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30.7.12

"Você é feliz?" [Cinema-verité]

Sai documento histórico. Crónica de um Verão (1961) de Edgar Morin & Jean Rouch.

Observação: para assistir com LEGENDA em PORTUGUÊS, active LEGENDA "cc" no canto inferior direito do vídeo.



«Il y a deux façons de concevoir le cinéma du réel : la première est de prétendre donner à voir le réel ; la seconde est de se poser le problème du réel. De même, il y avait deux façons de concevoir le cinéma-vérité. La première était de prétendre apporter la vérité. La seconde était de se poser le problème de la vérité
Edgar Morin

29.5.12

Crime e impunidade na Casa Pia #3

O que dizer desta equipa?

O director do projecto nos EUA, Michael D. Martin
Evens, CC
Woods, JS
Soares, HL
Bernardo, M
Leitäo, J.
Simmonds, PL
Liang, L
DeRouen, T

Department of Oral Medicine, University of Washington, Seattle 98195, USA.
 


 «(...) não existe sociologia da ciência. Existem apenas inquéritos parcelares sobre a vida dos laboratórios e os costumes dos cientistas, concepções deterministas pueris que transformam a ciência em mero produto da sociedade ou, mesmo, em ideologia de classe. Uma sociologia da ciência deveria ser cientificamente mais forte do que a ciência que abarca e, no entanto, é cientificamente enferma em relação às outras ciências. Então, se não se sabe conceber cientificamente o cientista e a ciência, como pensar cientificamente a responsabilidade do cientista na sociedade

in Edgar Morin, "Ciência com Consciência"

22.5.12

Sobre colonialismo e pós-colonialismo #1

Depois de tanto degustar, ocorreu-me sugerir algumas leituras. São vários os autores. Começo por FRANTZ FANON (1925-1961), psiquiatra, militante pela independência da Algéria no FLN, nascido na Martinica e autor de uma obra histórica no que diz respeito à resistência anti-colonialista:

  • Pele Negra, Máscaras Brancas (1952)
  • L'An V de la révolution algérienne (1959)
  • Os Condenados da Terra (1961)
  • Pela Revolução Africana (1964)

Tenho nas mãos "Les damnés de la terre" (prefaciado por Jean-Paul Sartre). Fanon centra-se na psicopatologia da colonização [na origem: «le monde colonial est un monde compartimenté (...) est un monde coupé un deux, habité par des espèces différentes.»] e na questão das identidades nacionais [«la culture nationale est, sous la domination coloniale (...) condamné à la clandestinité»]. No início dos anos 60, a literatura de combate, associada ao conceito de negritude seria a única válida para formar consciências.


4.11.11

Estado de Excepção como regra


No passado, os estados de excepção (estado de sítio, estado de emergência) eram resultado de golpes militares, guerras ou catástrofes naturais. Hoje, é a economia que obriga ao estado de excepção (que é também a suspensão do contrato social que é o múnus da democracia). A ler: "Estado de Excepção" de Giorgio Agamben.

{Sigam o link do título para uma aproximação ao pensamento de Agambem}

2.2.10

Cultura: Metodologias e Investigação


O livro Cultura: Metodologias e Investigação teve a coordenação da investigadora do Centro de Línguas e Culturas e docente do Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro, Maria Manuel Baptista. Esta obra procura fazer o levantamento dos principais desafios teóricos, práticos, metodológicos e académicos desta área do saber, assumindo como ponto de partida para a reflexão a tradição anglo-saxónica dos Estudos Culturais.

O presente trabalho parte da constatação de que a investigação e o ensino da Cultura se tornaram, particularmente na última década, realidades cada vez mais presentes nos contextos universitários. Esta realidade deve-se, em primeiro lugar, à valorização social crescente que tem sido concedida a esta área, quer nos mais latos e clássicos domínios da formação humanística e artística, quer enquanto factor de conhecimento e compreensão das novas dinâmicas sociais e culturais da contemporaneidade.

Acresce ainda a esta valorização académica e social, a tomada de consciência generalizada do potencial económico que detém, tendo mesmo nascido recentemente uma área científica auto-designada por Economia da Cultura. Partindo deste reconhecimento, o presente trabalho procura fazer o levantamento dos principais desafios teóricos, práticos, metodológicos e académicos desta área do saber, assumindo como ponto de partida para a reflexão a tradição anglo-saxónica dos Estudos Culturais, questionando as suas limitações e dificuldades epistémicas, mas também assumindo as virtualidades que lhe são próprias e que se encontram ainda longe de estarem exauridas.

O livro, que recolhe as contribuições de Maria Manuel Baptista, Moisés de Lemos Martins, João Teixeira Lopes, Rosa Cabecinhas, Joaquim Barbosa, Anthony Barker, Maria Manuela Cruzeiro, Alba Carvalho, Dália Dias, Maria do Rosário Fardilha de Girardier, Miquel Beltran e Joan Llinàs, Jean-Marie Rabot e Severino Alves Filho, especialistas nas áreas da Sociologia, Literatura, Estudos Fílmicos, Linguística, Filosofia, Antropologia e Psicologia, foi editado em parceria pelo Centro de Línguas e Culturas e a Editora Ver o Verso.
____________________

Os temas desenvolvidos são variados. Reflexão sobre metodologias: etnografia dos públicos em acção, representações sociais, metodologias em estudos de cinema, história oral; Investigações: comportamentos de risco nas sociedades pós-modernas, a defesa do livre arbítrio em Miguel de Barrios, o S. João em Campina Grande (Brasil),... O meu artigo intitula-se «(Inter-)Identidade portuguesa na narrativa queirosiana sobre o colonialismo» (pp. 167-188).

