin, ou meu querido Jacques Mayol, como não sou o Enzo Molinari, não consigo acompanhar-te nesse mergulho no Grand Blue. Os destroços do Pegasus vão continuar a ser um mistério para mim. O que restará de um barco afundado em 1916 em plena Grande Guerra? Enfim, para não ficar deep blue tento imaginar os mergulhos que faremos no recife de Pange. Corais e peixes tropicais, mergulhos nocturnos, um mar terno, caliente e acessível até a mergulhadores pouco experientes (como eu, que tenho mais pele e olhos que respirações compassadas e lentas). Mas deixaste-me preocupada com o mergulho de hoje, não te escames! Cuidado com os refúgios das moreias - não existem apenas nos livros do Spirou. E espero que não te aventures demasiado pelas profundezas - o Andwele disse-me que em Mombassa têm câmaras hiperbáricas mas que aqui os barcos só estão equipados com kits de oxigénio. Não queiras ser um homo delphinus!

Quanto a mim, não te preocupes. Estou a gostar deste "Desesperadamente à procura de Bagaço em Stone Town". Não imaginas os lugares por onde já andei. É verdade que ainda estranho. Ando solta e desconfiada, curiosa e recatada, com vontade de sorrir a toda a gente e de me deixar queimar pelo sol e ruídos e rezas e ao mesmo tempo, um pouco assustada com este bazar de mundos.

Comecei no Darujani Bazaar e não, não comprei aquelas bugigangas chinesas. Fiz o que me aconselhaste, meti-me pelo labirinto de pequenas ruelas ali à volta... e andei a ver se me perdia! Depois apanhei um dala-dala até ao Forte Árabe. O motorista andava nas faixas da direita e da esquerda mas ninguém pareceu estranhar, pelo que me limitei a inspirar e expirar com força até aquelas voltas me saberem bem! Pelo menos havia ar! Ainda me lembro de ir da Praia ao Tarrafal, em Cabo Verde, numa IACE - a carrinha Toyota "adaptada", em vez de 9, levava uns 20 passageiros! Os dala-dala têm a vantagem de não ter janelas e o tecto faz alguma sombra!


Como já conheces, não te vou falar muito de Stone Town, deixo-te só as razões do meu espanto. Quase todos os edifícios históricos tiveram utilizações muito diferenciadas ao longo do tempo!? O Forte foi usado como tal pelos omanis, depois foi transformado numa prisão, mais tarde os portugueses fizeram dele uma igreja, e agora tem um restaurante e lojas de souvenirs!!! A House of Wonders, residência da raínha Fatuma, foi depois a sede do Protectorado inglês! O Old Dispensary, mandado construir por ocasião do Jubileu da Rainha Vitória, é agora o Cultural Center! No subsolo da Catedral Anglicana podemos visitar as celas dos escravos negros! O Templo hindu Shakti já não tem hindus! Talvez por causa de todos estes filamentos da História, de povos e culturas e religiões, Stone Zanzibar parece-me cada vez mais misteriosa.

Outra coisa, este suaíli é um bocadinho diferente do que se fala na Tanzânia. Na Kelele Square tive alguma dificuldade em perceber o que ouvia! Encontrei depois um guia que me disse que este suaíli é mais "puro". Falou-me do kiswahili, de que deriva o suaíli, que nasceu do casamento de línguas de vários povos - árabes, persas, omanis e dos bantus de zanzibar! Por isso, em Zanzibar, estão mais próximos da origem! Já agora, sabes que kelele quer dizer barulho? Nome que seria certamente apropriado para um mercado de escravos! (agora tem lá um salão de beleza, não é bizarro?)

Quando nos encontrarmos logo, tenho uma mão cheia de perguntas para te fazer, depois de me contares a aventura no Pegasus. Para além do suaíli, do árabe, do inglês, como é que tanta gente também fala italiano? E é verdade que em Pemba se podem ver touradas à portuguesa? (e porque não em Unguja?) Que história é essa da Guerra dos 40 Minutos? Só sei que envolve ingleses e sultões e que consta como a guerra de menor duração da História. Os Banhos Persa Hamamni ainda funcionam? ______Podia continuar a puxar as pontas dos mil e um novelos!

Sabes que esta avidez de saber é falaciosa, não sabes? Os dados novos apenas distraem um pulsar que tenho que conter. Apetece-me suaílar, regatear, mas sobretudo dançar, esquecer o calor e as regras do Islão.

Conheces o Bi Kidude?
Ele vai estar no Mambo Club logo à noite. Vê se chegas cedo. Até porque não sei se encontro o Bagaço! Desde que lançou aquele primeiro livro, nunca mais parou. Às tantas está para aí fechado a escrever o próximo best-seller!

