18.5.12
Mais uma__duas obras de Saramago adaptadas ao cinema
2.5.12
Cegueira branca no 1º de Maio
"...quando se encontrou diante de um supermercado. Lá dentro o aspecto não era diferente, prateleireas vazias, escaparates derrubados, pelo meio vagueavam os cegos, a maior parte deles de gatas, varrendo com as mãos o chão imundo, esperando encontrar ainda algo que se pudesse aproveitar, uma lata de conserva que tivesse rsistido às pancadas com que tentaram abri-la, um pacote qualquer, do que fosse, uma batata, mesmo pisada, um naco de pão, mesmo feito pedra."
JOSÉ SARAMAGO, in Ensaio sobre a Cegueira
9.9.11
En esta esquina del tiempo
José e Pilar nos Óscares
18.6.10
José Saramago (1922-2010)

"Por um instante a morte soltou-se a si mesma, expandindo-se até às paredes, encheu o quarto todo e alongou-se como um fluido até à sala contígua, aí uma parte de si deteve-se a olhar o caderno que estava aberto sobre uma cadeira, era a suite número seis opus mil e doze em ré maior de johann sebastian bach composta em cöthen e não precisou de ter aprendido música para saber que ela havia sido escrita, como a nona sinfonia de beethoven, na tonalidade da alegria, da unidade entre os homens, da amizade e do amor. Então aconteceu algo nunca visto, algo não imaginável, a morte deixou-se cair de joelhos, era toda ela, agora, um corpo refeito, e por isso é que tinha joelhos, e pernas, e pés, e braços, e mãos, e uma cara que entre as mãos escondia, e uns ombros que tremiam não se sabe porquê, chorar não será, não se pode pedir tanto a quem sempre deixa um rasto de lágrimas por onde passa, mas nenhuma delas que seja sua. Assim como estava, nem visível nem invisível, em esqueleto nem mulher, levantou-se do chão como um sopro e entrou no quarto."
in As Intermitências da Morte (2005)
Editorial Caminho, pp. 158-159
14.11.08
Blindness - Ensaio sobre a cegueira #3
Os primeiros cinco minutos... de um filme que começa bem e não decepciona. Há inteligência na economia operada na narrativa e eficácia na gradação da densidade e da tensão. O espaço diegético é muito bem explorado. A obra de Saramago é uma parábola que Fernando Meirelles conservou em estado sólido. como se o realizador não tivesse desconstruído o romance. deixando essa parte para nós. E as leituras são forçosamente plurais. Li que a cegueira, ou quase todas as suas formas, é contagiosa. que são tão cegos os que vêem branco como os que vêem todas as formas e cores. que aqueles a quem é diagnosticada a doença têm a mesma probabilidade de salvação que os que (só) aparentemente são sãos. que as minorias são muitas vezes maiorias invisíveis, nascendo a ilusão de mero retardamento de sintomas. que qualquer forma de organização humana reproduz o modelo dominante (a teia de relações, hierarquias, ideologias, valores, aporias, evocados nesse laboratório social que é o campo de quarentena, somos nós). que, face à escassez de recursos e, sobretudo, quando se trata de sobrevivência, não predomina a solidariedade. e quem detém poder (o cego à nascença) tende a abusar desse poder, sendo raros (a heroína) os que dele se servem para servir os outros. que o absurdo é inexpugnável. que a generosidade também cega.
a minha cegueira cala-me agora. o que vos disse a vossa cegueira?
13.11.08
4.11.08
Blindness - Ensaio sobre a cegueira
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29.9.08
Claro como água
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Já conhecerão O Caderno de Saramago... Mas saberão d' A Viagem do Elefante?
[Foto MRF, Genève 2008]
23.7.07
Iberia
O seu acto constitutivo teve lugar na residência do escritor em Lisboa, no passado dia 29 de Junho. A Fundação José Saramago tem sede central nas actuais instalações da Editorial Caminho, em Lisboa, mas tem também outra sede, em Lazarote, onde Saramago habita, uma delegação em Castril (Granada) e uma extensão em Azinhaga (aldeia natal do escritor).
in Revista Atlântica de Cultura Ibero-Americana
27.3.07
Dia Mundial do Teatro #4
Luís de Camões: É Vossa reverença o revedor do meu livro...
Frei Bartolomeu Ferreira: Eu sou. E hei-de vos dizer, posto que não tenha concluído ainda a segunda leitura, que não encontro nele coisa contrária à nossa santa fé. O mesmo, porém, não ousaria dizer no que toca aos bons costumes. Vossa Mercê por todo o lado introduz nudezas, e em tal excesso que fará da leitura um constante alerme dos sentidos.
