Há alguns anos atrás tive um sonho recorrente. Via um homem sentado em frente a um cavalete. Um homem que estava cansado. Olhava fixamente para o que acabara de pintar e a exaustão que sentia misturava-se com a angústia de quem reconhece o inacabado e busca uma particular perfeição. faltava um qualquer rasgo de genialidade e sossego.
Concentro-me na tela. vou percebendo sob várias camadas de tintas e traços o perfil de um homem sentado num banco. de costas. e à sua volta uma mulher que o abraça. dois dorsos sobrepostos num afago.
Observava imóvel o pintor que eu amava. que não dera pela minha presença. Confortá-lo torna-se uma urgência. aproximo-me e, lendo aquela tela como um pedido, envolvo-o.
Desponta então o pesadelo. Descubro que também eu sou pintora. e a vontade de fixar aquele instante começa a dominar-me. Que ângulo seria o melhor? o dos meus braços sobre os seus braços... as coxas fortes semi-abertas suportando o peso dos dois corpos... o rosto quente que eu sentia mas não via... e a questão técnica vai-se sobrepondo aos sentidos. e com ela a ausência na figura presente. e a mentira e a culpa nascem naquele momento de irrepetível intenção amorosa.
Concentro-me na tela. vou percebendo sob várias camadas de tintas e traços o perfil de um homem sentado num banco. de costas. e à sua volta uma mulher que o abraça. dois dorsos sobrepostos num afago.
Observava imóvel o pintor que eu amava. que não dera pela minha presença. Confortá-lo torna-se uma urgência. aproximo-me e, lendo aquela tela como um pedido, envolvo-o.
Desponta então o pesadelo. Descubro que também eu sou pintora. e a vontade de fixar aquele instante começa a dominar-me. Que ângulo seria o melhor? o dos meus braços sobre os seus braços... as coxas fortes semi-abertas suportando o peso dos dois corpos... o rosto quente que eu sentia mas não via... e a questão técnica vai-se sobrepondo aos sentidos. e com ela a ausência na figura presente. e a mentira e a culpa nascem naquele momento de irrepetível intenção amorosa.
Acordava mal disposta. Mas na noite seguinte voltava ao instante do abraço e à obsessão do ângulo que melhor traduziria a beleza original daquele encontro.
Esse sonho esgotou-se mas durante meses continuei a sonhar que era pintora e havia sempre uma qualquer solução que não encontrava. Houve a série "diferentes usos de distintas cómodas", "guernica da bomba atómica na Indonésia", "como pintar o azul do mar sem ter vertigens", etc..
Depois passou.
Hoje agradeço ao meu subconsciente nocturno a criatividade nos scripts, sabendo o quão difícil deve ser encontrar pontes para transferência de recalcamentos. mas ele fê-los belos e poéticos.
E diverte-me que até o meu subconsciente goze com a minha falta de habilidade para desenhar.
Podem agora os homenageados do dia compreender a admiração que me suscitam!
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