7.3.07

Se por acaso ouvires esta mensagem #3

Nenhuma nave espacial pousa diante de mim e abre uma porta de luz, de onde tu sais. Se abrir a janela, tudo o que vejo para além dela é a noite.
Na cidade não se vêem as estrelas, o céu é opaco de nevoeiro e fumos. As noites são longas, do outro lado da janela. Longas e vazias. É por isso que por vezes, em noites como esta, em que não consigo dormir e caminho como sonâmbula entre a janela e a porta, penso em ti e te imagino, como se pudesses estar ligado a mim por um fio qualquer. Tudo seria muito fácil, penso, se existisse esse fio. Haveria um nexo, uma finalidade em tudo, haveria um objectivo, que, pelo menos para ti, seria perceptível, mesmo que eu não o compreendesse. Eu estaria, como vês, pronta a aceitar a minha inferioridade, em relação a ti, a admitir que a minha inteligência não alcança o mesmo que a tua, que os teus olhos vêem muito mais longe que os meus. Se houvesse um fio a ligar-nos. Se tu mesmo tivesses atado esse fio.
Eu poderia então aceitar praticamente tudo, mesmo o mal, a loucura, o horror, o absurdo, porque estarias comigo e serias, no fim de contas, responsável. Pelo menos tanto como eu. Ou, provavelmente, mais do que eu. [continua]


autora: Teolinda Gersão
pré-publicação do conto (fragmento 3): Se por acaso ouvires esta mensagem
do livro: A Mulher que Prendeu a Chuva
editora: Sudoeste

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