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27.8.12

Duermes



Duermes,
mientras la ciudad golpea el cristal con su llanto,
ajena a tu sueño. Qué pena que este milagro
de verte dormida en paz
no desborde el muro de esta habitación.
Ojalá que mañana,
cuando te despiertes,
duerma mi dolor.

Duermes,
y bajo el flexo una estudiante reza la locura
de huir con los muchachos del camión de la basura.
Y, mientras, los bares
entierran la culpa de esta gran ciudad.
Tantas soledades
sin saber que duermes
no pueden amar.

Duermes,
insomne cruzo la casa y te busco intranquilo,
porque sueño a tu lado,
aunque no duerma contigo.
Duermes,
perdona mi maldita costumbre de despertarte
porque tengo miedo,
o porque llego tarde.

Duermes,
y un hombre escribe versos frente a una computadora.
Temblando, en la pantalla, abre la caja de Pandora.
Y en un cuarto de hotel,
busca encendida en el minibar
el rumor de las olas
una pareja que esta
noche no dormirá.

Duermes,
y un hombre llora en un taxi mientras suena la radio.
Una mujer desnuda lo detiene en un semáforo.
Nadie sabe que duermes,
no consta en los diarios.
Qué lástima la gente
que nunca besará la paz
sobre tus párpados.

Duermes,
insomne cruzo la casa y te busco intranquilo,
porque sueño a tu lado,
aunque no duerma contigo.

Duermes,
perdona mi maldita costumbre de despertarte
porque tengo miedo,
o porque llego tarde.

J’avais à peine seize ans et je ne me souvenais déjà plus de ma naissance...

Prose du transsibérien (fragmento)

 En ce temps-là j’étais en mon adolescence
 J’avais à peine seize ans et je ne me souvenais déjà plus de mon enfance
 J’étais à 16.000 lieues du lieu de ma naissance
 J’étais à Moscou, dans la ville des mille et trois clochers et des sept gares
 Et je n’avais pas assez des sept gares et des mille et trois tours
 Car mon adolescence était si ardente et si folle
 Que mon cœur, tour à tour, brûlait comme le temple
 d’Éphèse ou comme la Place Rouge de Moscou
 Quand le soleil se couche.
 Et mes yeux éclairaient des voies anciennes.
 Et j’étais déjà si mauvais poète
 Que je ne savais pas aller jusqu’au bout.

 Le Kremlin était comme un immense gâteau tartare
 Croustillé d’or,
 Avec les grandes amandes des cathédrales toutes blanches
 Et l’or mielleux des cloches…

 Un vieux moine me lisait la légende de Novgorode
 J’avais soif
 Et je déchiffrais des caractères cunéiformes
 Puis, tout à coup, les pigeons du Saint-Esprit s’envolaient sur la place
 Et mes mains s’envolaient aussi, avec des bruissements d’albatros
 Et ceci, c’était les dernières réminiscences du dernier jour
 Du tout dernier voyage
 Et de la mer.

 Pourtant, j’étais fort mauvais poète.
 Je ne savais pas aller jusqu’au bout.
 J’avais faim
 Et tous les jours et toutes les femmes dans les cafés et tous les verres
 J’aurais voulu les boire et les casser
 Et toutes les vitrines et toutes les rues
 Et toutes les maisons et toutes les vies
 Et toutes les roues des fiacres qui tournaient en tourbillon sur les mauvais pavés
 J’aurais voulu les plonger dans une fournaise de glaives
 Et j’aurais voulu broyer tous les os
 Et arracher toutes les langues
 Et liquéfier tous ces grands corps étranges et nus sous les vêtements qui m’affolent…
 Je pressentais la venue du grand Christ rouge de la révolution russe…
 Et le soleil était une mauvaise plaie
 Qui s’ouvrait comme un brasier.

 En ce temps-là j’étais en mon adolescence
 J’avais à peine seize ans et je ne me souvenais déjà plus de ma naissance...

 Blaise Cendrars (1887-1961)

 

26.8.12

O meu amor existe



O meu amor tem lábios de silêncio
e mãos de bailarina
e voa como o vento
e abraça-me onde a solidão termina

O meu amor tem trinta mil cavalos
a galopar no peito
e um sorriso só dela
que nasce quando a seu lado eu me deito

O meu amor ensinou-me a chegar
sedento de ternura
sarou as minhas feridas
e pôs-me a salvo para além da loucura

O meu amor ensinou-me a partir
nalguma noite triste
mas antes, ensinou-me
a não esquecer que o meu amor existe

25.8.12

Jesus Cristo bebia cerveja

«Ao fundo, Antónia e a neta caminham de mãos juntas. Junto à estrada há uma estátua da Virgem, com as mãos postas em oração. Quando tinha três anos, Rosa, ao ver a estátua com as mãos naquela posição, julgava que a Santa batia palmas. Agora, claro, já não pensa assim.»

in Afonso Cruz, "Jesus Cristo bebia cerveja"
Editora Objectiva, 2012

À escuta #121

Mãe: É giro ter nascido no ano 2000!
A.: Sim... Eu gostava de viver 101 anos! É possível! Já viste como seria extraordinário! Eu viveria durante três séculos!

