É um dos mais belos poemas de Eugénio de Andrade tendo a cidade do Porto como cenário. Canta assim:
UM RIO TE ESPERA
Estás só, e é de noite
na cidade aberta ao vento leste.
Há muita coisa que não sabes
e é já tarde para perguntares.
Mas tu já tens palavras que te bastem,
as últimas,
pálidas, pesadas, ó abandonado.
Estás só
e ao teu encontro vem
a grande ponte sobre o rio.
Olhas a água onde passaram barcos,
escura, densa, rumorosa
de lírios ou pássaros nocturnos.
Por um momento esqueces
a cidade e o seu comércio de fantasmas,
a multidão atarefada em construir
pequenos ataúdes para o desejo,
a cidade onde cães devoram,
com extrema piedade,
crianças cintilantes
e despidas.
Olhas o rio
como se fora o leito
da tua infância:
lembras-te da madressilva
no muro do quintal,
dos medronhos que colhias
e deitavas fora,
dos amigos a quem mandavas
palavras inocentes
que regressavam a sangrar,
lembras-te de tua mãe
que te esperava
com os olhos molhados de alegria.
Olhas a água, a ponte,
os candeeiros,
e outra vez a água;
a água;
água ou bosque,
sombra pura
nos grandes dias de verão.
Estás só.
Desolado e só.
E é de noite.
Eugénio de Andrade
in Antologia Breve, Edit. Limiar, 5ª. Edição, 1985
UM RIO TE ESPERA
Estás só, e é de noite
na cidade aberta ao vento leste.
Há muita coisa que não sabes
e é já tarde para perguntares.
Mas tu já tens palavras que te bastem,
as últimas,
pálidas, pesadas, ó abandonado.
Estás só
e ao teu encontro vem
a grande ponte sobre o rio.
Olhas a água onde passaram barcos,
escura, densa, rumorosa
de lírios ou pássaros nocturnos.
Por um momento esqueces
a cidade e o seu comércio de fantasmas,
a multidão atarefada em construir
pequenos ataúdes para o desejo,
a cidade onde cães devoram,
com extrema piedade,
crianças cintilantes
e despidas.
Olhas o rio
como se fora o leito
da tua infância:
lembras-te da madressilva
no muro do quintal,
dos medronhos que colhias
e deitavas fora,
dos amigos a quem mandavas
palavras inocentes
que regressavam a sangrar,
lembras-te de tua mãe
que te esperava
com os olhos molhados de alegria.
Olhas a água, a ponte,
os candeeiros,
e outra vez a água;
a água;
água ou bosque,
sombra pura
nos grandes dias de verão.
Estás só.
Desolado e só.
E é de noite.
Eugénio de Andrade
in Antologia Breve, Edit. Limiar, 5ª. Edição, 1985
6 comentários:
Do Porto, para ti, um beijo-surpresa :)
Não tenho a certeza. Mas acho que voltei...
Por aqui, algo mudou, mas continua tudo muitooooooooooooo
interessante!
Olá Rosário.
Adoro a poesia de Eugénio de Castro...adoro a musicalidade que põe nos seus poemas...
Do Porto, não gosto muito...acho-o muito escuro...triste...melancólico.
No entanto o que mais me dói, é ver a sua degradação...o nosso património a ruir...é pena!
Quanto ao slide é muito simples.Consegui fazê-los, sem ajuda e olha,Rosário, que já estou entradota...quase sexagenária.
É mais fácil para vocês, jovens.
No site www.slide.com está tudo bem explicadinho. Vai lá que é fácil.É só seguir os passos.
Já me alonguei.
Bjs.
Elisa (prima afastada)
Marta! Eu já sabia que havia por aí muita vida, mas gostei mesmo muito de te rever! Aguenta-te sff, e leva um beijo enorme de volta :)
Elisa,
Vou explorar esse www.slide.com ! Obrigada!
Eu gosto de retalhos do Porto, por não haver igual e pelas memórias que tenho desses espaços. Mas é verdade, o Porto oprime um pouco: as ruas estreitas, as casas com cores fortes, muitas ruínas, e uma certa neblina quase londrina....
Mas tudo é uma questão de olhar e de afectos que não se explicam: olha o Eugénio de Andrade, transforma o melancólico em belo...
Beijos, prima ;)
belíssimo poema!
adorei este blog ;)
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