Acabo de ver esta obra em destaque na Oficina do Livro (em Aveiro). Façam o favor de parar um bocadinho, folhear e... comprar! ;)

3.6.09

Vivemos uma democracia de audiência

Finalmente um bom artigo no Público. Para que fique em arquivo, transcrevo na íntegra.

«Portugal tem uma sociedade civil anestesiada, os partidos estão longe do povo e as suas direcções controlam a constituição das listas eleitorais, cujo processo é o jardim secreto da política.

O sistema político português está bloqueado e uma larga maioria dos cidadãos deixou de se reconhecer nos partidos políticos existentes, que funcionam de forma oligárquica e sonegaram a soberania popular, que lhes é delegada pelo voto e que deveriam representar. Este diagnóstico é a conclusão que ressalta da obra O Povo Semi-Soberano. Partidos Políticos e Recrutamento Parlamentar em Portugal, que identifica e analisa as especificidades portuguesas da crise dos sistemas políticos representativos.

"Vivemos uma democracia de audiência, feita de comunicação social, sondagens e líderes, em que há uma espécie de sondocracia, de videocracia e de lidercracia", resume Conceição Pequito, explicando as novas condições em que é exercida a política: "As sondagens funcionam como um escrutínio permanente ao eleitorado e é desse escrutínio que saem as ofertas políticas que os partidos direccionam, como produtos no mercado, para rentabilizar votos. Depois há a questão da videocracia, com o peso da comunicação social, que personaliza, por sua vez, os líderes. Tudo isto se vai afunilando, até que torna a sociedade civil claustrofóbica".

Esta situação é geral, mas Conceição Pequito considera que "nos outros países é menos preocupante, porque há sociedade civil". E explica que "nas democracias consolidadas a crise dos partidos tem sido compensada com o alargamento do repertório das formas de participação política, que reforça a participação na representação".

Mas em Portugal "a componente participativa só começa a existir com a introdução do referendo na Constituição em 1997". A democracia nasceu "com uma componente de democracia participativa nula, a que há é recente e os cidadãos não se mostraram receptivos. Até à data, não tem corrido muito bem". E lembra a história dos referendos e a altíssima abstenção que os tornou não-vinculativos.

"Envelhecimento precoce"
As "tendências transversais" a todos os sistemas políticos europeus são agravadas em Portugal pelo facto de ser "uma democracia demasiado jovem, mas com traços de envelhecimento precoce". Conceição Pequito considera que "é preocupante" que o sistema político português esteja "a dar saltos qualitativos para limitações do sistema democrático consolidado, mas em fase precoce". Ou seja, a sociedade está distanciada dos partidos e o povo não se sente neles representado.

Apontando as causas da especificidade portuguesa, Conceição Pequito refere em primeiro lugar a "democratização tardia", que fez com que os partidos políticos fossem "criados de cima para baixo nessa altura ou próximo, "à excepção do PCP, que existe desde 1921 com um longo passado de clandestinidade". Ora, prossegue esta investigadora, o processo é assim inverso ao dos partidos europeus que "nascem para dar voz a grupos ou classes sociais pré-existentes, para politizar clivagens que existem na sociedade, são na esfera institucional uma espécie de correia de transmissão do tecido social".

Em Portugal, "os partidos são autores e actores da democracia, todo o sistema é feito pelos partidos", vão para o Governo, vão para o Parlamento, vão para o poder local e, "só depois de instalados na esfera institucional, vão à procura da representação popular", em meados dos anos 80.

Exemplo é a ligação que os dois maiores partidos têm com as organizações sindicais ou patronais. "O PCP entra na CGTP e o PSD e o PS ficam ali dois anos hesitantes para criar um movimento representativo dos trabalhadores para responder ao avanço do PCP", lembra, prosseguindo: "E tiveram de concordar numa criação conjunta da UGT, porque a UGT é uma espécie de prestação de serviços; quando o PSD está no Governo, presta-se a assinar os acordos, e com o PS o mesmo".

Recorda o facto de "o PS e o PSD nascerem já como partidos de eleitores" que pretendem acesso ao poder, fazendo-o com a conquista do voto e através de um apelo transversal, "procurando não estar muito à esquerda, não estar muito à direita, estar ao centro". Daí "falar-se de bloco central de interesses, quando se fala da partilha dos despojos do poder político entre o PS e o PSD", o que, "ao nível da sociedade, teve um efeito perverso, que foi situar o eleitorado muito ao centro, o eleitorado moderado que está mais disponível para um discurso mais ambíguo, mais definido por factores de curto prazo como sejam a situação económica o desempenho do Governo, o apelo carismático do líder".

A segunda especificidade portuguesa é que os partidos foram também criados "em torno das figuras dos líderes e cada saída de um líder dá quase uma crise de sucessão e de perda de eleitorado e de descaracterização", o que "mostra a fragilidade, como os partidos acabam por ser quase sinónimo dos líderes conjunturais e não instituições com implantação social e ideologia sólida". Alem disso, os partidos portugueses nascem "em época mediática" e a "mediatização da política junta-se à personalização, são fenómenos que se alimentam mutuamente". E Conceição Pequito pergunta: "Quando o que interessa é o líder e os dirigentes de topo e o palco é a TV, os partidos servem para quê?"

Há uma outra particularidade portuguesa que é "um funcionalismo público partidarizado", o que, aliás, é tradição da história portuguesa e não uma particularidade da democracia pós-25 de Abril. "Há os despojos de partido, há um clientelismo partidário e estatal que dá a possibilidade de colocar pessoal no aparelho de Estado", afirma Conceição Pequito, acrescentando que Portugal "não é como a Inglaterra, que tem um serviço público autónomo da classe política".

