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7.3.07

Crónico e bons malandros #2

Quando se fala em deliquência juvenil, negligencia-se normalmente o factor relacional/societal.

Primeira observação: a turma, ou um grupo de professores numa escola, o bando na rua, a equipa ministerial, cada família, todos projectam um sistema de valores e normas. Naturalmente,
os sistemas de valores podem divergir. Mas entre a turma e os professores, (ou entre os professores e a equipa ministerial), por exemplo, essa divergência parece ter-se acentuado. Por outras palavras, pensamos como grupo (etário, profissional, ocupacional, partidário, formal ou informal, etc.), de maneiras diferentes e cada vez mais incompatíveis.

Segunda observação: todos tendemos a nos inscrever na norma dominante do grupo a que pertencemos ou a que queremos pertencer. Tendemos a. mas há outra opção. A verdade é que escolhemos sempre entre: seguir a norma, fundindo-nos na massa; e ousar ser singular, sabendo que nos arriscamos, por vezes, à exclusão pela "comunidade". Este princípio societal também não é novo, mas as formas e a intensidade que o fenómeno vem assumindo nas últimas décadas são-no.
Desafiar sistematicamente a autoridade dos professores, perturbar a ordem pública, dar pontapés a caixotes de lixo, etc., é afirmar uma diferença face à normalidade (dos outros) e aspirar à integração (ou mesmo liderança) num grupo em que a rebeldia é valorizada e dá estatuto. Os outros jovens são tentados a pactuar por temerem a exclusão (e as represálias que daí possam advir).

Educadores, e professores em particular, queixam-se da atitude cada vez mais toda poderosa dos jovens. Dito de outra maneira: a lei dos mais jovens impõe-se e já prevalece (em algumas escolas, famílias, bairros). Os conflitos multiplicam-se e intensificam-se. E é um facto que, em muitos casos, parece haver uma completa impunidade. Nas escolas, os processos disciplinares banalizam-se, as sanções à violação dos limites perdem eficácia. Como consequência temos a diminuição da qualidade do ensino (para todos) e a desmotivação dos professores (e restantes alunos).

Voltemos ao chavão do "pobres e excluidos que vivem numa sociedade violenta". A verdade é que, observando os jovens (em focus group para estudos de mercado) (e quem lida diariamente com estas faixas etárias, confirmará), percebemos que os seus desejos de roupas de marca e de telemóveis de última geração são satisfeitos, independentemente da sua perfomance escolar e social. Nas famílias mais desfavorecidas do ponto de vista económico, a boa intenção de dar aos filhos o mesmo que os outros têm, faz esquecer prioridades e ajuda a generalizar o fenómeno. A culpa é de quem? Da sociedade, dos ambientes escolares, da televisão, da publicidade?

Quando uma criança ou um jovem desrespeita ou assume um comportamento claramente destrutivo face a terceiros (ou face a si próprio), os pais não intervêm porquê? Porque não estão presentes, em alguns casos. Mas sobretudo, por cansaço, negligência, desinteresse, medo. E assim perdem a possibilidade de se posicionar como adultos estruturantes. "Fazer a sociedade" também é isso. Só depois podemos acrescentar o papel dos media, a pressão para o consumismo, a inadaptação das escolas,... e tantas outras coisas gerais ou particulares.

A verdade é que a responsabilidade é tão partilhada que acaba diluída.


[Continua]

5.3.07

Crónico e bons malandros #1

Para justificar a deliquência juvenil utilizam-se muitas vezes argumentos-chavão. Diz-se que a sociedade é violenta e que os jovens se limitam a reproduzir o modelo dominante ou que as políticas de educação são ineficazes. Às vezes elege-se a pobreza como factor determinante, outras vezes o mal está nos audiovisuais, nomeadamente a televisão. Todos estes argumentos são, evidentemente, redutores.

Em primeiro lugar, a violência não é apanágio dos pobres, e muito menos uma fatalidade a que estejam condenados. Não se é marginal (ou se está na franja da marginalidade) por se ser pobre. É verdade que existirá sempre exclusão social ou cultural. Esta é uma característica inerente a todas as sociedades humanas. Mas as causas da exclusão podem ser de outra ordem, e pergunto-me se as dificuldades vividas por professores ou se cenas como a que presenciei na rua, para não falar em delitos mais graves, não se devem sobretudo a factores: psicológicos, afectivos e relacionais (dificuldade para aceitar ideias e/ou comportamentos diferentes; a homofobia é um exemplo).

Veja-se o caso de T., o colega de turma de uma das minhas filhas, que tem apenas 7 anos e já tem um curriculum de mau comportamento nada desprezível. Frequenta a escola com assiduidade, mas na sala de aulas é incapaz de cumprir regras básicas de disciplina. Não adianta pedir para se calar, para não abanar a carteira, para não interromper. Diz palavrões, chama parva à professora, põe-lhe a língua de fora. Não consegue terminar os trabalhos escolares. Nos intervalos agride os colegas. Todos os dias põe um chorar, a semana passada uma das vítimas foi parar ao hospital: partiu-lhe um dedo. Os pais acham que deve ser a professora a discipliná-lo. Pois!

Eu e outras mães já tentámos falar com o T.. Foge, ou levanta a mão em forma de ameaça. Ele é amoroso, gordinho, com óculos redondos, mas é difícil cativar um simples olhar. Não sei como reagiram os pais da criança que anda com a mão engessada. Não sei como reagiria. Certamente não contra o T.. Mas, sendo óbvio que existe um distúrbio comportamental, como fazer para que ele tenha o acompanhamento que necessita? Na escola não existem psicólogos. Como abordar os pais?

Espero que o T. cresça e que este desiquilíbrio se revele passageiro, mas quando estes casos terminam em deliquência juvenil, de quem é a culpa?

[Continua]

2.3.07

Crónica de bons malandros

A descer a rua um bando de universitários barulhentos, rapazes e raparigas, alguns bêbados, outros ainda de copo na mão. Tudo bem. Até que meia dúzia começa a socar caixotes de lixo, a atirar para o chão os cestos suspensos em postes, o lixo espalha-se. Ninguém no grupo tenta deter os companheiros, fazem que não é nada com eles ou riem-se imenso. São uma cambada de putos que se armam em durões, uma trupe de parvalhões que se dedica ao vandalismo fraco. E digo-lhes isso. O amigo que me acompanha, septuagenário, pergunta-lhes se não aprendem nada de mais útil na universidade. Ousámos o confronto porque são mansos, é claro. E pergunto-me por onde anda a polícia. Já a entrar em casa, surpresa! Aí vêm eles novamente, acompanhados por dois polícias que os obrigam a repôr os cestos nos suportes. O lixo, esse, continua espalhado. Era pedir muito que o apanhassem do chão. E fico a pensar no F.. Mas ele acha que a Universidade tem cadeiras de civismo? Na escola das minhas filhas, de ensino básico, já há crianças famosas por insubordinação e violência, e não há maneira de os professores conseguirem impôr-lhes respeito. Uma das minhas filhas contou-me que quando um dos desses miúdos, o T., que tem 7 anos, é repreendido pela professora, abana os ombros. Ele quer lá saber! Exactamente a mesma reacção dos gandulos universitários. Querem lá saber! A não ser que apareça a polícia. Mas estes eram mansos...