OBRA: LOUCURA, MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO, 1910
Ed: Ulmeiro, Lisboa, 1994
Tema: «PRÁTICAS LUXURIOSAS»
A estátua que Raul actualmente cinzelava, era Marcela. (...) sem pensar na pedra – pensava agora só na sua carne; mármore ardente, palpitante... Imaginava, ensinava-lhe requintes de volúpia. Ela, de bom grado se prestava a todas as suas fantasias. (...)
era em plena luz, em estofos caros e moles, nos divãs do atelier, donde, na fúria do amplexo, rolavam para o chão – abraçados, confundidos... (...) A carne nua mostrava-se do delgado tecido; os seios erectos oscilavam com as suas pontas rosadas a enfolarem o pano... Ah! Como ele gostava de morder esses seios! Beijava-os, mordia-os tão sôfregamente, que uma vez o sangue correra...
p. 33
Adorava os seus pés de deusa; metia-os na boca, roía-os. Beijava-lhe as pernas nervosas e brancas, enlaçava-as nas suas.
Dizia-lhe: «És tão linda! A tua pele, meu amor, cobre toda a tua carne; distendida, sem uma prega... parece querer estoirar...»
p. 34
O casto doutrora, transformara-se num quase debochado, num vicioso que se deixava esvair nas ondas espasmódicas dos sentidos satisfeitos, que feria, mordia como uma besta-fera a carne que saciava a sua fúria!...
p. 36
A sua carne palpitou e – só com a carne – amou a estonteante atrizita. Numa embriaguez dos sentidos, possuiu-a nos mesmos divãs desse atelier, onde costumava estreitar o corpo de Marcela. Horrorizado com o «sacrilégio», determinara não o repetir, mas... O eterno mas: a carne é fraca...
p. 59
Dizia-lhe a Luisa:
- Eu quero que tu me ames como eu te amo... Com todo o teu corpo; com as mãos... com os braços... com a boca... E deste modo se amavam na realidade... Com a boca principalmente...
p. 59
Durante a execução de Afrodite, depois de uma hora de trabalho, seguiam-se duas de amor se amor se pode chamar à prática luxuriosa dos vícios mais requintados. (...)
Afrodite é uma obra do autor do Álcool, o que equivale a dizer: uma obra-prima. Contudo, entre todas as outras, talvez a menos notável. É uma estátua vigorosa, clássica, impecável; por isso exactamente, o génio não se manifesta nela com a mesma pujança.
p. 59
De súbito, o meu amigo abandonou de novo a arte. Percebi que fora para se entregar exclusivamente ao mármore divino do corpo de Marcela. (...) Encontrei o Raul sorumbático (...) sua mulher exuberava ventura.
p. 63
Ed: Ulmeiro, Lisboa, 1994
Tema: «PRÁTICAS LUXURIOSAS»
A estátua que Raul actualmente cinzelava, era Marcela. (...) sem pensar na pedra – pensava agora só na sua carne; mármore ardente, palpitante... Imaginava, ensinava-lhe requintes de volúpia. Ela, de bom grado se prestava a todas as suas fantasias. (...)
era em plena luz, em estofos caros e moles, nos divãs do atelier, donde, na fúria do amplexo, rolavam para o chão – abraçados, confundidos... (...) A carne nua mostrava-se do delgado tecido; os seios erectos oscilavam com as suas pontas rosadas a enfolarem o pano... Ah! Como ele gostava de morder esses seios! Beijava-os, mordia-os tão sôfregamente, que uma vez o sangue correra...
p. 33
Adorava os seus pés de deusa; metia-os na boca, roía-os. Beijava-lhe as pernas nervosas e brancas, enlaçava-as nas suas.
Dizia-lhe: «És tão linda! A tua pele, meu amor, cobre toda a tua carne; distendida, sem uma prega... parece querer estoirar...»
p. 34
O casto doutrora, transformara-se num quase debochado, num vicioso que se deixava esvair nas ondas espasmódicas dos sentidos satisfeitos, que feria, mordia como uma besta-fera a carne que saciava a sua fúria!...
p. 36
A sua carne palpitou e – só com a carne – amou a estonteante atrizita. Numa embriaguez dos sentidos, possuiu-a nos mesmos divãs desse atelier, onde costumava estreitar o corpo de Marcela. Horrorizado com o «sacrilégio», determinara não o repetir, mas... O eterno mas: a carne é fraca...
p. 59
Dizia-lhe a Luisa:
- Eu quero que tu me ames como eu te amo... Com todo o teu corpo; com as mãos... com os braços... com a boca... E deste modo se amavam na realidade... Com a boca principalmente...
p. 59
Durante a execução de Afrodite, depois de uma hora de trabalho, seguiam-se duas de amor se amor se pode chamar à prática luxuriosa dos vícios mais requintados. (...)
Afrodite é uma obra do autor do Álcool, o que equivale a dizer: uma obra-prima. Contudo, entre todas as outras, talvez a menos notável. É uma estátua vigorosa, clássica, impecável; por isso exactamente, o génio não se manifesta nela com a mesma pujança.
p. 59
De súbito, o meu amigo abandonou de novo a arte. Percebi que fora para se entregar exclusivamente ao mármore divino do corpo de Marcela. (...) Encontrei o Raul sorumbático (...) sua mulher exuberava ventura.
p. 63
[Imagem: Lucien Freud, Naked Portrait with Reflection]
1 comentário:
Cocluída a obra, quebrou-a: "Não conseguiria - disse - reproduzir em mármore o mármore do seu corpo..." Pág 32
Gostei muita desta "Loucura"
:)
Enviar um comentário