5.9.07

O estado do mundo #2



Há cerca de dois anos foi publicado um livro de Edward Said, recentemente falecido, com o título Humanism and Democratic Criticism. Neste livro, Said defende veementemente a importância desse conjunto de ideias e práticas que podemos incluir sob o rótulo «humanismo». O texto de Said é complexo, sem peias, e relaciona-se com termos que ouvimos quase todos os dias - das intervenções «humanitárias» aos crimes contra a humanidade. O Apartheid foi um desses crimes contra a humanidade, como é declarado pela resolução 3068 das Nações Unidas, aprovada a 30 de Novembro de 1973. [..] - o «crime contra a humanidade» - surgiu pela primeira vez no Acórdão de Londres de 8 de Agosto de 1945, que instaurou o tribunal de Nuremberga após a Segunda Guerra Mundial. Foi então que, «pela primeira vez na história do direito, determinados crimes foram considerados de tal magnitude que não agrediram apenas as vítimas directas nem o povo do país ou continente onde foram perpetados, mas também a humanidade no seu todo».

Há aqui claramente uma certa ideia de pan-humanismo a animar este discurso, conferindo-lhe forma, direcção e propósito. Mas igualmente importante é a relação entre o que poderíamos conceber como humano e a ideia de crime quase transcendental, um acto supremo de violência e violação inumanas. É nesta conjugação de violência e humanismo que, na minha opinião, grande parte da arte contemporânea crítica encontra o seu campo de acção. [...]
Talvez o trauma, ou a nossa reacção ao trauma, a forma como sofremos o trauma, a forma como o perpetramos, faça parte do que a nossa comum humanidade engloba. Talvez a energia contida na arte que fazemos esteja mais próxima da violência.

Colin Richards, em Feridas das Descobertas, in O Estado do Mundo
Fundação Calouste Gulbenkian/Tinta da China
2007, pp. 43-44



Fotografia. Mindelo, Cabo Verde, frente à (antiga) Escola Preparatória Jorge Barbosa, Junho 2005

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