O Povo Semi-Soberano. Partidos Políticos e Recrutamento Parlamentar em Portugal, publicada pelas Edições Almedina, divulga para o grande público a tese de doutoramento em Ciência Política defendida em 2008 por Maria da Conceição Pequito Teixeira. Esta investigadora de 37 anos é professora de Ciência Política do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa e da Universidade Aberta. A tese foi elaborada sob orientação de Adriano Moreira, professor catedrático jubilado, ex-ministro da Educação e do Ultramar de Salazar e antigo líder do CDS, que, aliás, é autor do prefácio. O co-orientador foi Julían Santamaria Ossorio, director do Departamento de Ciência Política na Universidade Complutense de Madrid.

As reformas
Como, "institucionalmente, não há democracia sem partidos", é preciso procurar ultrapassar o impasse criado pelo afastamento dos cidadãos da política. Para isso, Conceição Pequito defende que há muito a mudar no funcionamento dos partidos, em passos firmes, mas sem radicalismos. "A reforma que está por fazer em Portugal tem de começar primeiro pelos partidos, depois pelo sistema eleitoral" e finalmente é preciso "discutir o sistema de Governo", declara esta investigadora. "Só assim podemos querer aliciar a sociedade civil" para a participação partidária.

Primárias para as listas
A adopção pelos partidos de eleições primárias internas para todos os cargos electivos, "sistema que é já usado na Europa", é defendida por Conceição Pequito. "Quem escolhe os candidatos são os directórios nacionais e, quando muito, locais", mediante regras que não são transparentes e critérios que são desconhecidos, afirma. Ora isto dá "espaço de manobra a tudo o que é patrocínio e clientelismo". E frisa que "a constituição das listas é o jardim secreto da política, é onde tudo se decide, o alinhamento é calculado ao milímetro tendo em conta a constituição do Governo e as nomeações políticas".
Por isso propõe que haja "descentralização da decisão para os militantes" e que o processo "se torne mais institucional, mais formal, mais transparente". E logo mais apelativo para a militância: "O militante diria: eu escolho os candidatos à Assembleia da República, ao Parlamento Europeu, ao poder local, ou seja, eu tenho uma palavra a dizer no meu partido sobre o pessoal político e as estratégias de recrutamento do pessoal político que exercem cargos públicos electivos. Era um sinal que os partidos davam à sociedade. Era um novo direito, um novo poder de decisão, de participar na decisão sobre quem governa."

Referendos internos
"Os referendos internos para as questões programáticas" deviam ser adoptados, sublinha esta investigadora, como forma de promover o debate programático e dar "combate à fulanização da política". Conceição Pequito defende que os partidos usem as novas tecnologias de informação, mas não dando a estas um papel redutor, já que o acesso ao computador cria novas clivagens sociais e exclusões. Contudo, diz que "não faz sentido" a eleição directa do líder pelos militantes. "Muitos partidos europeus estão a voltar ao congresso, pois a eleição directa é uma guerra de personalidades, sem discussão programática".

Círculos menores e listas abertas
Defende a manutenção do sistema proporcional mas com diminuição dos círculos eleitorais e a adopção de listas plurinominais abertas, em que o eleitor escolha o partido e, se quiser, escolha o seu candidato. Sendo que esta indicação serve para ordenar a entrada em primeiro lugar dos mais votados nominalmente. Uma reforma idêntica à proposta por André Freire, Manuel Meirinho e Diogo Moreira no estudo Para uma melhoria da Representação Política, editado pela Sextante, e realizado por encomenda do PS.

Não aos independentes
A investigadora opõe-se frontalmente às candidaturas de independentes à Assembleia da República. "Isso era um risco muito grande de populismo", afirma, alertando: "Nós, em Portugal, não estamos sequer preparados para governos de coligação, como é que estamos preparados para a balbúrdia de partidos com independentes? Não acredito que tenhamos sociedade civil preparada para isso nem classe política para o efeito."
E, veemente, insiste: "Temos um legado histórico com uma sociedade civil muito fraca, que vem da Monarquia Constitucional, vem da Primeira República, vem do Estado Novo, com o seu paternalismo que é conhecido. E no pós-25 de Abril, com as maiorias absolutas ou quase absolutas, anestesiou-se a sociedade civil." Este legado histórico levou a que para a maioria dos portugueses "a estabilidade é sinónimo de governos maioritários ou monocolores", quando, "por essa Europa fora, o que mais existe são governos de coligações, às vezes até promíscuas, juntando forças partidárias que não têm nada a ver e que conseguem o milagre de governar legislaturas completas", argumenta Conceição Pequito, acrescentando que em Portugal, "quando, nos estudos, se pergunta ao eleitorado se prefere governos de maioria absoluta ou de coligação, a maioria responde de maioria e de um só partido".
E questiona, contundente: "Quem são os candidatos independentes no poder local? São pessoas que de independente têm muito pouco, são pessoas que tiveram vida partidária e que se desentenderam com o partido." Prosseguindo no diagnóstico, afirma: "E desentenderam porquê? Porque não obtiveram o que queriam e entram em ruptura, são dissidentes e rebeldes de partidos. Veja Helena Roseta, em Lisboa, Isaltino Morais, em Oeiras, Valentim Loureiro, em Gondomar, Fátima Felgueiras, em Felgueiras." Sublinhando que estes candidatos "não emanam da sociedade civil", garante que "considerá-los da sociedade civil é ser um pouco simpático", uma vez que "eles se agarram à sociedade civil quando os partidos os deixam cair".