Luís de Camões: São elas muito necessárias à minha fábula. Vossa Reverença bem sabe que os antigos deuses cuidavam pouco de roupagens, em particular as deusas, consoante as vemos costumadamente representadas em pinturas e estátuas. Também Eva, nossa primeira mãe, e Adão, nosso primeiro pai...
Frei Bartolomeu Ferreira: Mais devagar, senhor Luís de Camões. Adão e Eva viviam nus quando em estado de inocência. Logo que cairam em pecado, determinou o Senhor, enfim, não o determinou o Senhor, eles foram que viram que estavam nus e vestiram-se. Por forte razão, como vedes.
in Que Farei Com Este Livro?
José Saramago
15.9.06
Então o cego perguntou, Ouviste alguma coisa ?
No Festival de Toronto, Fernando Meirelles anunciou que seu próximo filme será uma adaptação do brilhante romance “Ensaio sobre a cegueira”, do português José Saramago. (...) A versão cinematográfica de “Ensaio sobre a cegueira” já faz parte do acordo de produção e distribuição que Meirelles firmou com a norte-americana Focus Features. Será um desafio e tanto para o cineasta adaptar um livro em que a absoluta maioria dos personagens não enxerga na maior parte da trama. Link
Fernando Meirelles é o realizador de Cidade de Deus (2002) e de O Fiel Jardineiro (2005). Espero ver confirmada esta aliança de talentos e que a partir de um ensaio sobre a cegueira se crie não um, mas dois ensaios sobre a lucidez. Três tiros não era mau... que eu também não gosto de ouvir os cães uivar!
6.6.06
Moderato Cantabile

Sinais de Fogo, de Jorge de Sena (a ler, não por virtude, mas também)
Pau-Brasil, de Jean-Cristophe Rufin, Goncourt 2001 (vejam o link, leiam a entrevista)
A Pianista, de Elfriede Jelinek, Nobel da Literatura 2004
A Ignorância, de Milan Kundera (como subverter a noção de nostalgia: só há nostalgia daquilo de que não temos mais notícia. a nostalgia nasce da ignorância)
Relato de um Náufrago, de Gabriel García Márquez, Nobel da Literatura 1982 (Márquez jornalista transforma-se em escritor)
O Livro das Ilusões, de Paul Auster
Pensamentos Secretos, de David Lodge
O Cemitério dos Barcos Sem Nome, de Arturo Pérez-Reverte
A Lei do Amor, de Laura Esquível (ainda ouço o cd)
Mas há mais, muito mais... Eu vou procurar a Antologia Poética de Jorge de Sena, O Mesmo Mar de Amos Oz e talvez um romance de João Aguiar (de quem nunca li nada! o que aconselham?). E por falar em escritores portugueses, já leram Os meus Sentimentos de Dulce Maria Cardoso ("está na vanguarda da nova ficção portuguesa") ou As Duas Águas do Mar ou Lourenço Marques de Francisco José Viegas? Todos estes livros poderão agora ser adquiridos a 6 ou 10 euros!
E depois, não, não acho que a redução dos preços dos livros resolva o problema do baixo índice de leitura dos portugueses, e fico até preocupada com o mercado editorial que vai acabar por apostar ainda menos em edições para "minorias" dentro da minoria (só para usar o conceito de Saramago), e que margens vão ter as livrarias, etc.?
É quase egoísta mas sinto-me mesmo feliz quando compro um livro, porque gosto do objecto livro e da expectativa da leitura e depois, sirvo-me dessas leituras para tudo, para enfrentar a realidade e para fugir dela (oh doce terapia!). O Francisco José Viegas tem razão, "ler bem é também aproveitar a felicidade de ler". As Feiras, as promoções, as colecções a preço reduzido, permitem que compremos mais. Um "mais" diversificado, um "mais" descoberta. É o livro cuja leitura adiamos sem saber porquê, é o novo autor que nos tenta porque sim.
Saramago acha que «mal vão as coisas quando é preciso estimular (a leitura)» porque «ninguém precisa de estímulos para se entusiasmar com o futebol», que tem por trás uma «operação de propaganda fabulosa». É impressão minha ou há aqui uma contradição? A própria participação do Nobel no Plano Nacional de Leitura não serve esse esforço de propaganda? Acontece que é preciso mais, muito mais! E porquê? Acho que era a Duras que dizia: "a leitura fez-me querer ouvir a voz humana". E os portugueses, e o mundo, andam surdos!
Ler é indispensável à formação de bons cidadãos? Não. Mas também!
