7.9.07

À escuta #47

Em viagem, num mesmo dia, entram em Espanha (Sanábria), regressam a Portugal (Trás-Os-Montes) e, mal entram num restaurante, percebem que nas mesas à volta muitas pessoas falam francês. Conclusão da S. que poucos dias antes tinha ouvido uma explicação sobre a CE:
- Isto é que é a tal Europa, não é?

À escuta #46

A - Todos aqui são franceses!
- Não são bem franceses. São portugueses que vivem em França e estão cá de férias.
A - Mas tantos?
- Sim, no mês de Agosto têm férias e voltam à terra para matar saudades.
A - Mas se têm saudades por que não falam português?
- Alguns já vivem em França há muitos anos e habituaram-se a falar mais em francês do que em português.
A - Eu acho que eles não querem que os outros percebam o que dizem. É como se dissessem segredos em voz alta, não é? Mas isso não se faz!

6.9.07

A canção do que dorme

Subo ao sono
Os seus degraus são sete
Tu estás no sono
Elegia daquelas que partem
E um ícone de reprovação

Subo ao sono
Os seus degraus são sete
Exactamente

E nada acontece
Ou termina!
Acendo a luz
Para que os mortos vejam o sono.


Ghassan Zaqtan
in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 66


Acendam a luz por Pavarotti, falecido hoje. Acendam a luz por Eduardo Prado Coelho - cujas crónicas lia raramente sabe-se lá porquê, mas que me ofereceu «Os Universos da Crítica» aos vinte anos e deu vida neste país à figura de uma ciência que nunca deixou de me fascinar, a semiologia. Acendam a luz por Ingmar Bergman que, com «O Sétimo Selo», me fez acreditar na morte como um deus. um dia conto-vos. Acendam a luz por Antonioni que engrandeceu, blow-up, Vanessa Redgrave, um beijo, um parque e uma morte, fundindo ilusão e realidade. Façam-no também por Francisco Umbral que me disse «(E) como eram as ligas de Madame Bovary». Acendam a luz pelos 14 civis mortos na madrugada de hoje num bairro de Bagdad, enquanto dormiam, na sequência de um ataque aéreo americano. Todos desaparecidos enquanto tomava banhos de sol e de mundo ou me arranjava para o trabalho, distraída a viver.
Para que vejam o seu sono, e nós o nosso. Mesmo que nada aconteça, ou termine.

5.9.07

O estado do mundo #2d

... Ou ainda: «a cultura visual da pobreza e da moda» de Zwelethu Mthethwa.




Sem título, 2004



Sem título, da Série Sugar Cane, 2003

O estado do mundo #2c

Outro exemplo são as vitrines-gaiolas de Tracey Rose.



O estado do mundo #2b

Para ilustrar as palavras de Colin Richards sobre as imbricações do humanismo e da violência no trabalho artístico, deixo-vos um link e uma pequena amostra das perfomances do sul-africano Steven Cohen.

O estado do mundo #2



Há cerca de dois anos foi publicado um livro de Edward Said, recentemente falecido, com o título Humanism and Democratic Criticism. Neste livro, Said defende veementemente a importância desse conjunto de ideias e práticas que podemos incluir sob o rótulo «humanismo». O texto de Said é complexo, sem peias, e relaciona-se com termos que ouvimos quase todos os dias - das intervenções «humanitárias» aos crimes contra a humanidade. O Apartheid foi um desses crimes contra a humanidade, como é declarado pela resolução 3068 das Nações Unidas, aprovada a 30 de Novembro de 1973. [..] - o «crime contra a humanidade» - surgiu pela primeira vez no Acórdão de Londres de 8 de Agosto de 1945, que instaurou o tribunal de Nuremberga após a Segunda Guerra Mundial. Foi então que, «pela primeira vez na história do direito, determinados crimes foram considerados de tal magnitude que não agrediram apenas as vítimas directas nem o povo do país ou continente onde foram perpetados, mas também a humanidade no seu todo».

Há aqui claramente uma certa ideia de pan-humanismo a animar este discurso, conferindo-lhe forma, direcção e propósito. Mas igualmente importante é a relação entre o que poderíamos conceber como humano e a ideia de crime quase transcendental, um acto supremo de violência e violação inumanas. É nesta conjugação de violência e humanismo que, na minha opinião, grande parte da arte contemporânea crítica encontra o seu campo de acção. [...]
Talvez o trauma, ou a nossa reacção ao trauma, a forma como sofremos o trauma, a forma como o perpetramos, faça parte do que a nossa comum humanidade engloba. Talvez a energia contida na arte que fazemos esteja mais próxima da violência.

Colin Richards, em Feridas das Descobertas, in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 43-44



Fotografia. Mindelo, Cabo Verde, frente à (antiga) Escola Preparatória Jorge Barbosa, Junho 2005

4.9.07

O estado do mundo #1



...quereria citar a descrição de Achille Mbembe de dois discursos relacionados entre si e que constituem interpretações negativas da África generalizadas:

"A África nunca é vista como detentora de coisas e atributos que fazem propriamente parte da «natureza humana» [...] É este carácter elementar e primitivo que faz da África o mundo por excelência de tudo o que é incompleto, mutilado, inacabado, sendo a sua história reduzida a uma série de contratempos da natureza na sua busca de Humanidade. A outro nível, o discurso sobre a África é quase sempre elaborado no contexto (ou nas margens) de um metatexto sobre o animal - mais precisamente, sobre a fera: a sua experiência, o seu mundo, o seu espectáculo."


Colin Richards, em Feridas das Descobertas, in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 48


Imagem: Tapeçaria da artista cabo-verdiana Joana Pinto, Mindelo/Cabo Verde, Junho 2005

3.9.07

Primeiro dia

Em direcção ao Norte, parar aqui para ouvi-lo cantar o que nunca se esqueceu. A voz e as palavras, com célticos e lusos re-arranjos. Tão bom!



Sérgio Godinho esteve ontem na Feira da Luz em Montemor-O-Novo.



Hoje será a vez de Pedro Abrunhosa. Numa festa onde há um pouco de tudo: concursos de mel e desporto aventura, concurso de ovinos merino preto precoce ou de bovinos de raça charolesa e torneios de malha, concursos de rafeiros do Alentejo e concursos de pesca à linha, hipismo (nunca vi tantos puros lusitanos juntos!) e cicloturismo, largadas de touros e novilhadas, teatro e exposições ("em Lino gravura sobre a história “A Maior Flor do Mundo” – de José Saramago"; "brinquedos que atravessam o tempo"), oficina de crianças, carrósseis, insufláveis, tiro ao alvo, algodão doce, e uma feira de agrícola (gado, tractores, manjedouras...) e de artesanato. Mas isto não é tudo..., comem-se as melhores costeletas do mundo no restaurante Importante!

Depois do ameno Allgarve, soube bem este banho de lusas tradições!

And that's...


Acabaram-se os dias de férias na pátria. A emissão segue dentro de momentos.
Foto: Castelo de Castro Marim, na província do Allgarve