Aumentar fiscalização do Governo
"Os partidos na Europa têm optado pela americanização" e "o sistema político tem evoluído para presidencialismo", afirma Conceição Pequito, sublinhando que, "nas legislativas, na prática, é eleito o primeiro-ministro" e o sistema parlamentar está a ser "desvirtuado".
Ou seja, "não se discute o sistema de governo, o Governo é que manda e o Parlamento é uma caixa
de eco", considera Conceição Pequito. "Há governamentalização do Parlamento. Os outros partidos fazem oposição para a televisão. No Orçamento do Estado foram viabilizadas duas propostas da oposição em mais de quinhentas.
E temos um Governo que é refém da figura do primeiro-ministro, temos ministros amestrados, que seguem à linha um guião que lhes é ditado pelo primeiro-ministro, que é uma espécie de chanceler. O próprio partido que apoia o Governo desaparece. Sendo que o Governo ainda determina os cargos de nomeação política", frisa de forma crítica, questionando: "Portanto, o que temos? Executivo, executivo, executivo. Não temos mecanismos de fiscalização, estes poderes do Parlamento desaparecem. Mas não vejo discutir esta questão."»

SÃO JOSÉ ALMEIDA PÚBLICO 01.06.2009


Ler:

18.5.09

Morin


Segundo Edgar Morin, nós somos Homo sapiens sapiens mas é redutor possuirmos um sapiens ou dois. Seria necessário acrescentar um demens. Na verdade, somos Homo sapiens sapiens demens. A Humanidade contém essa duplicidade.


O filósofo e sociólogo, autor de O[s] Método[s], Sociologia, O Paradigma Perdido, Ciência com Consciência e tantas outras obras que fizeram o meu deleite nos anos 80, vem a Portugal na próxima sexta-feira participar num colóquio (Instituto Piaget), prosseguindo a sua batalha pela mudança de paradigmas de conhecimento. Os Sete saberes para a Educação do Futuro, Educar para a Era Planetária serão mais uma vez explanados. Morin propõe um reforma profunda no sistema de ensino mundial, na qual as disciplinas seriam integradas como parte de um todo e incluiriam os princípios formadores da consciência individual, social e planetária. Fixemos um dos seus princípios: tornar possível apreender a condição humana (transformando um sistema escolar que, actualmente, desintegra a unidade complexa da natureza humana).

15.10.07

Economia sexual #3



«As pulsões pré-genitais são, por natureza, auto-eróticas, quer dizer associais; o instinto de destruição e o seu corolário erótico, o sadismo, são anti-sociais. Inserido à força na comunidade social, o indivíduo tem que renunciar aos seus próprios objectivos instintivos e aplicar as correspondentes energias (por amor ao objecto amado ou devido à coacção da educação) em objectivos importantes para a sociedade e para a civilização. Freud chamou a esse processo "sublimação".» pp. 113

«Temos que admitir que a deformação no amor tem um papel preponderante no desenvolvimento da crueldade, tanto no indivíduo como nas massas. A brutalidade da Guerra Mundial (e talvez mesmo a Guerra Mundial em si) não teria sido possível se a sede de poder de um punhado de dirigentes não tivesse encontrado qualquer eco na crueldade latente dos indivíduos. (...) Freud conseguiu explicar o entusiasmo bélico: a guerra significa a libertação colectiva dos recalcamentos e em particular das pulsões sexuais, com a autorização do pai, idealizado na pessoa do imperador; pode-se finalmente matar sem sentimento de culpabilidade.» pp. 91

«A sociologia não conseguiu dizer-nos ainda porque razão as massas se deixam submeter por alguns indivíduos. Nas condições de vida a que as massas foram submetidas até estes últimos anos (e muitas vezes hoje em dia), se os indivíduos tivessem sido submetidos às mesmas restrições sexuais das classes dominantes, não teriam faltado revoltas caóticas. Esta docilidade psíquica relativa das massas (...) é mais uma vez imputável, entre outras coisas, à liberdade relativa da genitalidade, porque a sua satisfação retira energia às pulsões sádicas. Evidentemente, quando a brutalidade de um indivíduo acorda, é muito mais primitiva e irreflectida do que nas classes dirigentes, porque lhes falta a fachada e a máscara do civismo.» pp. 93-94

«Consequentemente, todos os que pregam o ascetismo em nome de ideologias culturais ou religiosas e com isso só conseguem resultados opostos, andariam melhor, no seu próprio interesse, se dessem a sua colaboração ao desenvolvimento da sexualidade sensual e física; quer dizer, se se deixassem de "depreciar a vida amorosa" (Freud) e substituíssem o slogan Civilização ou Sensualidade por outro: Civilização na Sensualidade. Quando a civilização for uma sublimação e não já uma grande neurose colectiva, tudo o resto deveria vir por si.» pp. 117-118

in Psicopatologia e Sociologia da Vida Sexual (Die Funktion des Orgasmus), de Wilhelm Reich, Publicações Escorpião, Colecção editor/contraditor 6, Porto, Junho 2007


(Imagens via)

