10.3.05

Pornografia I


Ovidie

É sempre arriscado falar de pornografia, sobretudo quando é uma mulher que o faz e ainda mais se não o faz de forma anónima. Mas ontem apanhei na TV5 uma entrevista à Ovidie e por isso não resisto. A Ovidie é actriz e realizadora de filmes porno, o que, por si só, não constitui uma grande qualidade nem justifica uma grande conversa. Mas esta Ovidie é uma jovem com 25 anos, formada em filosofia, e que se assume como marxista e feminista. Fala com orgulho do que faz, mas a sua postura tipo é estar contra. Contra a sociedade moralista. Contra a sociedade machista. Contra "o feminismo de consumidoras". Contra uma revolução fundada sobre uma falsa moral. E, sobretudo, contra uma pornografia de exploração. Escreveu um livro que se chama Porno Manifesto onde descreve a vivência no meio em que trabalha. Como boa marxista, coloca de um lado as operárias (e operários) do sexo e, do outro, os produtores de filmes, os capitalistas.
As contradições ou ilusões desta intello de filmes X são muitas, e apercebemo-nos logo disso quando se convenceu de que tinha criado outra ordem estética e social na pornografia, realizando ela própria dois ou três filmes.
Mas a sua singularidade fê-la chegar ao grande público e é uma fazedora de opiniões. Para o cidadão médio, a pornografia passou a ter um rosto e uma voz e uma consciência. Tem o mérito de ter posto a França a discutir os direitos dos trabalhadores da indústria porno. Continua a exercer o seu métier mas recusa algumas práticas comuns no cinema porno, pelo risco de transmissão de doenças (nomeadamente o vírus HIV). Ela também participa activamente em campanhas institucionais favoráveis ao uso de preservativos.
Quando uma Ovidie é apresentada no horário nobre da televisão, já não é possível fazer de conta que não existe uma indústria porno bastante lucrativa, nem esquecer que, se assim é, é porque existe mercado. E todos são forçados a assumir uma posição. Desde os inocentes concordo/não concordo à regulação objectiva de uma actividade.
Fiquei com a impressão de que, como país, não aguentaríamos uma Ovidie. E, sem querer, percebi que também eu estava contra tudo. Contra a sociedade moralista. Contra a sociedade machista. Contra uma revolução fundada sobre uma falsa moral. E, sobretudo, contra uma pornografia de exploração.
(Não sei se perceberam, mas retirei a cláusula das "feministas consumidoras". Por não saber bem o que isso é. E porque a Ovidie não é uma boa feminista, apesar de ser muito mais do que uma "feminista" boa.)

7 comentários:

Papo-seco disse...

Não tenho preconceitos contra a pornografia, como não tenho contra a prática de actos sexuais, que na nossa cultura católico/Romana normalmente são vistos como aberrações.

É óbvio que excluo nessa “minha abertura” a utilização de menores e a exploração de pessoas coagidas para a prática dessas “actividades”.

Entre dois ou mais adultos, desde que de acordo, tudo lhes deve ser permitido.

Mas aquilo de que tu falas é outra coisa a que muito bem chamas de falsa moral da nossa sociedade, que é capaz de no Dia Mundial da Mulher (é só um exemplo), fazer um papel de sensibilizada para a injustiça a que em muitos Países estão sujeitas, e no dia seguinte continuar a ter a postura que sempre teve e que mais jeito lhe dá.

Gostei.

Didas disse...

Quanto a isto podemos dizer várias coisas:

1. As visitas neste blog vão aumentar graças à busca pela palavra pornografia. :)))
2. Acho que Portugal aguentava bem uma Ovidie. Punha-a logo na Quinta das Celebridades.
3. Fiquei cheia de curiosidade para saber se os filmes da Ovidie serão diferentes das restantes porno-chachadas. Devem ser mais chatos ainda... digo eu que sou só padeira.

Didas disse...

Quanto a isto podemos dizer várias coisas:

1. As visitas neste blog vão aumentar graças à busca pela palavra pornografia. :)))
2. Acho que Portugal aguentava bem uma Ovidie. Punha-a logo na Quinta das Celebridades.
3. Fiquei cheia de curiosidade para saber se os filmes da Ovidie serão diferentes das restantes porno-chachadas. Devem ser mais chatos ainda... digo eu que sou só padeira.

Elvira disse...

Porno e feminismo não me soam bem, apesar do que pode dizer a Ovidie...

Francis disse...

Não me desagrada a sua atitude mas... contra pornografia de exploração? Existe alguma pornografia que não seja de exploração? Compreendo onde quer chegar, mas o destino final da sua produção passa por mentes sequiosas de sexo em horizontes completamente opostos à sua idealização artistica.

Papo-seco disse...

è imaginável uma produção que seja simultaneamente pornográfica e artistica?

Por exemplo um filme?

ananda disse...

Adorei o texto! Realmente é muito difícil para a nossa sociedade aceitar qualquer coisa que esteja relacionada com sexo e ainda mais se for uma mulher a falar sobre isso. Ah, gostei especialmente de saber que a Senhora é da área de Filosofia! Quem sabe se ainda não me transforme em realizadora de filmes porno?! ;) Beijinhos!