16.9.06

Conversa da treta

Desafios são desafios e neste devemos escrever aleatóriamente seis coisas sobre nós, passando depois o testemunho a outros seis bloguistas.

1. Nasci no Dundo e ninguém nasce e abandona o lugar onde nasceu impunemente (quem é que dizia isto?). Quando em 1971 cheguei a Portugal, estranhei o país. Às vezes revivo essa impressão.
2. Por essa altura, lembro-me de que queria muito aprender a ler. Fixei, como uma fotografia, uma imagem em que estou sentada no colo do meu pai enquanto ele lê o jornal, na nossa sala que tinha as paredes verdes, e vou apontando as letras do alfabeto. Mas o que mais me fascinava era a rapidez com que os adultos falavam e a sua capacidade de dizer palavras difíceis sem hesitações. Os pivots dos telejornais eram os meus ídolos. Eles sabiam ler, fixavam tudo, e por isso tinham sido escolhidos para contar a toda a gente o que se passava de importante no mundo. Hoje, enquanto assisto às notícias penso muitas vezes que é só conversa da treta!
3. Entrei para a escola primária no exacto dia em que fiz seis anos mas, desse dia, a única imagem que guardo é a de um longo corredor, escuro, onde os meus passos ecoavam. Tudo o que me rodeava parecia mover-se em câmara lenta. Existem momentos, hoje, em que essa sensação se repete.
4. As minhas filhas, gémeas, têm seis anos, e eu sei que elas não vão esquecer o bruar da sua nova escola com quase trezentos alunos. No primeiro dia, uma delas, não conseguiu largar-me a mão. A outra aguentou o impacto mas, à noite, só queria colo. Eu também.
5. Quando estava grávida das minhas filhas encontrei a minha professora da primária e conversámos imenso. Disse-me que, menina, eu só falava quando tinha a certeza de que estava certa e que olhava para ela como se a contemplasse. Era boa aluna mas mas era difícil comunicar comigo. Hoje, não há nada que me dê mais prazer que conversar. Contudo, dou comigo muitas vezes a ter conversas da treta, pelo que perdi uma boa qualidade. Mas conservo o espanto e ainda há quem se queixe da reserva.
6. Depois de três dias de aulas, as minhas filhas estão mais confiantes. Uma delas, à saída da escola, disse-me que já sabia escrever, porque é isso que ela mais anseia (suspeito que os desenhos que tem feito não satisfaçam a pressa que tem de ser grande). A outra, que eu imaginava igualzinha a mim aos seis anos, surpreendeu-me. Trocando impressões com a sua professora fiquei a saber que, afinal, ela não é nada tímida, mas a alegria que a põe a saltar à minha volta no regresso a casa, diz-me que, lá no fundo, o que ela mais sente é alívio face à avaliação que supunha fosse acontecer quotidianamente na nova escola. Uma coisa é certa, gostaria que guardassem uma memória feliz deste tempo. Sabes, as recordações são uma espécie de claras em castelo. Bem batidas, muito firmes, fazem com que cresçamos bem. As minhas, envolvo em cremes doces, e às vezes sabem bem, outras vezes nem por isso... enfim, conversa da treta!


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