Economia Sexual #2



Wilhelm Reich (1897-1957), doutor em medicina, especializado em neuro-psiquiatria, publicou o seu primeiro trabalho, intitulado «O Coito e os Sexos», depois de ingressar na Sociedade Vienense de Psicanálise fundada por Sigmund Freud. Foi também o primeiro assistente de Freud na Policlínica Psicanalítica (1922). Em 1923 apresentou o seu primeiro estudo sobre o que viria a ser «A Função do Orgasmo» e logo se deparou com sérias objecções. Pouco tempo depois, em 1926, as suas teorias sobre "potência orgástica" não são admitidas por Freud (que assiste a uma conferência de Reich para, no final, refutar a tese). Mas «Die Funktion des Orgasmus», obra em dois volumes que descobri num alfarrabista há vários anos, ser-lhe-á dedicada. Reich dedica-a ao seu "mestre" como "prova de profundo respeito".
Em 1927 ingressa no Partido Comunista austríaco. Em 1928 funda, em Viena, a Sociedade Socialista de Informação e Investigação Sexuais - e cria numerosos "dispensários de higiéne mental". No ano seguinte cria "centros de higiéne sexual" que terão grande afluência de pessoas ansiosas por conhecer o novo conceito de sexo.
Em 1931, já estabelecido em Berlim, funda a SEXPOL (Associação para uma política sexual proletária) - esta expande-se rapidamente, em dois anos tem 40000 membros e ramificações em todos os centros industriais do país. Reich concilia as descobertas de Freud com a praxis revolucionária, lutando pela emancipação económica e política do proletariado e, ao mesmo tempo, pela sua "libertação sexual".
Tanto êxito causará alarme ao Comité Central do P.C. alemão que tenta neutralizá-lo oferecendo-lhe um cargo - que recusa - num comité político. Em 1932, com o objectivo de se libertar de qualquer tutela ou pressão, funda a sua própria editora - Edições de Política Sexual, que logo instalará em Copenhaga com o nome Sexpol-Verlag. Em Outubro, o diário das Juventudes Comunistas, Roger Sport, toma oficialmente partido contra Wilhelm Reich, proibindo a difusão dos seus textos. Eis alguns dos opúsculos banidos: «O triângulo de giz - revelação dos segredos adultos» (destinado às crianças), «Quando o teu filho te interroga» (destinado aos pais).


Mas é ainda em 1932 que publica alguns dos seus artigos e livros mais polémicos: «O carácter maso-quista», em que critica a interpretação freudiana do masoquismo, foi publicado numa revista dirigida__ por Freud; «O combate sexual da juventude»; «A irrupção da moral sexual - história da economia sexual».

A chegada ao poder dos nazis obriga-o a fugir da Alemanha. Primeiro refugia-se em Viena mas até Freud o evita por ser comunista e por ter usado a psicanálise "com fins alheios à sua essência". Instala-se em Copenhaga mas é instado a abandonar a Dinamarca (é um agente provocador para o Comité do P.C. e um indesejável revolucionário para as forças de direita). É expulso do P.C. Alemão, ao mesmo tempo que o regime hitleriano inscreve no seu Índice de livros «O combate sexual da juventude».
Em 1934 vai para a Suécia mas também será obrigado a abandonar o país. Estabelece-se em Oslo, onde residirá cinco anos (inicialmente com o pseudónimo de Peter Setein), e em cuja universidade se entrega aos estudos da biogénese.



Em 1939 aceita o convite de Theodore P. Wolfe, porta-voz da Sociedade Americana de Medicina psicanalítica, e muda-se para os EUA. Trabalha como professor da New School for Social Research de Nova Iorque (até 1941). Aprofunda as suas pesquisas biofísicas, descobre o
órgon cósmico. Em 1942 cria o seu laboratório Orgone Institute e funda o «International Journal of Sex-Economy and Orgone Research». Constrói uma cosmogonia baseada no órgan, espécie de cosmos de energia vital. Lança no mercado uns acumuladores de orgones destinados a abrir caminhos no diagnóstico e terapêutica da maioria das doenças funcionais («biopatias»), incluindo o cancro.
Consagra os últimos 23 anos da sua vida a este projecto científico. Progressivamente renuncia ao ideal revolucionário marxista. Em 1946 é editada nos EUA «A Psicologia de massa do fascismo», profundamente modificada pelo autor, com uma crítica às teses leninistas de «O Estado e a Revolução» e com uma análise do capitalismo de Estado soviético como antípoda da verdadeira democracia do trabalho socialista.
Em 1954, a Federal Food and Drug Administration, apoiando-se nas leis federais sobre a venda de objectos terapêuticos, instruiu-lhe um processo, de evidente cariz político e que se insere na recém-iniciada «caça às bruxas» de MacCarthy. Reich não se apresenta no julgamento (alegando que só responderá diante de cientistas) e é condenado a cessar todas as suas actividades médicas, além de que todos os seus livros são proibidos. A 11 de Março é preso na penitenciária federal de Lewisburg, na Pensilvânia. A 3 de Novembro morre naquela penitenciária com um enfarte.

Ler mais:
Psicopatologia e Sociologia da Vida Sexual (Die Funktion des Orgasmus), de Wilhelm Reich, Publicações Escorpião, Colecção editor/contraditor 6, Porto, Junho 2007



Wilhelm Reich - essência e conseqüência, in Revista Reichiana, ano XIII, Nº 13, outubro 2004, pp. 12-23
ISSN 1678-9792, uma publicação do Departamento Reichiano do Instituto Sedes Sapientiae, São Paulo SP

27.9.07

Internet #1

A Internet não é uma simples tecnologia de comunicação. É evidente que está no epicentro de muitas áreas da actividade social, económica e política.

À medida que o fenómeno amadurece, o perfil demográfico dos utilizadores - nos EUA e Europa, aproxima-se mais da população como um todo. O acesso à banda larga favoreceu esse crescimento. Mas em África, apenas 0.6 por cento da população (uma grande parte na África do Sul) tinha acesso à Internet no remoto (eu sei) ano 2000. A info-exclusão nas zonas pobres do planeta é um problema real.