Isto de viajar com um Indiana Jones e um Costa-Gravas é muito divertido mas às vezes é um pouco solitário (schuiff). A POPULACÃO É 95% MUCULMANA E EU SOU MULHER FËMEA USO SAIAS TENHO PELE CLARA OLHOS ESMERALDA VALHO TANTOS CAMELOS QUANTOS OS KM DAQUI ATÉ AO DESERTO DO SAARA! AINDA ME RAPTAM!

Para nem pensares em adormecer quando chegares do teu mergulho heróico, deixo-te esta carta e o leitor de cd's. Pedi na recepção do Hotel para os colocarem no teu novo quarto (também mudei, tinhas razão, é melhor mesmo em frente à praia).Free Image Hosting at www.ImageShack.us

Agora bin, carrega no Play.

Bi Kidude, o rei do taarab, 93 anos, canta Beru

Kwa Heri
Maria

5.5.05

Um dia

Esse lugar onde não há mentira
É para lá que eu vou
Esse lugar que a lua ilumina
com essa luz que fascina
É para lá que eu vou
Esquecer o barulho
Respirando o ar puro
que sai da flôr
Há gente tão linda...


Canta a paulista Nancy Galvão

4.5.05

À escuta #2



- Então, como correu a viagem?
- Ah, adorei, nunca tinha viajado para um país nórdico... É muito bonito! Mas sabes, não conseguia viver lá... É tudo muito disciplinado, muito direitinho, deitam-se muito cedo, à noite está tudo fechado, não há um único café aberto...
- Ah pois, uns amigos contaram-me que para marcar um jantar durante a semana tem que ser às 7 horas, porque às 10 horas já estão todos deitados!
- É isso! Mas depois estão muito avançados em muitas coisas... Vim de lá com uma que me deixou K.O.!
- Então?
- Vê lá que para a terceira idade têm umas casas muito giras com pequenos jardins, e as pessoas têm a sua privacidade..., fomentam a independência dos mais jovens aos mais velhos..., e depois há assistentes que dão apoio se necessitarem. Estas assistentes têm formação específica para prestar cuidados de geriatria, tudo muito bem... E algumas dessas assistentes também satisfazem as necessidades sexuais dos idosos... porque todos têm direito a uma vida sexual activa!!! O melhor é que andavam a discutir se a Segurança Social não deveria comparticipar esse tipo de serviços !?
- E tu não concordas?

[país : Dinamarca]

A Intérprete


A Intérprete

Acabo de ver o último filme de Sidney Pollack com Nicole Kidman, Sean Penn e o próprio Sidney Pollack, entre centenas de outros actores e figurantes e duplos e tudo aquilo a que uma grande produção tem direito... como obter autorização para filmar pela primeira vez dentro do edifício da ONU em Nova Iorque. E é claro que gostei do trabalho dos actores, da realização, do cenário, do tema - que é interessante e actual. Mas odiei o filme! Se alguém quiser nos próximos tempos nomear o estereótipo de um filme à americana, pode dizer "A Intérprete". O argumento é absolutamente, completamente, totalmente, insuportavelmente politicamente correcto e conveniente, sobretudo neste reinado Bushiano. Meu querido Sean Penn, se querias mandar algum recado, saiu-te o tiro pela culatra, puseste o teu talento ao serviço do tal sistema. As Nações Unidas deveriam poder assumir o papel a que a boazinha Silvia Broome/Nicole Kidman aspira, mas não sejamos inocentes... E o Tribunal Penal de Haia não existe apenas para julgar ditadores africanos...

E depois, os personagens são tão infelizes mas tão infelizes que dificilmente poderiam ser mais infelizes. Tobin perdeu a mulher que amava há poucos dias, Silvia perdeu todos os familiares. E o que é fantástico, é claro, é que a julgar pelo aspecto dos dois, ninguém diria!

É um filme com uma fórmula tão certinha que chateia. No final, oh meu caro Sidney Pollack, eles bem que se podiam ter beijado. Sempre saíamos da sala mais bem dispostos! Porque essa moda actual de happy endings sem sexo, só para não termos uma full house de happy end, e não dizermos que os filmes americanos são sempre a mesma coisa, é um disparate. Porque os filmes americanos não são sempre a mesma coisa, há uns muito bons (e Pollack entra no grupo de realizadores cujo mérito é indiscutível) e outros muito maus. Mas este filme, que poderia ter sido muito bom, é um desperdício de 80 milhões de US dólares!
(... mesmo se chegou ao primeiro lugar no ranking de bilheteiras dos EUA)

2.5.05

Já sonho com Ngorongoro VIII


Já sonho com Ngorongoro VII

Sabes bin, às vezes acredito na reencarnação. Vá, tem calma. Acontece que conheço esta leoa. Não só já a vi, como os nossos olhares já se cruzaram. E confiamos uma na outra. Reconheço-me nesta fêmea mas não sei explicar-te como. Talvez a minha memória se divirta a recriar imagens de infância e o meu pensamento mágico me engane. Mas não foi por acaso que, num impulso, me dirigi a ela e que ela se deitou nesse preciso momento, tranquila. Perdoa o susto. O que aconteceu depois? Não sei, "acordei". E então dei-me conta de que corria perigo. Por isso fiquei imóvel e concentrei-me apenas nas palavras do Andwele. Baixar o olhar, recuar lentamente.

