Hoje sonhei com Atico. Era uma adolescente sentada numa sala de aulas, estava perante uma prova escrita de filosofia, e lia a pergunta: "Que filósofos conheceram Atico?"
Ainda sinto a inquietação da aluna que é surpreendida por uma pergunta que não vem no programa. Olho o professor. Ele compreende o meu desconcerto de boa aluna que sabe que vai falhar e de forma amável tenta tranquilizar-me. Diz-me que essa pergunta não está incluida na avaliação. Eu sorrio. Trata-se de um jogo. Lanço-me no desafio, começo a escrever.
Estou convencida de que Atico é um filósofo grego que conheceu Sócrates ou Platão. Depois corrijo, talvez ele seja um pré-socrático. Mas, por causa de um recente jogo de Trivial, em que descobri que Arquimedes inventou o parafuso sem fim, detenho-me no problema da medida do parafuso. Arquimedes acreditava que nada do que existe é tão grande que não possa ser medido. Como se mede um parafuso sem fim?
O tempo passou e a minha folha é um rascunho. Acho importante referir Aristóteles, talvez seja essa a resposta correcta, Aristóteles integra o programa.
Observo o professor. Ele está inclinado sobre a secretária, lê um livro. De repente estende um braço, espreguiça-se, e olha para mim divertido. Deve haver aqui uma ratoeira. Releio a pergunta. Talvez Atico seja um mar ou um lugar.
O tempo passa e começo a ficar ansiosa. Não importa se errar a resposta mas quero compor uma reacção bem pensante, quero impressioná-lo. Volto aos pré-socráticos e decido listar os princípios da existência de todas as coisas, qual seria o arché de Atico?
Ele pôs-se de pé e disse "acabou o tempo". Eu acordei.
Há tanto tempo que não recordava um sonho! Pensei no meu professor de filosofia do liceu, sempre o mesmo em todos os anos, e naquela questão que apareceu num teste. "O homem da rua pergunta - que horas são, o filósofo pergunta - o que é o tempo. Comente."
Não sei se os testes americanos passaram a dominar os exames deste novo tempo. Espero que não. A adolescente tinha razão, havia uma ratoeira no teste do sonho. Atico era mesmo um lugar: uma língua.
E esse meu professor do liceu ensinou-me a gostar de filosofia e de poesia.
Um dia ofereci-lhe uma rosa com um pé enorme. Não me lembro do momento em que apareci com a rosa. Mas na minha memória, ficou para sempre, como a cena de um filme, a imagem de um velho senhor, ligeiramente obeso, a afastar-se de mim com a rosa na mão, numa postura de menino de comunhão em dia de procissão, o pé da flôr a oscilar, e, tenho a certeza, os olhos a conter com esforço umas lágrimas teimosas.
Esta semana as minhas filhas vão entrar para a escola primária, ou, como se diz agora, para o primeiro ano do primeiro ciclo. Se elas tivessem um professor assim, eu dormiria melhor.
Ainda sinto a inquietação da aluna que é surpreendida por uma pergunta que não vem no programa. Olho o professor. Ele compreende o meu desconcerto de boa aluna que sabe que vai falhar e de forma amável tenta tranquilizar-me. Diz-me que essa pergunta não está incluida na avaliação. Eu sorrio. Trata-se de um jogo. Lanço-me no desafio, começo a escrever.
Estou convencida de que Atico é um filósofo grego que conheceu Sócrates ou Platão. Depois corrijo, talvez ele seja um pré-socrático. Mas, por causa de um recente jogo de Trivial, em que descobri que Arquimedes inventou o parafuso sem fim, detenho-me no problema da medida do parafuso. Arquimedes acreditava que nada do que existe é tão grande que não possa ser medido. Como se mede um parafuso sem fim?
O tempo passou e a minha folha é um rascunho. Acho importante referir Aristóteles, talvez seja essa a resposta correcta, Aristóteles integra o programa.
Observo o professor. Ele está inclinado sobre a secretária, lê um livro. De repente estende um braço, espreguiça-se, e olha para mim divertido. Deve haver aqui uma ratoeira. Releio a pergunta. Talvez Atico seja um mar ou um lugar.
O tempo passa e começo a ficar ansiosa. Não importa se errar a resposta mas quero compor uma reacção bem pensante, quero impressioná-lo. Volto aos pré-socráticos e decido listar os princípios da existência de todas as coisas, qual seria o arché de Atico?
Ele pôs-se de pé e disse "acabou o tempo". Eu acordei.
Há tanto tempo que não recordava um sonho! Pensei no meu professor de filosofia do liceu, sempre o mesmo em todos os anos, e naquela questão que apareceu num teste. "O homem da rua pergunta - que horas são, o filósofo pergunta - o que é o tempo. Comente."
Não sei se os testes americanos passaram a dominar os exames deste novo tempo. Espero que não. A adolescente tinha razão, havia uma ratoeira no teste do sonho. Atico era mesmo um lugar: uma língua.
E esse meu professor do liceu ensinou-me a gostar de filosofia e de poesia.
Um dia ofereci-lhe uma rosa com um pé enorme. Não me lembro do momento em que apareci com a rosa. Mas na minha memória, ficou para sempre, como a cena de um filme, a imagem de um velho senhor, ligeiramente obeso, a afastar-se de mim com a rosa na mão, numa postura de menino de comunhão em dia de procissão, o pé da flôr a oscilar, e, tenho a certeza, os olhos a conter com esforço umas lágrimas teimosas.
Esta semana as minhas filhas vão entrar para a escola primária, ou, como se diz agora, para o primeiro ano do primeiro ciclo. Se elas tivessem um professor assim, eu dormiria melhor.
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