Mesmo à escala nacional, percebemos facilmente que a Internet é um instrumento de exclusão social: segundo dados de 2004*, 9 em cada 10 especialistas de profissões intelectuais e científicas utilizavam Internet, contra 1 em cada dez trabalhadores não qualificados.

Os próprios Estados advertem de que não haverá uma verdadeira inserção na realidade contemporânea sem uma participação eficiente no mercado do conhecimento. Por isso fico perplexa quando Manuel Castells, autor dos três volumes de A Era da Informação (1996-2004) e de Galáxia Internet (2001), afirma que: «A web não isola e tampouco é instrumento do poder ou do mundo dos negócios. Ao contrário. É um espaço descentralizador e cidadão. A Internet é um fenómeno económico, social e político, mas não é tecnologia que traga uma solução global para os problemas da humanidade nem um sistema que crie desigualdades sociais.»

Sobre os efeitos da web no grau de sociabilidade, continuam a realizar-se estudos, mas não há consenso. Que qualquer determinismo tecnológico seria redutor, concordo. O impacto da Internet tornou-se possível devido a uma série de mudanças sociais que começaram em 1850, com a revolução industrial, e, numa escala temporal mais curta, no pós-guerra. Estou a falar de coisas tão diferentes, mas convergentes no efeito que permitiu a expansão da Internet, como o acesso a bens de consumo de massa, a competitividade em matéria científica (e bélica) entre os dois blocos na Guerra Fria, a cultura libertária dos anos 60 e 70, a crise da família tradicional e o declínio do papel de cooperação que a família tinha, bem como os novos modelos de urbanismo, em prol de um certo culto do individualismo. A Internet estará a criar uma revolução e estaremos no início de uma nova era, mas as condições para essa revolução se operar estavam criadas.

Não é uma solução global para os problemas da humanidade. Mas acentua desigualdades. Pior que isso, apesar da sua influência no sistema socio-político, pela possibilidade que dá ao cidadão comum de expressar descontentamento (político), pela emergência de movimentos sociais criados por comunidades vituais (movimentos "emocionais" porque pretendem formar consciências e não tomar o poder do Estado, ao contrário dos partidos políticos), apesar da proclamada democracidade (ou aproximação ao modelo democrático) (Alain Touraine dizia há anos que não existiam sociedades democráticas ou totalitárias, mas sociedades que aspiravam a um ou a outro modelo), apesar destas múltiplas vozes que visam calar "a voz do dono", nunca o mundo esteve tão desiquilibrado e injusto. (esqueçam o "nunca", ou talvez não).

A verdade é que a par dos avanços (cada vez mais céleres) em termos de progresso tecnológico, científico e até cívico - que nos faz viver envolvidos em redes de comunicação transnacionais, em redes de mobilidade viária e áerea infindáveis, em circuitos de migrações, em países com sistemas de ensino obrigatório e sistemas nacionais de saúde gratuitos, em normas de regulamentação comunitárias e princípios de direitos humanos - a par deste movimento, nunca a incerteza e o medo foram tão grandes e diversos. Falta de trabalho, solidão, depressões, aumento da criminalidade, terrorismo, insegurança, degradação ambiental, miséria e fome, racismo, intolerância religiosa. Castells tem razão, a culpa e a solução não estão na Internet. O nome do papão é outro: capitalismo global. Em 2015, vaticina a ONU, 51 por cento dos pobres do mundo estarão concentrados em África.


Mas como podemos não utilizar essa ferramenta potente, no sentido de diminuir o déficit de justiça no mundo? Como deixar passar em claro que a rede que une pessoas, povos e continentes, e que é contemporânea do turismo em massa, não favorece maior aceitação dos fluxos migratórios, coincidindo a sua expansão, pelo contrário, com o crescimento de nacionalismos extremistas e sentimentos de xenofobia? A Internet pode ou não mudar a nossa visão global do mundo?

A web é, e será cada vez mais, instrumento do poder e do mundo dos negócios. Não me refiro apenas ao desenvolvimento de tecnologias de controle - as de identificação (passwords), as de vigilância (que interceptam mensagens) e as de investigação (elaboração de bases de dados). Dados os apelos à segurança na rede e à vulnerabilidade de cidadãos (e de Estados), estas novas tecnologias que atacam a privacidade dos cidadãos e afectam a liberdade de expressão, são aceites por todos nós com naturalidade. A web é um instrumento do poder porque as propostas educativas reflectem mais tecnologia e menos humanidade. A web é parte da solução global porque é um instrumento potente criado pelo Homem e formatado para o servir. Não existem «não lugares», mesmo se o virtual é real.


* Inquérito à Utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação pela População Portuguesa, Resultados 2004, UMIC, Observatório da Inovação e Conhecimento

22.9.07

Se existem livros que podem mudar as nossas vidas


... são os destes senhores. Assimilamos paradigmas, reflectimos sobre a realidade em que vivemos, fazemos síntese(s), projectamo-nos nas suas elaborações, às vezes tememos as suas conclusões, as tendências que percebem no devir das (diferentes) civilizações. Ando a ler o quarto da lista. O último foi um dos primeiros a mudar a minha vida.
Eis o ranking da Social Science Citation Index (SSCI) relativo ao grupo de académicos mais reconhecidos no mundo das Ciências Sociais, 2000-2006:

Anthony Giddens 6190 cit.
Robert Putnam 4813 cit
Jurgen Habermas 4087 cit.
Manuel Castells 3089 cit.
David Harvey 3071 cit.
Ulrich Beck 2880 cit.
Samuel Huntington 2352 cit.
Saskia Sassen 1708 cit.
Daniel Bell 1410 cit.
Amitai Etzioni 1398 cit.
David Held 1282 cit.
Peter Hall 1157 cit.
Richard Sennett 978 cit.
Immanuel Wallerstein 939 cit.
Jean Baudrillard 862 cit.
Juan Linz 844 cit.
Claus Offe 805 cit.
Michael Burawoy 785 cit.
Alain Touraine 417 cit.
Mary Kaldor 317 cit.
Edgar Morin 142 cit.