A Prova
9.9.05
Lx II

Nos anos 80, a situação política acalmara mas os espíritos estavam ainda agitados e frenéticos com a conquista da liberdade, o desaparecimento da censura, e a entrada no país de todas as novas (para nós) influências e correntes. Queríamos "participar", havia curiosidade. Foi bom ter 18/20 anos nessa altura pela "coincidência" de ânsias entre esse Tempo e o meu, pessoal. Politicamente, era difícil não tomar partido, mesmo sem militâncias formais. E do ponto de vista cultural, abriam-se janelas e testavam-se caminhos. A cidade experimentava também novas formas de estar. Alguém se lembra da primeira Animação do Chiado? Creio que foi em 85, actores e performers actuavam nas ruas. A SN de Belas Artes, ali ao pé, "mexia" e envolvia. Acabei mascarada de palhaço a cumprimentar as crianças que passavam. As bancas de artesanato proliferavam. Ouvia-se música portuguesa, muito Zeca Afonso, Fausto, Sérgio Godinho. Os Trovante revolucionavam o meio, enchiam o Coliseu e provocavam histeria junto das meninas. Mas também me lembro de ouvir Chico Fininho enquanto fazia o cubo mágico. Na faculdade, os professores mais liberais deixavam-nos beber cerveja nas aulas e porque ficava ali ao pé, até tivemos direito a aulas no anfiteatro ao ar livre da Gulbenkian. O primeiro a levar-nos até lá foi o Prof. de Semiologia, Pedro Frade, que para grande orgulho nosso fora entrevistado pelo JL a propósito da tese de mestrado que originaria o seu livro Figuras de Espanto, e que nos incutiu o gosto por Barthes e Baudrillard. Apetece-me falar dele e do Dr. João Loureiro, o nosso professor de Economia que no ano a seguir a nos ter dado aulas, já saía connosco para o Bairro Alto e, apaixonado por Gershwin, nos levava às Noites Longas para ouvirmos uma orquestra de jazz. Líamos Escuta, Zé Ninguém! (Wilhelm Reich) ou Nietzsche ou Sartre ou Mário-Henrique Leiria e os seus Contos do Gin-Tonic ou O Memorial do Convento de Saramago ou Memória de Elefante de Lobo Antunes ou pequenos livrinhos sobre Lenine, Marx e mesmo Catarina Eufémia. O Macintosh foi lançado (1984) mas o gabinete de informática demorou algum tempo a ser criado, pelo menos no Departamento de Sociologia. Aceitavam-se trabalhos escritos à mão porque nem todos tinham... máquina de escrever! E Lisboa continuava a convidar-nos para novas propostas! O Frágil, de Manuel Reis, era o must. Aí podíamos encontrar alguns dos pintores da nova geração. Abriam novas galerias de arte, discutia-se estética e o valor da arte. Pedro Proença e Pedro Portugal fundaram o projecto de uma revista intitulada Homeostética, a partir da qual se viria a formar o grupo Homeostético (colectivo que integrava também, no início, os nomes de Manuel João Vieira, Ivo e Xana...). Recordo-me de assistir a uma vernissage em que "Sanita Pintor" pintou com um spray o preço da obra na tela, 500 CONTOS. Diria Mário Murteira, "como se, por um golpe de mágica, tivéssemos saltado a pés juntos dum capitalismo arcaico e asfixiante para a sociedade perfeita com que sonhara o jovem Marx"!
Lisboa, a capital do país, reunia todos os tempos. E foi bom cirandar pela cidade... acreditando que, pelo menos a nossa vida, poderia ser perfeita!
João Loureiro e Pedro Frade, referidos neste post, faleceram no início dos anos 90. A FCSH da Universidade Nova perdeu então, subitamente, dois dos seus professores assistentes mais jovens e promissores. Lembro-me de passar na Av. de Berna e de ver a bandeira a meia haste. Tinha começado a trabalhar, os colegas de curso estavam dispersos pelo país, e então quis fugir dali! O problema da memória é que ela também não perdoa...
22.4.05
Pátria

Denis Okanovic
José Saramago
Pátria é uma palavra que podemos dizer
sem que a maioria do povo a reconheça
Ela não pertence ao léxico das palavras comuns
e se os políticos a referem é quase sempre com a violência
de uma retórica vã
Mas seja qual for a forma e substância dos seus símbolos
bronze ou pedra bandeira chama música ou palavra
nós sabemos que ela está viva e vitoriosa
sobre todos os obstáculos e desastres
grávida de um futuro de comum liberdade
Se a pátria é uma herança ela é também o espaço que está à nossa frente
em que temos de projectar as suas dinâmicas linhas
em que vibrará o ritmo do nosso sangue e da nossa respiração
porque ela será a realidade do que em nós é a irrealidade do nosso ideal
in António Ramos Rosa, Pátria Soberana