17.3.05

Contra Divas: Culinária



O meu interesse pela culinária é muito antigo. Com 9 ou 10 anos essa matéria já me interessava. O meu sonho era casar cedo, ser mãe aos 15, ser uma dona de casa perfeita, conciliando tudo isso com várias medalhas de oiro em campeonatos de patinagem artística, pelo menos uma vitória num Eurofestival da Canção e uma reportagem jornalística num cenário de guerra.
A arte de bem confeccionar os deliciosos pratos que iriam alimentar os meus vários filhos e comover o meu ideal marido parecia exigir muito treino. Comecei a observar com atenção a minha mãe e a fazer anotações no meu diário kitty (como o da Anne Frank). É claro que tal aspiração não podia deixar de ser recompensada, ofereceram-me "O meu primeiro livro de Receitas". A selecção da primeira receita foi criteriosa: um bolo de mármore!
Fiz efectivamente um bolo de mármore.
Levei alguns anos a recuperar do choque. Quando voltei a tentar acho que já andava na Faculdade.
É melhor passar à frente a fase universitária. Havia sempre uma amiga que cozinhava melhor, pelo que não valia a pena esforçar-me. E as cantinas universitárias são indispensáveis à maturidade das nossas papilas gostativas porque nos alargam a paleta dos gostos e paladares.
Já grandinha tive a sorte de ter um daqueles namorados modernos e cheios de iniciativa, que só gostam dos bifes feitos à sua maneira, que cozem as massas al dente, etc.. Limitei-me a aceitá-lo tal como ele era e, sempre fascinada pela culinária, continuava a comprar livros de receitas.
Tenho uma biblioteca preciosa que inclui vários livros, desde antiguidades dos anos 40, como os da Colecção Doméstica de Branca Miraflor, da Livraria Barateira (Casa Editora e de livros novos e usados - Rua Nova da Trindade, 16-A - Telef. 26755 - Lisboa) até aos mega-utilitários Culinarium da Vaqueiro.
A dura realidade chegou anos mais tarde, não com o marido eleito (que é um sujeito cool) mas com os rebentos e as obrigações sociais da praxe. Ter a responsabilidade de alimentar de forma saudável e diversificada duas crianças acabou por não se revelar um problema (uns exasperos aqui e ali, mais nada!). Mas enfeitar, requintar, impressionar, e outros ares, custou! como custou!
O primeiro grande desafio: uma consoada natalícia para sogros, cunhados e apareçam mais! em França...(putain!)
Podia ter optado pelo bacalhau tradicional se não fosse o caso de um deles sofrer de uma alergia rara a peixe..., mas enfim, dadas as circunstâncias tinha uma justificação para comprar um peru recheado com deliciosas ameixas, tudo já confeccionado e da melhor qualidade, à venda nas lojas Picard (pertenciam ao grupo Carrefour, e eu anseio pela sua chegada a Portugal!). Com o prato principal arrumado, podia dedicar-me às sobremesas. Durante semanas estudei o menu.
Garanto-vos que podia escrever um livro sobre "Como falhar uma boa sobremesa". Porque sou vossa amiga, deixo-vos uns conselhos:
- quando na receita de mousse de chocolate diz "acrescentar uma colher de café", eles querem dizer café líquido e não em pó: para que os convivas não passem a noite a tirar partículas de café não diluídas da ponta da língua;
- quando tiverem a intenção de servir um sorvete caseiro, tirem-no do congelador com algum tempo de antecedência;
- há pudins que são cozidos em banho-maria no forno, não experimentem cozê-los de outra maneira;
- encomendem as rabanadas;
- peçam ajuda à vossa mãe, tia, prima, a quem quer que seja que compre menos livros mas que saiba como se faz.
Crença: houve um salto geracional em termos genéticos, eu não herdei os genes culinariuns da minha mãe. mas as minhas filhas vão ser fantásticas.

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