As obras de ampliação e requalificação do Museu de Aveiro deram que falar mas nunca se falou o suficiente. No decorrer das obras, face a descobertas de interesse arqueológico, dominou o silêncio. E é este que continua a dominar: onde estão «os vestígios de estruturas antigas»? O Museu reabriu, as obras estão praticamente finalizadas. Parece que todos preferem festejar e não questionar o que se fez com 5.080.669,00 euros, valor estimado da obra (sendo a comparticipação comunitária de metade). O projecto tem a autoria do arquitecto Alcino Soutinho. A fiscalização esteve a cargo da delegação de Coimbra da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Mas, na minha simples opinião, o museu foi alvo de um atentado!
Antes das obras, a entrada do museu, em chão de mosaico antigo, de barro escuro, dividia o espaço branco das paredes por sete painéis de azulejos recortados, da primeira metade de setecentos, ali instalados depois de terem sido retirados da antiga Sé ou Recolhimento de S. Bernardino. ESTE ESPAÇO FOI DESTRUÍDO. OS PAINÉIS ESTÃO EXPOSTOS DE FORMA ALINHADA NUMA DAS NOVAS SALAS DE EXPOSIÇÃO.
As várias salas, organizadas agora segundo os períodos convencionais da história de arte, são frias, não passam de mostruários de arte sacra. AS PEÇAS FORAM DESCONTEXTUALIZADAS. Torna-se mais prático digitalizar o espaço e fazer uma visita virtual!
O Claustro. No centro, o chafariz entre degraus e bancadas revestidas de azulejos de figura azuis e brancos da primeira metade do século XVIII. NÃO FORAM RESTAURADOS.
À volta do claustro, as salas sucedem-se. A maior guardava o túmulo de João Albuquerque e sua mulher D. Helena Pereira, inicialmente feito para ser colocado numa capela da Igreja de Nossa Senhora da Misericórdia (actual Sé), da qual tinha o padroado. A sua vinda para o museu deu-se em 1945. EI-LO, ACTUALMENTE:
O que aconteceu às outras salas, não sabemos. O espaço ainda está vedado ao público. Temo pela «requalificação» das capelas de S. Simão, de S. João Batista, de S. João Evangelista, do Refeitório.
O acesso ao Claustro alto também está vedado. Mas uma mudança sobressai: AS PORTAS AO LONGO DA VARANDA FORAM TRANSFORMADAS EM JANELAS.
Antes das obras de «requalificação», saíamos do coro alto ao encontro dos testemunhos da vida da Beata Joana. Três pequenas divisões, abertas do lado do coração. Mantiveram essas salas. Mas O PAVIMENTO EM MÁRMORE FOI SUBSTITUÍDO POR UM MODERNO SOALHO DE MADEIRA E O SEU NOVO ENQUADRAMENTO DESTRUIU POR COMPLETO O AMBIENTE CONVENTUAL QUE DIFERENCIAVA ESTE MUSEU DE QUALQUER OUTRO. A OPÇÃO FOI A DE DEITAR PAREDES ABAIXO E ERGUER UMA SÉRIE SALAS DE EXPOSIÇÃO. Não há permissão para fotografar as salas (restrição que é cada vez mais exclusiva deste país). Centremo-nos apenas nesta nova entrada para o segundo piso:
Parece-me insano rasgar o espaço do convento com esta ponte de betão e metal. Mas enfim, é apenas a minha opinião.
A mística do museu, os pequenos detalhes, diluiram-se nestas novas linhas de modernidade acéfala. A ruptura com as suas origens é irremediável. A casa mandada erguer por D. Brites Leitão foi fulminada. O convento que D. Afonso V e sua corte lançaram após a bula papal de Pio II em 1461 perdeu a alma. É desesperante o que fizeram ao segundo claustro! O chão foi todo levantado (o que fizeram aos mosaicos antigos?), substituído por pequenos seixos elegantes. O poço passou a estrutura acimentada, bastante grosseira (o que fizeram dos azulejos?). O passeio envolvente está coberto por uma estrutura metálica, tipo marquise!!! É preciso ver e rever para acreditar! Enfim, foi o que me aconteceu, mas devo ter sido a única...
Quanto à Igreja do Convento de Jesus, não foi tocada. Felizmente, a parte mais antiga da construção, quatrocentista, estava fora do projecto!
Não adianta muito, ou nada, expressar esta opinião. Deve ser por isso que ninguém fala, como eu falo, e repito, de atentado a um Monumento Nacional. Autarquias, Secretarias de Estado, continuem no bom caminho! O povo não é quem ordena!
Não adianta muito, ou nada, expressar esta opinião. Deve ser por isso que ninguém fala, como eu falo, e repito, de atentado a um Monumento Nacional. Autarquias, Secretarias de Estado, continuem no bom caminho! O povo não é quem ordena!
É o novo "ruir" do nosso Património Histórico.
ResponderEliminarLamentável!!!
Bjs.
Elisa
O nosso patrimoónio ou está a ruir ou é objecto de projectos faraónicos que esquecem a matriz original dos monumentos e, no caso deste museu, os conceitos mais elementares sobre o que deve ser um espaço museológico com apetência para ser «vivido» pelo público. O importante era realçar as belas peças da colecção do museu estimulando uma relação de «caring» entre o público e aquele espaço único - sendo que este antigo convento nunca poderia ter a configuração do centro de arte moderno da Gulbenkian ou do Centro de Estudos Camilianos de Siza Vieira em Famalicão! As várias salas organizadas agora segundo os períodos convencionais da história de arte são frias. As peças foram descontextualizadas. Torna-se mais prático digitalizar o espaço e fazer uma visita virtual!
ResponderEliminarentão destríram uma obra de interesse histórico, que fazia parte do patrimóinio histórico para construir um mamarracho moderno!!!
ResponderEliminarsanta ignorancia!!!
que sensação de dejá vu a fazer lembrar o desaparecimento do antigo edifício do Palácioe de Cristal no Porto ou o cinema Monumental em Lisboa.
há que ter sensibilidade...
CSD
Cláudia, a fachada manteve-se e não se tocou na Igreja e coro alto... O museu, antigo convento de Jesus, deixou apenas de se parecer com um convento. Agora é um mostruário de arte sacra.
ResponderEliminarCompreendo e apoio a tua indignação.
ResponderEliminarBjs.
Elisa
Tudo se (des)faz neste cantinho monolítico de gente "iluminada". Ainda me vou perguntando porque não pegamos numas armas e pedimos contas a estes cretinos.
ResponderEliminarBeijos, Maria
Spectrum, terrorismo desse não! mas uma revolução é urgente,sim, por tantas razões...
ResponderEliminarNão foste a única não! O post esta excelente! Devo te dizer que me inspiraste para o meu trabalho sobre o museu! Está bem escrito, simples e com o essencial!
ResponderEliminarParabens pelo Post!
Obrigada, anónimo! :)
ResponderEliminarEu que do antigo museu so conheço a igreja (quando o visitei já o museu estava em obras), fico chocado com as fotos que vejo! Paredes brancas, tectos com uma reentrancia triangular mas que nem é luz zenital nem nada que se pareça, é que isso nem mostruário de arte sacra é, são imples paredes brancas com com mesas brancas de péssimo gosto, tudo disfarçado de "comtemporâneo"! por favor, exige-se saber qual o concurso público que fez com que esse projectos de "pseudo arquitectura fosse avante"! é uma vergonha nacional o que se fez. !
ResponderEliminarCaro João Pereira, não houve concurso público. Houve um convite.
ResponderEliminarUm abraço
Rosário Fardilha