18.11.11

Nada a temer

“Se temos medo da morte, não temos medo de morrer; se temos medo de morrer, não temos medo da morte. Mas não há razão lógica para que um medo exclua o outro; não há razão para que o espírito, com um pouco de treino não possa expandir-se e incluir ambos. Na qualidade de pessoa que não se importava de morrer desde que depois não ficasse morto, posso certamente começar a elaborar quais seriam os meus medos em relação à morte. Receio ser como o meu pai que, sentado numa cadeira ao lado da cama do hospital, me censurava com irritação pouco habitual – “Disseste que vinhas ontem.” – antes de deduzir pelo meu embaraço que fora ele quem confundira as coisas. Receio ser como a minha mãe, quando imaginava que ainda jogava ténis. Receio ser como aquele meu amigo que, ansiando pela morte, nos confidenciava incessantemente que conseguira obter e engolir comprimidos suficientes para se matar, mas se encontrava agora numa agitação ansiosa, porque os seus actos podiam causar problemas a uma enfermeira. Receio ser como aquele homem de letras de uma cortesia inata, que conheci e que, ao ficar senil, começou a falar constantemente à mulher nas fantasias sexuais mais extremas, como se isso fosse o que secretamente sempre desejara fazer-lhe. Receio ser como Somerset Maugham octogenário, que baixava as calças atrás do sofá e defecava no tapete (apesar de isso me fazer lembrar alegremente a minha infância).”



Nada a Temer, Julian Barnes, Editora Quetzal

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Julian Barnes nasceu em 1946 e este é bem o livro de um homem que passou a fasquia dos 60 anos. Muitos escritores sentem necessidade de escrever sobre essa fase da vida. Mas se Roth ou Coetzee, Bioy Casares ou Garcia Márquez se centraram no envelhecimento, Barnes coloca o enfoque mais directamente na morte. Há um pendor autobiográfico (referência a familiares e amigos, muitos já mortos). E a assupção da subjectividade/selectividade da memória. Muita intertextualidade: de Montaigne a Somerset Maugham (evocado no fragmento acima). Ou muita biografia literária (é mais correcto dizer isto): referência a relatos de/sobre a morte de diferentes escritores. Não é um livro encantatório. O título não traduz o pensamento do autor; há ambiguidade na relação com a morte. A escrita é um exercício de libertação do medo. Nas reflexões sobre a fé em Deus (Barnes é um assumido agnóstico), lembra-me Camus. Não crer mas desejar um Criador. Em Barnes, motivado pela ideia de que a crença está também na génese da ficção. porque "imaginosa". Valida a crença também pelos eventuais efeitos benéficos, o apaziguamento. (e aí identifico-me completamente com ele. Deus ou anti-depressivos? - isto sou eu que digo, não ele)(já estou a disparatar). Bem, eu gostei. Mas é triste. Ficamos tristes. O nada mete medo.
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[Imagem: Alfred Stieglitz's "Georgia O'Keeffe (Hands)". 1919]

14.11.11

Objectos embrulhados

O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem


João Guimarães Rosa
in Grande Sertão: Veredas, 1956


Luís de Campos
OBJECTOS EMBRULHADOS, 1982-2008
[Brometo de Prata sobre papel, 70x70cm (cada elemento), 8 elementos]

ONE-KILLER and thirty five good people

Qual deles?________________________​_________________
ONE-KILLER and thirty five good people. Luís Campos, 1998.
[Brometo de Prata sobre papel 36x29 cm (cada elemento). 36 elementos]

13.11.11

The look of love

"Swan Like Embrace" de Nan Goldin, seguido de "Paolo and Francesca in hell" de Ary Scheffer

A Pele Que Há em Mim


JP Simões foi convidado para entrar no universo de "A Pele que há em mim".
Este tema faz parte da nova edição de , com lançamento em Dezembro de 2011

4.11.11

Cantigas Medievais Galego-Portuguesas


Boa nova! Foi criado este novo site onde poderão ler 1700 cantigas medievais galego-portuguesas, ver os respectivos manuscritos, ouvir mais de 300 versões musicais das mesmas, de compositores e intérpretes tão heterogéneos como Lopes Graça, Frederico de Freitas, José Mário Branco, D. Dinis, Amália, etc.. O trabalho científico foi da Profª. Graça Videira Lopes. Responsável pela área musical: Manuel Pedro Ferreira. Programação do site: Pedro Diniz Sousa.

Estado de Excepção como regra


No passado, os estados de excepção (estado de sítio, estado de emergência) eram resultado de golpes militares, guerras ou catástrofes naturais. Hoje, é a economia que obriga ao estado de excepção (que é também a suspensão do contrato social que é o múnus da democracia). A ler: "Estado de Excepção" de Giorgio Agamben.

{Sigam o link do título para uma aproximação ao pensamento de Agambem}

ler

19.10.11

À escuta #112


S. - O período menstrual dura quanto tempo?
- Uns dias...
S. - Mas quantos dias no máximo?
- No máximo uma semana!
S. - Uff que alívio!
- ?
S. - Pensei que era quase um mês...
- Então se aparece de 28 em 28 dias!
S. - Sim, mas pensei que era 28 dias com o período e depois de 28 dias, novamente 28 dias com o período. Era demais!

16.10.11

BLESSED



The American choreographer and dancer Meg Stuart and the Portuguese choreographer and dancer Francisco Camacho met in New York in 89. He followed her to Belgium to dance in her debut work Disfigure Study. After that each went their own way but now theyre collaborating once more. Meg Stuart has choreographed BLESSED, a new piece with Francisco Camacho in a sound design by Hahn Rowe.

In a corner of the world a man has created his own little paradise. How fragile are our mental constructions? How much illusion do we need to survive? Is mankind capable not to believe? Or is it the luxury of the privileged to escape in pipedreams? Is hope a matter of circumstances?


____e mais próximo, Francisco Camacho neste continente.