5.9.07

O estado do mundo #2



Há cerca de dois anos foi publicado um livro de Edward Said, recentemente falecido, com o título Humanism and Democratic Criticism. Neste livro, Said defende veementemente a importância desse conjunto de ideias e práticas que podemos incluir sob o rótulo «humanismo». O texto de Said é complexo, sem peias, e relaciona-se com termos que ouvimos quase todos os dias - das intervenções «humanitárias» aos crimes contra a humanidade. O Apartheid foi um desses crimes contra a humanidade, como é declarado pela resolução 3068 das Nações Unidas, aprovada a 30 de Novembro de 1973. [..] - o «crime contra a humanidade» - surgiu pela primeira vez no Acórdão de Londres de 8 de Agosto de 1945, que instaurou o tribunal de Nuremberga após a Segunda Guerra Mundial. Foi então que, «pela primeira vez na história do direito, determinados crimes foram considerados de tal magnitude que não agrediram apenas as vítimas directas nem o povo do país ou continente onde foram perpetados, mas também a humanidade no seu todo».

Há aqui claramente uma certa ideia de pan-humanismo a animar este discurso, conferindo-lhe forma, direcção e propósito. Mas igualmente importante é a relação entre o que poderíamos conceber como humano e a ideia de crime quase transcendental, um acto supremo de violência e violação inumanas. É nesta conjugação de violência e humanismo que, na minha opinião, grande parte da arte contemporânea crítica encontra o seu campo de acção. [...]
Talvez o trauma, ou a nossa reacção ao trauma, a forma como sofremos o trauma, a forma como o perpetramos, faça parte do que a nossa comum humanidade engloba. Talvez a energia contida na arte que fazemos esteja mais próxima da violência.

Colin Richards, em Feridas das Descobertas, in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 43-44



Fotografia. Mindelo, Cabo Verde, frente à (antiga) Escola Preparatória Jorge Barbosa, Junho 2005

4.9.07

O estado do mundo #1



...quereria citar a descrição de Achille Mbembe de dois discursos relacionados entre si e que constituem interpretações negativas da África generalizadas:

"A África nunca é vista como detentora de coisas e atributos que fazem propriamente parte da «natureza humana» [...] É este carácter elementar e primitivo que faz da África o mundo por excelência de tudo o que é incompleto, mutilado, inacabado, sendo a sua história reduzida a uma série de contratempos da natureza na sua busca de Humanidade. A outro nível, o discurso sobre a África é quase sempre elaborado no contexto (ou nas margens) de um metatexto sobre o animal - mais precisamente, sobre a fera: a sua experiência, o seu mundo, o seu espectáculo."


Colin Richards, em Feridas das Descobertas, in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 48


Imagem: Tapeçaria da artista cabo-verdiana Joana Pinto, Mindelo/Cabo Verde, Junho 2005

21.7.07

Gilberto Freyre

"Costuma dizer-se que a civilização e a sifilização andam juntas. O Brasil, entretanto, parece ter-se sifilizado antes de se haver civilizado. A contaminação da sífilis em massa ocorreria nas senzalas, mas não que o negro já viesse contaminado. Foram os senhores das casas-grandes que contaminaram as negras das senzalas. Por muito tempo dominou no Brasil a crença de que para um sifilítico não há melhor depurativo que uma negrinha virgem."

No dia 18 de Julho fez 20 anos que morreu Gilberto Freyre, sociólogo brasileiro que escreveu Casa-Grande & Senzala (Ed. Livros do Brasil). Este livro foi publicado em 1933 mas, nos anos 80, quando li a obra, ela ainda me pareceu revolucionária (e bela). Gilberto Freyre parte da estrutura habitacional (e arquitectónica) para nos introduzir na sociedade dos senhores e escravos do Brasil, desde o século XVI. E acaba defendendo o ideal da miscigenação.

É o criador do conceito de Luso-tropicalismo. Os processos portugueses de integração de povos autóctones e de culturas diferentes da europeia teriam gerado um complexo novo de civilização, o luso tropical, fundador da identidade cultural brasileira.

A minha paixão por Gilberto Freyre perdura, mesmo depois de todas as críticas de que foi alvo (precisamente a partir da década de 80). Mas ele sempre gerou crítica e reinvenção.

Se nunca leram, procurem o livro e deixem-no acompanhar os vossos banhos de sol. Recentemente, também fiquei com vontade de conhecer as Assombrações do Recife Velho.

5.7.07

Últimas leituras

Filipe Tourais, desculpa o atraso, mas a engomar sou mesmo lenta...

Os últimos cinco livros que li foram:

- Extensão do domínio da luta, de
Michel Houellebecq
- O sol dos Scorta, de
Laurent Gaudé
- Teoria Estética, de
Theodor Adorno
- As casas pressentidas, de
Luís Serrano (poesia)
- Sexo feminino, meu ser, de
Nhári Viana (poesia)

Ando a ler:
- Uma História de amor e Trevas, de
Amos Oz


InApto, Carlos Araújo Alves, Windtalker, Octávio Lima, non-blogger Pirata Vermelho, perdoem a curiosidade, mas o que andaram vocês a ler nos últimos tempos?

