29.11.04

A Condição Humana II

Sobre a Bondade

"A bondade num estilo absoluto, em contraposição à utilidade ou à excelência na antiguidade greco-romana, apenas se tornou conhecida na nossa civilização com o advento do cristianismo." p. 87

"A única actividade que Jesus ensinou, por palavras e actos, foi a bondade; e a bondade contém, obviamente, uma certa tendência para evitar ser vista e ouvida. (...) Quando a bondade se mostra abertamente já não é bondade, embora possa ser útil como caridade organizada ou como acto de solidariedade. Daí: Não dês as esmolas diante dos homens, para seres visto por eles." p. 88

"Talvez seja esta curiosa qualidade negativa da bondade, a ausência do fenómeno visível da aparência, o que torna o surgimento de Jesus de Nazaré na história um acontecimento tão profundamente paradoxal" p. 88

"Por que me chamais bom? (...) toda a vida de Jesus parece atestar que o amor à bondade resulta da compreensão de que nenhum homem pode ser bom." p. 88

"E, no entanto, o amor à bondade, ao contrário do amor à sabedoria, não se limita à experiência de poucos, da mesma forma que o isolamento, ao contrário da solidão, está ao alcance da experiência de todos os homens. Em certo sentido, portanto, a bondade e o isolamento têm muito mais relevância para a política que a sabedoria e a solidão." p. 90

"Talvez ninguém tenha percebido tão claramente essa qualidade destrutiva da bondade como Maquiavel que, numa passagem famosa, tem a ousadia de ensinar os homens a não serem bons. (...) A bondade que sai do seu esconderijo e assume papel público deixa de ser boa: torna-se corrupta nos seus próprios termos..." p. 91


in Arendt, Hannah, A Condição Humana, Relógio d' Agua, 2001