15.7.09

Entre nós e o mundo



Toda a viagem é iniciática – do mesmo modo que qualquer iniciação não deixa de ser uma viagem. Antes, durante e depois descobrem-se verdades essenciais que estruturam a identidade.



Michel ONFRAY, Teoria da Viagem – Uma Poética da Geografia
Quetzal Editores, Lisboa, 2009, p. 81



Outra qualquer voltará daqui a algumas semanas. Até lá ! :)



Fotos MRF 2008

11.7.09

In the mood for love

Outro momento, Marta. Aposto que chorávamos juntas, como com Os dados estão lançados. É claro, convidávamos a Cláudia para o pranto! :)


Realizador: Wong Kar Wai

Câmara lenta (não é a municipal)


Cinco situações da minha vida dignas de passarem em câmara lenta... O desafio veio de outro planeta e soa-me a poemas sem palavras, como abraços imensos de mãe ou de filhas pequeninas a fazerem muita força para doer e afinal é apenas tão bom, e elas sabem mas não dizem que sabem que é tão bom... e por isso eu que ando distante para tantas coisas como estes desafios que são a maneira que os grandes inventaram de dizer que não se esqueceram de nós (apesar de poucos alguma vez nos terem olhado nos olhos), (o que me parece tonto e outras vezes comovente)..., eu já estou a rebobinar momentos em câmara lenta a ver se fixo algum para oferecer. ela. eu conheço. ofereceu-me um livro mal me viu e tenho saudades das vezes em que não estivemos juntas.

em câmara lenta...


  • no primeiro dia de escola. que era também o dia em que fazia 6 anos. o corredor era imenso e pareceu-me escuro. os passos ressoavam mas eu sentia que flutuava. todos os gestos eram demasiados rápidos. eu seguia lentamente os gestos e não os apanhava. sentaram-me na fila da frente e houve um momento em que olhei para trás e pareceu-me que estava num palco. o público era uma massa indistinta. então fechei os olhos e pensei na terra que era ainda minha e que ficava em África. eu nem me despedira dela. por não saber o que queria dizer "voltar ao puto". o "puto" tinha uma cor triste e cheirava mal. tinham passado apenas dois meses. eu não apanhava os gestos. eu não sabia onde estava. eu só queria reaver a minha terra.


  • a vizinha à janela. chama por mim, muito doce. diz: rosarinho, nasceu o teu irmão. o hospital ficava a um quarteirão da casa e eu conhecia-o por dentro. cheguei lá primeiro que eu. o meu primeiro bebé, de cabelo em pé.


  • um final de tarde. a minha irmã pôs a cassete no gravador. e então ouvi: Eu vou lhe deixar a medida do Bonfim/Não me valeu/Mas fico com o disco do Pixinguinha, sim!/O resto é seu/Trocando em miúdos, pode guardar/As sobras de tudo que chamam lar/As sombras de tudo que fomos nós/As marcas de amor nos nossos lençóis/As nossas melhores lembranças/Aquela esperança de tudo se ajeitar/Pode esquecer/Aquela aliança, você pode empenhar Ou derreter... Ah e mesmo se a minha aliança era um fio muito fininho de prata que ele me ofereceu quando fizemos um mês de namoro... (o que aliás me fez ser tão gozada pela minha irmã). tinha acabado. e o Chico Buarque, que eu não conhecia, que eu nunca ouvira, surpreendentemente, naquele dia, cantava só para mim. acabámos muitas vezes. acho que essa nem foi a última vez. mas lembro-me de como fiquei imóvel. ainda fico, quando o ouço. ao Chico!


  • temos vinte anos. na cidade, o verão chegou de repente em março. e decidimos contar o dinheiro: dava para apanhar um autocarro e ir acampar alguns dias no algarve. apanhámos a "linha" mais portuguesa de Portugal. na carripana, uma senhora à nossa frente tinha um pintainho de estimação a quem dava beijinhos e cornetos da Olá. os dois foram todo o tempo a debicar gelados. como não tínhamos lanche, um casal de velhotes decidiu alimentar-nos. comeinde! lembro-me de uma fatia enorme de pão saloio com pedaços gordos de chouriço. e depois houve um momento em que fechei os olhos e senti-me segura como em minha casa. eu já estava apaixonada por ele. mas voltei a apaixonar-me.


