27.3.06

E se fosse assim, simples como isto?

(Uma reflexão que passa da caixa de comentários para o altar dos posts)

Ando também com um pensar leviano.
De viagens ao mundo sem fim. Pela evasão simplista ou em procura do outro, mais fácil, que há em mim. Aparências que invariavelmente me repõem num lugar atípico de cidadão especulativo e apoquentado. Também apoucado; pelo desenrolar de impunidades a que nos sujeita a pública inversão dos papéis.
A governanta não era aquela senhora cheia de responsabilidade e muito consciente da sua missão e do seu lugar lá em casa? Era! Era escolhida para governar e governava. Nela se depositava grande confiança e dela se tinha, em contrapartida, o apreço merecido. Tornava-se frequentemente uma amiga, como se fosse da família.
Referências pouco um tanto provincianas e distanciadas...

Por cá, o desfile de modelos eróticos é mais feérico e deslumbrante. Dos propriamente ditos, na publicidade e na moda, aos galantes governantes, que parece terem esquecido a quem deveriam mostrar serviço competente. Acham-se porém com ‘cargos de chefia’; dignos de escolta...
Os governantes são o modelo picaresco da sua própria deturpação e de uma política, consolidada, oportunista e invertida, que se queria industriosa nos intuitos, equitativa nos preceitos e corajosa nos momentos. Nunca se tornam amigos! Nem de si próprios; atormentados por inúmeras tropelias arrivistas, pela sombra de impotências várias e auto-apunhalados nas costas, num acto de contorcionismo grotesco.
Ou seremos nós, senhorios, que não sabemos designar e vigiar a tarefa de quem escolhemos para governar a casa? De facto, deste lado, nem um vislumbre de consciência do abuso de confiança ou da usurpação de lugares; nem um resquício de reflexão e de inventividade. Tudo terra-a-terra, na alegria sintética e triunfalista de uma pequenez compulsivamente disfarçada de abundância!
E com que sacrifícios!... De gerir a vidinha suburbana, a ida semanal ao cinema, a mensalidade a pagar, a imagem a manter, o ginásio, o supermercado, o carro novo, a fatiota, a mota d’água! Como se por aí passassem as condições da salubridade mental...

Em resultado da implantação massiva de uma atitude íntima acrítica, não se discute hoje a consistência do modelo – nem a sua aplicação imediata – não se discute a estética da atitude pública – nem a sua função intrínseca – e não se discute a fachada das arquitecturas – nem a sua radiante mediocridade. Não se discute nada! Por falta de tempo. E de alento.
Nestas condições, a genérica imitação de modelos epistemológicos importados apressadamente só o pode ser ‘por baixo’. Tanto porque, sendo produzidos por delegação e em grande quantidade, são mais baratos, como porque, sendo de discurso imobilizado e repetitivo, são mais viáveis e frequentes.

O Clube Grand Avenue, os que o enformam, encabeçados por políticos, manequins, futeboleiros, polichinelos de ventríloquo e outras estrelas de ocasião, perpetua assim o seu encanto na vacuidade folclórica, lasciva e violenta dos variados figurinos que nos impinge, indiscutivelmente aceites como suporte de um estado-feira-popular.

Pirata Vermelho

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