Ficaste louco. Ainda vais ficar mais quando leres isto. Persisto numa inconsciência que te parece inaceitável. Para compreenderes tens que te lembrar que nasci no Dundo. Dundo, capital da Lunda Norte. Os meus irmãos de brincadeiras sempre tiveram, uns bonecas que vinham do Puto (como os "colonos" chamavam a Portugal), outros amuletos.
"Mininos" e monas, juntos. Não se nasce e cresce impunemente num lugar. Sabes isso. Os Matas (senhores) podiam estar divididos, mas nós não. Descalça no meio dos quiocos. Parecia-me natural pertencer também àquela terra.

Ainda antes de partir, enquanto preparava esta viagem, sentia que lentamente regressava às origens. Fui ao fundo do baú. Peguei no velho Ngombo e lancei mesmo aquelas figurinhas esculpidas em madeira. Saiu-me Mikama e Tchilôwa. Free Image Hosting at www.ImageShack.usSe acreditares em Tchokwe, sabe que a viagem vai correr bem. Espero que isso te tranquilize (se calhar, não). Mas deixa-me dizer-te mais: quando estas duas figuras se juntam, lembram ao viajante que devem respeito aos ídolos que forem encontrando no seu caminho. Esta leoa é um ídolo vivo. E eu sei, bin, que vai haver mais. Estamos apenas no princípio da grande viagem.

Amigo, obrigada pela tua companhia e pela tua generosidade. A tua vontade de me mostrares a tua África faz-nos percorrer quilómetros imensos a que chamas "pequenos desvios". O lago Manyara, depois o Parque Nacional de Tarangire. Não sei se vai caber tudo dentro de mim.

Agora estamos quase a chegar a Zanzibar. Anseio por ver a cor do mar. Dizes-me que é azul e límpida mas mais a norte, no Quénia, encontrei um Indico de águas turvas. Depois explicas-me porque é que é assim.

E vai ser bom encontrar o Bagaço, se tudo correr bem vai juntar-se a nós esse amigo. Aposto que já conhece os melhores bares de Zanzibar e que já escreveu alguns contos negros com marinheiros desdentados e prostitutas que viram os vestidos subir, mês após mês, com a certeza de nunca mais verem os amantes que as deixaram assim, gordas de vida.

Um abraço grande (já to dou)
Maria


P.S.: Dou-te o texto agora, mas só o lês quando eu não estiver por perto.

1.5.05

InJAZZ


Bernardo Sassetti

Por onde começar? Talvez repetindo os agradecimentos de Sassetti: à CMA, ao Teatro Aveirense e sobretudo a Pedro Santos da ONC - Produções Culturais. Pedro Santos arriscou a iniciativa do InJazz num país onde tudo está centralizado..., houve um problema de público... mas por isso mesmo, porque é importante educar para a cultura, para a música, para o Jazz..., há que fazer uma aproximação, assim, em 6 cidades do país...

E depois, hoje. Não houve um problema com o público. A sala estava cheia. Bernardo Sassetti encheu a sala. E Mário Delgado, é claro.

Mas eu só ouvi o Sassetti. São coisas que não se devem contar. Mas foi tão bom, tão bom, ouvi-lo durante cerca de uma hora e meia, gostei tanto tanto daquele som que saiu de dentro do piano domesticado, que não quis ouvir mais nada. Quis manter a memória daquelas melodias intacta, sem interferências. Saí no intervalo e passei o bilhete a um amigo que assim pôde assistir à segunda parte do espectáculo com os Filactera Redux de Mário Delgado.

Sasseti tocou peças de Indigo (álbum lançado em finais de 2004) e mais umas tantas improvisações precisas - ele tem a certeza das notas que toca - que se inspiraram em John Coltrane, John Lennon e até José Afonso (belíssima a "revisitação criativa" das melodias do Zeca Afonso, desta vez sem Mário Laginha).

Os encores foram muitos, o pianista acedeu sempre, ofereceu inéditos (a banda sonora de um filme, mais uma) e bónus ao público.

Conhecerão o estilo. Intimista, emotivo, louco, contido, melódico. Virtuoso é claro, e mágico. Às vezes tinha a impressão de sonatas a quatro mãos, orquestra e coro. Mas era só ele, Bernardo Sassetti a solo.

Ahhhhhhhh, que bom que foi!

Nasci d'asas


Jeffrey Tautrim

Nasci d'asas
com asas
cortaram-me as guias
de pé no chão
vieram os filhos
cortaram-me os pés
cresceram as asas
sei só voar
sem pé em terra
sem pé no mar
tenho pé no ar
filho d'asas
sabe voar

Almada Negreiros


Beijos à mãe, da filha,
Beijos da mãe, às filhas.