31.3.06

Não sei se já sabes...

S: ...é o Jesus que escolhe se nasce uma menina ou um menino, e se fala brasileiro...
S: As nuvens no céu estão tão juntas! Elas são fofinhas?
- São, lembras-te de as atravessar de avião?
S: Onde é que vivem os mortos que nunca os vejo?
- Há o corpo e o espírito. O corpo fica na terra...
S: ... naquelas casinhas...
- Sim, no cemitério. E depois talvez haja um espírito que nunca morre...
S: Como é o espírito?
- Unh, é difícil explicar...
S: Não me interessa, não gosto de morrer. Oh, por que é que sou uma pessoa? Preferia ser um carro! Não, uma casa! O que é que dura mais?

O Escritor Famoso V Edição - dia 4

Nenhuma ocorrência ao quarto dia, para além do gesto infeliz de um anónimo frustado que usou a password livre d' O Escritor Famoso para editar um texto pouco original. O texto até perdoávamos, o anonimato é que não. É a primeira vez que isso acontece (desde Julho de 2005) mas se alguém repetir a graça, alteramos o sistema de acesso ao blog.

Mas o mais importante é avisar quem não esteve cá que deve ler este post... porque falta sempre uma cena à nossa maneira em todos os filmes! ;)

30.3.06

Casanova


Quando olhei para o cartaz, convenci-me que o meu Casanova seria o Russel Crowe. Afinal era Heather Ledger, o cowboy gay do filme mais polémico do ano. Como todas as vítimas do Casanova, bem, aceitei esse pequeno transtorno. Que importância poderia ter uma troca de identidade! E o Ledger tem piada e uma voz ..., unh, ...de cowboy, máscula! :))

O filme é delicioso, como Chocolat, lembram-se? Mas, neste filme, Lasse Hallström fusiona assumidamente vários estilos, da aventura à commedia dell'arte. É brilhantemente assistido por Oliver Stapleton na fotografia. Na verdade, é a qualidade da imagem (no trailer poderão já ficar com uma ideia) e de todas as participações (podemos matar saudades de Jeremy Irons, Lana Olin, Oliver Platt, admirar Sienna Miller) que tornam este filme uma boa diversão.
Ah, este Casanova é tão juvenil, amoroso e afinal! bem comportado que, nesta ida ao cinema, podem levar toda a família!

O Escritor Famoso V Edição - dia 3

Ao blog d'O Escritor Famoso chegaram mais dois Actos de Cinema. Até dia 9 de Abril, o Concurso continua!

Entretanto, nos bastidores, apura-se a composição definitiva do júri e transpira-se para a obtenção de um prémio original e muuuuuuuito estimulante. Num dos próximos diários de bordo, divulgarei todas as novidades. Por agora, fiquem só a saber que o escritor Paulo José Miranda fará parte do grupo que terá o prazer de apreciar os vossos textos... e isso deixa-me muito feliz!

Não se esqueçam de ler:

3. Pirata Vermelho, sem título

O cheiro de terra molhada e escura, envolta em neblina quente, acentuava a expressão divina. O sangue borbulhava-lhe na garganta, aberta à frente, marcando o tom grave e arrastado do que dizia e matando-o devagar, num misto de sufoco e pasmo.
De repente pôs-se de pé e fazendo cessar o engasgo que lhe misturava as palavras, interrompeu o que restava de Conrad, olhou em transparência o soldado-carrasco e exclamou ‘You are a hero, boy!’ (contin.)

4. J.P., sem título

Olhos esbugalhados, o peito arquejante, as mãos crispadas. E ora corria, ora caminhava, fixa naquele ponto preto adivinhado de longe. A água gelada fustigou-lhe a alma, e nem sentiu. A saia levantada sobre o corpete, os colotes ensopados em sal e areia, e aquela vontade férrea de prosseguir na recusa da perca daquele bocado de passado.(contin)


Nota: o Wilson T do Escrita Solta deixou lá um desabafo. As palavras dançando harmoniosamente ao som da vida. Escrever é um desespero da alma?

29.3.06

À escuta #23

É a arte que deriva da vida, e não o contrário. Como não sei qual é o sentido da vida, também não sei qual é o sentido da minha arte.

Os artistas não criam nada, eles apenas recriam o que já foi criado pela vida.

O silêncio existe entre dois barulhos ou duas vozes. Só com o silêncio não sobrevivíamos. O silêncio mais profundo é o da morte. O silêncio da morte é também o mais enigmático, o mais curioso, o que desperta mais curiosidade. (...) O espírito sobrevive depois da morte, mas garantia disso não posso apresentar, por agora.