9.5.07

Sociedade de Mulheres

Li apenas algumas críticas ao livro e entrevistas on line a Alain Touraine mas este é um ensaio que vou querer ler. até porque Touraine nunca cairia na tentação de um (pós) feminismo fácil. O que o sociólogo defende é a existência de um novo paradigma. Na pós-modernidade, afirma, as mulheres desenvolveram uma nova visão para elas e para os homens, à qual estes últimos não se opõem. As mulheres unificaram/unificam o que a "sociedade masculina" polarizou: elites (concentração do poder e do conhecimento) e massas (trabalho manual, consumo imediato), público e privado (sentimentos, mundo feminino, crianças), sexualidade e espírito, etc.. Nesse sentido, a linguagem das mulheres tornou-se dominante. (Um dia não fará sentido falar de linguagem das mulheres, porque esta será a linguagem das sociedades ocidentais)
(esta é também uma declaração que põe termo à guerra entre sexos)


Algum dos senhores discorda desta visão (sucinta)?

17.3.07

Guerra aos porcos

Para além da literatura e de Bioy Casares, uma perspectiva visual da velhice (subam a persiana do blog, de Senso a Senso). Habituamo-nos a ver corpos esteticamente perfeitos, fechamos a lente, a mente, a rugas e peles flácidas, a fadigas e loucuras de corpos envelhecidos. Apagamos os signos da passagem do tempo, as marcas da aventura da vida. Apagamos o prazer na velhice. Porquê?

Baudrillard ou Coplans afirmam -self. Mas nós não nos revemos nas imagens. Aqueles são outros. outra raça de (ir)realidade. others que não, nunca, ourselves.

8.3.07

Baudrillard. 27 de Julho de 1929 - 6 de Março de 2007

Auto-retrato
Jean Baudrillard

Quem me falou pela primeira vez de JB foi o meu professor de semiologia da Universidade Nova, Pedro Frade, que andava a elaborar a sua tese de mestrado sobre fotografia, ou sobre como o nosso espanto gera formas acríticas de relação com o complexo industrial-técnico-científico-cultural (em 1992, a ASA publicou Figuras do Espanto, de Pedro Frade). A imagem fotográfica afasta ou atrai a população da realidade? - esta foi a questão que Baudrillard levantou (e que mais tarde inspiraria os irmãos Wachowski na criação de Matrix) (o hacker Neo/Keanu Reeves guarda os seus programas de paraísos artificiais no fundo falso do livro Simulacros e Simulação, de Baudrillard) (filmes que ele não gostou de ver, até porque hoje, tudo é efeito especial). Qual o impacto da comunicação e dos media na sociedade e cultura contemporâneas? Baudrillard estuda, decompõe, desmistifica a hiper-realidade (a realidade construída).

Sobre si dizia que era um dissidente da verdade. Não acreditava na ideia de um discurso de verdade, de uma realidade única e inquestionável. Desenvolvia uma teoria irónica que tinha por finalidade formular hipóteses. Examinava a vida que acontece no momento, como um fotógrafo. Aliás, JB era também um fotógrafo.

Os primeiros livros que li, O Sistema dos Objectos e Para uma Economia Política dos Signos, estariam já ultrapassados, segundo o próprio Baudrillard. Nessas obras, escritas nos anos 60, ele analisava o papel do valor dos signos nas trocas humanas. Actualmente, cada signo tende a transformar-se num objecto em si mesmo, tendo valor de uso e de troca em simultâneo. Para ele, o relativismo dos signos resultou numa espécie de catástrofe simbólica.

E a arte. A arte integrou-se no ciclo da banalidade. Ela voltou a ser realista, a desejar a restituição da reprodução clássica. A arte quer cumplicidade do público e gozar de um status especial de culto, situação prefigurada nas sinfonias de Gustav Mahler. Claro que há excepções, mas, em geral, os artistas renderam-se à realidade tecnológica. Desde os ready-mades de Marcel Duchamp, a importância da arte diminuiu, porque a obra de arte deixou de ter um valor em si. Os signos soterraram a singularidade. Os artistas submetem-se a imperativos políticos, e já não seguem ideais estéticos. A arte já não transforma a realidade e isso é muito grave.

Foi acusado de cair no relativismo mais absoluto. Mas Baudrillard limitou-se a descodificar. Não por acaso, o Libération anuncia a sua morte com o título: Fini de décoder.

[Ver Dossier sobre Jean Baudrillard no Le Monde]
[Ler artigo no Fígaro: Jean Baudrillard l'inclassable]

10.2.06

Classes mais altas preferem hipermercados.


Aquela ideia de que é o povo que adora passear em hipers no fim de semana deve ser corrigida. Na verdade são as classes mais altas que preferem este tipo de estabelecimento.

Cerca de 40,5% do valor despendido pela classe social alta e média alta em bens de consumo corrente para o lar é gasto em hipermercados, sendo neste tipo de loja que esta classe social gasta a maior percentagem do seu orçamento para as compras do lar.

As classes sociais média e baixa despendem a maior percentagem de valor gasto em compras para o lar nos supermercados. Do total de gastos efectuados nestas compras pelos lares da classe social média, 37.8% foi realizado nos supermercados. Nos lares das classes média baixa e baixa, 39.7% dos gastos em compras para o lar foram feitos neste tipo de lojas. É também a classe social mais baixa que despende uma percentagem mais elevada do seu orçamento em mercearias e nos outros tipos de estabelecimentos, 7.2% e 13.9%, respectivamente.

Fonte: Marktest Retail Index