20.7.12

Corta-fogo


"O fumo ainda não desapareceu e não vai desaparecer nunca. É certo que tudo renasce. As roupas, o tecido dos bancos do automóvel, o meu cabelo: tudo cheira ainda a fumo, tudo é fumo. Se há memória que sobreviva ao fogo é o cheiro denso e negro do fumo transformado em cinzas.(...)

Vi como uma casa inteira desaparece e passados dias o chão ainda arde. Ouvi as lágrimas de quem tudo perdeu. Acompanhei corporações de bombeiros que já não viam a família há mais de duas semanas, alguns há um mês. Compreendi a necessidade de descanso quando vi bombeiros a dormir em cantos impróprios para o sono. Fui expulso de uma pequena localidade por fotografar, o medo sempre fez sobressair o melhor ou o pior de todos nós. Quando foi necessário pousei a câmara e ajudei com o que pude no combate às chamas. Recusei-me sempre a pensar que tudo aquilo não me pertencia, recusei-me sempre a ser espectador nos momentos mais críticos. Teria sido um erro enorme não pensar que eu não fazia parte dos acontecimentos. (...)"


Nelson D'aires, vencedor do Prémio FNAC de fotografia "Novos Talentos" 2006, com uma série de fotos (ou só esta?) sobre um terrível incêndio na Pampilhosa em 2005.

O horror, sempre. Nesta foto, a perda de tudo.

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