A morte já nos ultrapassa, porque é do lado de lá. Antes disso está-se moribundo, e esse é um estado interessante. Espera-se pelo sono.

A vida propriamente não existe, a vida é teatro. A vida é um conjunto de convenções e o teatro não faz a vida, mas representa as mesmas convenções da vida. Por isso não se pode filmar sem actores. Porque a arte representa a vida, a condição humana.

Não, a minha vida não é um filme. Ela foi apenas feita de filmes.

Uma coisa é certa, com os planos longos não pretendo chatear o público. Porque coloco planos longos? Não sei bem, mas gostava que esse tempo servisse para qualquer coisa.

As vitórias são enganadoras. (...) O artista não tem glória.

Manoel de Oliveira
Dia 27 de Março 2006
Programa Prós e Contras, RTP1

O Escritor Famoso V Edição - dia 2

Começaram a chegar os primeiros Actos de Cinema, respondendo à proposta feita aqui. Até ao dia 9 de Abril, as portas do Escritor Famoso continuam abertas à vossa imaginação!


1. Ivar Corceiro, a morte de olhos abertos

Um corpo nu entardece na ponta nervosa de um cigarro. Linda mastiga sorrisos e depois diz-me que posso dormir com ela. Dormir mesmo, insiste, que sou o último desta noite, a não ser que apareça um taxista em fim de turno, e encosta-se para trás sobre o sórdido divã. Os seios abatem em godé e servem de cinzeiro a algumas cinzas esvoaçantes. (contin.)


2. Fatyly, sem título

De mãos crispadas no volante da sua Harley, olhar fixo na estrada seguia sem sentir a chuva que caía copiosamente. Na mente bailava aquele corpo que tão bem conhecia e que percorreu vezes sem fim! Um breve trejeito com o cruzar de outros faróis, transformou-se num sorriso ao lembrar-se da sua voz, das suas mãos, da sua boca. (contin.)


Entretanto, ao estilo de programação paralela, a Hipátia inaugurou um outro Ciclo Temático, a que chamaremos Grandes Homenagens.


I. Hipátia, The Tramp

Um bigode pequenino, um casaco apertado, umas calças largas, uns sapatos enormes, uma cartola estafada. Um olhar cândido e um sorriso. Um corpo franzino. Ai está: the tramp. (contin.)

28.3.06

V Edição do concurso O Escritor Famoso - Actos de Cinema


L'image-mouvement e L'image-temps em particular - ajudaram-me a perceber alguma coisa dos actos de cinema: do que vou fazer ao cinema e do que o cinema faz. Em que consistem estes actos? Consistem, digamo-lo com Deleuze, em "cortes que adquirem valor absouluto". Vou lá fazer cortes e o cinema faz cortes, ele que é feito de cortes. Que cortes são esses? São "blocos" ou "cristais" de tempo, quer dizer, de pensamento e de vida, a cujos actos podemos chamar: enquadrar, interiorizar, exteriorizar, simultaneizar, intensificar, (...). Mas é evidente que cada qual vive como pode: por isso, nem as imagens são (feitas) da mesma maneira nem se vivem da mesma maneira.

in Actos de Cinema - Crónica De Um Espectador,
Edmundo Cordeiro


As imagens de cinema têm esse poder extraordinário de criar sensações-pensamentos. Elas são sensações-pensamentos! Louco, o Escritor Famoso sugeriu-me que vos desafiasse a imaginar um acto de cinema... sem câmara. Diz-me que, de qualquer forma, os cineastas só se servem da câmara para a "suprimir".

Eu sei que é impossível escrever imagens sonoras. Mas peguem na vossa experiência mágica de ser espectador de cinema, e ofereçam-lhe o vosso acto de cinema possível. Sem audio-visual, como criar actos de cinema? Pensando imagem, amando imagem, esperando imagem, dirigindo os olhos.
Seleccionem o filme da vossa vida e acrescentem-lhe um novo acto. Envolvam-se com aqueles heróis de cinema que ousaram piscar-vos o olho. Façam-nos sair da tela, qual Cecilia na Rosa Púrpura do Cairo, para voltarem a lá entrar diferentes, ou mergulhem vocês no universo deles e deixem que eles vos transformem em radiação.
Imaginem realidades e imagens e fusionem-nas. Criem sentidos. Inventem diálogos.