  • e agora temos 40 ou falta pouco e aterrámos num sonho de há muito tempo. um vento muito frio corta o ar. envolvemo-nos em cachecóis, luvas e gorros mas continuámos com o corpo em estado de alerta. já nevou. as ruas, as casas, dentro das casas, há decorações de natal. e de repente, chegámos àquele lugar. stop. Times Square. pasmar: olhar para os arranha-céus cintilantes, cintilantes, aqui, ali, este, outro reclamo, teatros, as notícias, nasdaq, megastore, teatros, megastore, vendedores ambulantes, cavalos, táxis amarelos, vummmmmmmmmmm. impossível seguir os movimentos. mas foi tão bom parecer um boi a olhar para um palácio!


e agora, vejam em câmara lenta estes momentos. ou estes. e estes. ou estes. e ainda estes. clic. off.

lá em cima, uma pequena bailarina dança em frente a um quadro (detalhe) de Julião Sarmento no Teatro Aveirense. também é para ver devarinho: o quadro.

4.7.09

Correr nos jornais do mundo. e do país (?)

[Na carta que envia às cidades, o Mestre de Avis diz:]
E que porém lhes rogava a todos, de bom coração como verdadeiros portugueses, tivessem voz por Portugal…
Fernão Lopes



José Sócrates só podia optar pela demissão. Mas não gosto quando batem no ceguinho. Diz João soares, e bem, «Só espero que o gesto de Pinho não nos caia em cima até às eleições»! Eu também! Quanto à humilhação que representa ver o escândalo estampado no El Pais ou no Le Figaro, nem comento. Buscando referências a Pinho na imprensa estrangeira, acontece que só encontrei boas malhas. Na verdade, nem me lembro de ler notícias como a seguinte em nenhum jornal português. Eu sei que adoramos os vencidos da vida mas está na hora de, como bons portugueses, darmos voz por Portugal.



«Il y a 20 ans, on n'imaginait pas que les énergies renouvelables pouvaient être rentables. Or, aujourd'hui, certaines sont déjà compétitives. La bonne stratégie pour notre pays, c'est de diversifier», explique Manuel Pinho, le ministre de l'Économie.

28.6.09

Lemniscata


«O selo deste prémio foi criado a pensar nos blogs que demonstram talento, seja nas artes, nas letras, nas ciências, na poesia ou em qualquer outra área e que, com isso, enriquecem a blogosfera e a vida dos seus leitores

O galardão foi-me atribuído pela Cláudia Sousa Dias, autora do
Há sempre um Livro à Nossa Espera e co-autora do Rendez-vous. Muito obrigada pelo mimo! :)

Lemniscata: curva geométrica com a forma semelhante à de um 8; lugar geométrico dos pontos tais que o produto das distâncias a dois pontos fixos é constante. Lemniscato: ornado de fitas; do grego lemniskos, do latim, lemniscu; fita que pendia das coroas de louro destinadas aos vencedores. (in Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora)

De acordo com as regras atribuo o Prémio deste post aos seguintes blogues:

A Esquerda da Vírgula, de nd
Circo da Lama, de Bruno Vieira Amaral
Humanos, de Paulo Costa
In the Meadow, de Silvia Chueire
O que cai dos dias, de João Ventura
O lado esquerdo, de Arsélio Martins

27.6.09

Projecto "Avenida"

Hoje, dia 27 Junho, pelas 21:30, poderemos assistir no Mercado Negro à primeira apresentação do projecto "Avenida".
Este projecto insere-se no conjunto de actividades que o movimento cívico
Amigos d'Avenida tem vindo a apoiar e a dinamizar e consta de um documentário sobre a Avenida Lourenço Peixinho (e respectiva banda sonora) realizado pelo músico e compositor Joaquim Pavão e produzido por Tânia Oliveira da Senso Comum.

Este projecto resulta de um trabalho de pesquisa e recolha de dados e materiais que a equipa de investigação, produção e realização tem estado a desenvolver sobre o espólio fotográfico e documental da Avenida e procura reflectir sobre três momentos distintos do seu desenvolvimento: o passado, o presente e o seu futuro.

O projecto não está ainda concluído, pelo que se pretende com esta primeira sessão fazer uma breve apresentação do projecto e recolher eventuais testemunhos (orais ou documentais) ou sugestões sobre o documentário "Avenida".

O programa da sessão será o seguinte:

Os amigos da Avenida - Gil Moreira (e outros amigos)
O projecto Avenida - Tânia Oliveira /Senso Comum
A História da Avenida - Rosa Oliveira
Concerto - Joaquim Pavão (realizador e compositor)

Avenida
I - Passado
II - Presente
III - Futuro
Sobre Paredes - II andamento ""Verdes Anos"
Medeia - III Andamento - Jasão
Ignorâncias I
(re)Volta e Meia
A Sesta


Convidam-se todos os aveirenses a participar na apresentação e discussão do projecto 'Avenida'.

