6.10.07

Boris Vian, Le Déserteur


Le Déserteur é uma das canções mais célebres contra a guerra. Uma canção antimilitarista mas não "pacifista": os versos finais originais cantavam «Prévenez vos gendarmes, que je serai en arme et que je sais tirer». A canção nasce num contexto particular em França: a guerra da Indochina tinha terminado há pouco tempo e a guerra da Algéria começava.
O manuscrito da canção data de 15 de Fevereiro de 1954. Marcel Mouloudji foi o seu primeiro intérprete - numa emissão da Europe 1 (rádio) a 4 de Março de 1954 (com o último verso já modificado e com as referências ao «Président» substituídas por vagos "Messieurs»). Foi um escândalo.

Em Janeiro de 1955, Paul Faber, conselheiro municipal da cidade de Paris, reclama a censura da canção e consegue que Le Déserteur não volte a ser transmitido na Rádio. Boris Vian reage com ironia: declara que a sua canção é "nullement antimilitariste, mais, je le reconnais, violemment pro-civile". Envia uma
carta aberta a Paul Faber em que, entre outras coisas, reflecte sobre a expressão "Ancien combattant". Ainda hoje, este estatuto tem um peso considerável na sociedade francesa (o meu sogro, um "ancien combattant" obrigado a participar na guerra da Argélia, recebe, como tantos outros, bombons do Maire de Paris pelo Natal !). Segundo Boris Vian, os antigos combatentes não deveriam vangloriar-se de ter feito a guerra, mas antes lamentar a sua participação - "un ancien combattant est mieux placé que quiconque pour haïr la guerre". Boris Vian declarou ainda que a maioria dos verdadeiros desertores eram "anciens combattants" que não tiveram força para ir até ao fim do combate. "Et qui leur jettera la pierre ? Non. si ma chanson peut déplaire, ce n'est pas à un ancien combattant, cher monsieur Faber."

Censurada ou boicotada pela Rádio e pelas editoras, Le Déserteur caiu quase no esquecimento; Boris Vian morre em 1959; Marcel Mouloudji é banido da chanson française e condenado a uma espécie de exílio artístico que dura dez anos.

Será apenas em 1966, com a vaga de canções de protestos que se seguiram à revolta na universidade Berkeley contra a guerra no Vietname, que Le Déserteur é redescoberto por Peter, Paul and Mary (com o título The Pacifist), que a cantam em francês com uma curta introdução em inglês. Le Déserteur transforma-se no símbolo do movimento e dá a volta ao mundo.

Desde então, têm sido vários os intérpretes da canção. Serge Reggiani, Joan Baez - apenas para falar dos meus preferidos - cantaram Le Déserteur. Por cá, foi José Mário Branco que a cantou, entre 1966 e 1974, numa versão traduzida para a língua portuguesa.






Monsieur le Président
Je vous fais une lettre
Que vous lirez peut-être
Si vous avez le temps
Je viens de recevoir
Mes papiers militaires
Pour partir à la guerre
Avant mercredi soir
Monsieur le Président
Je ne veux pas la faire
Je ne suis pas sur terre
Pour tuer des pauvres gens
C'est pas pour vous fâcher
Il faut que je vous dise
Ma décision est prise
Je m'en vais déserter

Depuis que je suis né
J'ai vu mourir mon père
J'ai vu partir mes frères
Et pleurer mes enfants
Ma mère a tant souffert
Elle est dedans sa tombe
Et se moque des bombes
Et se moque des vers
Quand j'étais prisonnier
On m'a volé ma femme
On m'a volé mon âme
Et tout mon cher passé
Demain de bon matin
Je fermerai ma porte
Au nez des années mortes
J'irai sur les chemins

Je mendierai ma vie
Sur les routes de France
De Bretagne en Provence
Et je dirai aux gens:
Refusez d'obéir
Refusez de la faire
N'allez pas à la guerre
Refusez de partir
S'il faut donner son sang
Allez donner le vôtre
Vous êtes bon apôtre
Monsieur le Président
Si vous me poursuivez
Prévenez vos gendarmes
Que je n'aurai pas d'armes
Et qu'ils pourront tirer


Letra de Boris Vian - Música de Boris Vian e Harold Berg - 1954

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