Mas não esqueçam que se trata de um acto de cinema. A câmara fixa a personagem, de frente, de lado, de um ângulo de cerca de 45°, ou de costas. O olhar da câmara em relação com o olhar da personagem. Qual destes olhares será mais nítido? (a personagem pode sempre tentar furtar-se a que a expiem e captem)

Sintam-se livres. Experimentem. Criem (ou, pensando nas palavras de Manoel de Oliveira, recriem) o vosso Acto de Cinema de Autor.


O regulamento completo do Concurso será publicado brevemente. O Prazo para entrega dos textos-scripts termina a 9 de Abril (24h00). Os textos não poderão ter mais que 30 linhas (Fonte: Trebuchet, tamanho 12/normal).

Todos poderão participar (bloggers, não bloggers), podendo cada autor enviar 3 textos. Os bloggers que têm mais que um blogue, poderão usar diferentes nick names, mas agradecemos que respeitem o número limite de textos por autor.

Todos os concorrentes devem editar o seu próprio texto no blog O Escritor Famoso. A organização do Concurso será responsável pela uniformização da edição (e terá todo o prazer em esclarecer e apoiar aqueles que sintam alguma dificuldade). O login e palavra-passe são os mesmos: efamoso.

Nota extra: A organização ainda anda a pensar no prémio para o/s vencedor/es :))

Amigos, deslumbrem-nos!



Adenda: A organização deste concurso, considerando a petição que ilustríssimos amigos do Escritor Famoso subscreveram, aumenta para 60 o número máximo de linhas por texto.

27.3.06

E se fosse assim, simples como isto?

(Uma reflexão que passa da caixa de comentários para o altar dos posts)

Ando também com um pensar leviano.
De viagens ao mundo sem fim. Pela evasão simplista ou em procura do outro, mais fácil, que há em mim. Aparências que invariavelmente me repõem num lugar atípico de cidadão especulativo e apoquentado. Também apoucado; pelo desenrolar de impunidades a que nos sujeita a pública inversão dos papéis.
A governanta não era aquela senhora cheia de responsabilidade e muito consciente da sua missão e do seu lugar lá em casa? Era! Era escolhida para governar e governava. Nela se depositava grande confiança e dela se tinha, em contrapartida, o apreço merecido. Tornava-se frequentemente uma amiga, como se fosse da família.
Referências pouco um tanto provincianas e distanciadas...

Por cá, o desfile de modelos eróticos é mais feérico e deslumbrante. Dos propriamente ditos, na publicidade e na moda, aos galantes governantes, que parece terem esquecido a quem deveriam mostrar serviço competente. Acham-se porém com ‘cargos de chefia’; dignos de escolta...
Os governantes são o modelo picaresco da sua própria deturpação e de uma política, consolidada, oportunista e invertida, que se queria industriosa nos intuitos, equitativa nos preceitos e corajosa nos momentos. Nunca se tornam amigos! Nem de si próprios; atormentados por inúmeras tropelias arrivistas, pela sombra de impotências várias e auto-apunhalados nas costas, num acto de contorcionismo grotesco.
Ou seremos nós, senhorios, que não sabemos designar e vigiar a tarefa de quem escolhemos para governar a casa? De facto, deste lado, nem um vislumbre de consciência do abuso de confiança ou da usurpação de lugares; nem um resquício de reflexão e de inventividade. Tudo terra-a-terra, na alegria sintética e triunfalista de uma pequenez compulsivamente disfarçada de abundância!
E com que sacrifícios!... De gerir a vidinha suburbana, a ida semanal ao cinema, a mensalidade a pagar, a imagem a manter, o ginásio, o supermercado, o carro novo, a fatiota, a mota d’água! Como se por aí passassem as condições da salubridade mental...

Em resultado da implantação massiva de uma atitude íntima acrítica, não se discute hoje a consistência do modelo – nem a sua aplicação imediata – não se discute a estética da atitude pública – nem a sua função intrínseca – e não se discute a fachada das arquitecturas – nem a sua radiante mediocridade. Não se discute nada! Por falta de tempo. E de alento.
Nestas condições, a genérica imitação de modelos epistemológicos importados apressadamente só o pode ser ‘por baixo’. Tanto porque, sendo produzidos por delegação e em grande quantidade, são mais baratos, como porque, sendo de discurso imobilizado e repetitivo, são mais viáveis e frequentes.

O Clube Grand Avenue, os que o enformam, encabeçados por políticos, manequins, futeboleiros, polichinelos de ventríloquo e outras estrelas de ocasião, perpetua assim o seu encanto na vacuidade folclórica, lasciva e violenta dos variados figurinos que nos impinge, indiscutivelmente aceites como suporte de um estado-feira-popular.

Pirata Vermelho

Começa amanhã
a V Edição do Concurso
O Escritor Famoso