6.12.06

O Bairro de Gonçalo M. Tavares


O Bairro de Gonçalo M. Tavares tem mais um habitante, O Senhor Walser. Imagino que o Senhor Henri e o Senhor Valéry não lhe liguem nenhuma, que o Senhor Brecht tenha grandes discussões com ele___ enfim, quando o encontrar, que a casa fica um pouco afastada.

Por agora, nas minhas leituras, o Senhor Walser anda muito satisfeito consigo mesmo. Mas sei que vai ter umas visitas menos agradáveis...

"Mal se abre a porta de sua casa - sente ele - entra-se noutro mundo. Como se não fosse apenas um movimento físico no espaço - dois passos que se dão - mas também uma deslocação - bem mais intensa - no tempo; do pé de trás que vem ainda com o cheiro a terra e com a sensação, nada objectiva, mas que existe, de que está rodeado de coisas vivas que não compreendemos na totalidade e não nos compreendem - os elementos da floresta -, desse pé de trás para o pé da frente, que já ultrapassou a ombreira da porta, a distância não deve ser medida em centímetros de passada, mas em séculos, talvez milénios.
Quando fechava a porta atrás de si, Walser sentia virar costas à inumana bestialidade (de que saíra, é certo, há biliões de anos atrás, um ser dotado de uma inteligência invulgar - esse construtor solitário que era o Homem) e entrar em cheio nos efeitos que essa ruptura entre a humanidade e a restante natureza provocara; uma casa no meio da floresta, eis a conquista da racionalidade absoluta."

in O Senhor Walser, de Gonçalo M. Tavares, Ed. Caminho, Outubro 2006, pp 13


P.S.: Bibliografia em português de Robert Walser

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