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A “fantástica história” da avenida passa a documentário - Diário de Aveiro, 27-06-09

Joaquim Pavão realiza documentário sobre a principal artéria de Aveiro. Obra pode entrar no circuito comercial e dar origem a um DVD

“Era preciso mostrar a fantástica história de uma avenida que não é nada de mais quando comparada com tantas outras, mas é o produto da vontade férrea de um homem (dr. Lourenço Peixinho), de uma sociedade, da cidade onde escolhi habitar”. Desta forma, explica Joaquim Pavão, o realizador, nasceu “Avenida”, um documentário sobre a principal rua de Aveiro, que é hoje apresentado pela primeira vez (Mercado Negro, 21.30 horas).
O projecto insere-se no conjunto de actividades que o movimento cívico Amigos d'Avenida tem vindo a organizar em prol da dinamização daquela artéria.
O filme foi inicialmente cogitado como uma pequena peça. “Passada uma semana após a primeira reunião pública dos Amigos d'Avenida, retirei da gaveta quatro folhas de rascunho de uma futura obra para guitarra sobre Aveiro e surgiu o primeiro esboço de uma curta-metragem”, clarifica Joaquim Pavão.
Mas o projecto rapidamente evoluiu para um documentário (já vai em 60 minutos e ainda está inacabado), após uma pesquisa sobre a “história” da avenida e as “estórias” da sua gente. “Avenida” procura “recriar fielmente” o passado desta artéria com o auxílio de actores e do Grupo Cénico e Etnográfico das Barrocas, esclarece o cineasta.
“O que achei curioso é que ao olhar para a Aveiro em 1918 encontro uma grave crise económica, um período entre guerras, uma República pueril e turbulenta, emigração em busca de uma vida melhor e um poder local sem margens financeiras para agir”, diz. Lourenço Peixinho, porém, “ousou e apenas trabalhou em soluções sem parar nos problemas”. Por isso “tornou-se imprescindível prestar-lhe homenagem”.
As dificuldades em financiar a obra não têm travado o seu avanço. “Não posso deixar de fazer um paralelismo entre este projecto e a história da vontade do próprio Dr. Lourenço Peixinho, que apesar das diversas contrariedades económicas e sociais persistiu”, realça Joaquim Pavão. “Acredito nas estórias que descobri, do poder de um colectivo. Gostaria que este documentário fosse de todos, uma partilha do mesmo espaço de reflexão e empenho, uma acção conjunta”, acrescenta.
O documentário é “ambicioso a nível técnico e artístico” e comporta custos elevados. “Até ao momento não foi a falta de apoio financeiro que o deteve. No entanto, não posso deixar de reconhecer a importância que o financiamento tem para a continuidade de projectos como este”, refere, salientando que “Avenida” já foi submetido a “diversas linhas de apoio”.
Para já, e depois da apresentação, hoje, de alguns trechos do filme e da sua banda sonora (composta propositadamente, também por Joaquim Pavão), será criado um sítio na Internet com informação sobre o projecto, vídeos inéditos e fóruns de discussão.
Mais para o fim do ano está prevista a participação do documentário em festivais nacionais e internacionais e a sua entrada no circuito comercial em salas portuguesas. Para mais tarde está previsto o lançamento de um DVD.

Rui Cunha

22.6.09

Food, taste and hunger

Em 2006, por ocasião do 56º Festival Internacional de Cinema de Berlim, foi lançado um convite para a criação de uma curta-metragem temática sobre "Food, Taste and Hunger". A Organização recebeu 3600 candidaturas, mas seleccionou apenas 32 para a Berlinale Talent Campus. Este filme, do realizador Ferdinand Dimadura, foi considerado "The most popular short film" na competição.

Como li no Caderno de Sociologia (onde encontrei o filme), o problema não está na riqueza mas na sua distribuição. mais, talvez o problema não esteja sequer na desigualdade da distribuição, mas no excesso dessa desigualdade. Repito a citação de Agostinho da Silva que me acompanha há dias: «Sinto-me cada vez mais apaixonado por coisas que a matemática não prova que existam». Um dia, vai deixar de ser assim. Um dia, a demência do homo sapiens sapiens vai exprimir-se noutros territórios que não o do consumismo e da fome.