20.8.12

Nada que exista

Tão longe, meu amor, tão longe,
quem de tão longe alguma vez regressa?!
Jorge de Sena


espantou-me encontrar-te assim tão de passagem na tua própria casa
e que houvesse sempre uma pequena luz (talvez benzida) a mantê-la iluminada
não obstante, pensei amar-te (libertar-te) da ponta dos dedos às ideias mais abstractas

a realidade revelou um corpo-defeito desfeito
que eu tocava com nomes pele água panos ternos jeitos
e um silêncio encalhado que me inspirava sonatas e me levava a beijar-te por falta de
palavras

decidi então assim: nunca mais te verei.
vais ser: o rasto dos aviões no céu, idênticos a si mesmos, não singulares.
serei: se quiseres ainda: o mamilo que toca piano. ou seja, nada que exista.

MRF
2005

19.8.12

Lorca





Em «La Casada Infiel», de Lorca (Fuente Vaqueros, 5 de junho de 1898 — Granada, 19 de agosto de 1936), um cigano narra a sua desilusão com a cigana que levara ao rio. Pensava que ela era solteira mas, ao saber que tinha marido, é obrigado a mostrar a sua honra de “cigano legítimo”. A honra é um valor primordial que organiza as relações amorosas e de poder entre ciganos.

Y que yo me la llevé al río
creyendo que era mozuela,
pero tenía marido.
(…)
yo me quité la corbata.
Ella se quitó el vestido.
Yo el cinturón con revólver.
Ella sus cuatro corpiños.
(…)
No quiero decir, por hombre,
las cosas que ella me dijo.
La luz del entendimiento
me hace ser muy comedido.
(…)
Sucia de besos y arena,
yo me la llevé al río.
Con el aire se batían
las espadas de los lirios.

Me porté como quien soy.
Como un gitano legítimo.
La regalé un costurero
grande de raso pajizo,
y no quise enamorarme
porque teniendo marido
me dijo que era mozuela
cuando la llevaba al río.

in Federico García Lorca, "ROMANCERO GITANO" [1924-7]


P:S.: Uma curiosidade relativa à métrica do poema. Todos os versos têm 8 sílabas, com excepção do primeiro, que tem nove.

6.8.12

Chavela Vargas

"Silêncio, silêncio: a partir de hoje, as amarguras voltarão a ser amargas... morreu a grande senhora Chavela Vargas".


Chavela Vargas, "Las simples cosas"


... y a las cosas simples las debora el tiempo.

4.8.12

I Can't Believe You're In Love With Me

Billie Holiday - I Can't Believe You're In Love With Me

Clarence Gaskill / Jimmy McHugh

Atlas, o gigante e a vértebra de Elena Córdoba__na sala b

Espectáculo na Sala b, diz o programa do Citemor. Damos voltas à vila, um sobe desce pequenas ruas, vielas, na direção do castelo e na direção oposta, ali para os lados da biblioteca, ali para os lados da praça das artes, ali ao pé da praça do município. Comes qualquer coisa no único café que está aberto, D. Dinis de seu nome, mas não, ninguém sabe onde fica a Sala b. Surreal. Finalmente, à segunda tentativa, a recepcionista do Hotel Abade João dá a pista certa. Encontrámos a Sala b, uma casa em ruínas, que ardeu há anos, sem tecto, portas, janelas, cheia de lua cheia e de gente.

Começa o universo Elena Córdoba. Um outro espectáculo que não este aqui. Há imagens muito poéticas, a postura da bailarina-performer é singular, bizarra, mas também decadente, acabei por não gostar. Mas talvez vocês apreciem e ela vai lá estar hoje novamente. na Sala b.

E depois, conversa. O público, a equipa da organização, o Citemor, o estado da cultura, a morte anunciada de mais um festival. O Citemor já vai na 34ª edição, têm 25% do orçamento de há 2 anos. O dinheiro não chega para o aluguer de equipamentos, bancadas, geradores, tudo, até porque a vila só tem o pequeno (e belíssimo) Teatro Esther de Carvalho. Utilizar espaços não convencionais é uma opção estética e... bem, não é opção, é o que tem que ser.

Nenhum artista ou membro da organização teve cachet este ano.
No Citemor, artistas e membros da organização pagam para trabalhar.
Há qualquer coisa de muito singular a acontecer por todo o lado, neste país.

Atravessar as várias praças de Montemor, algumas com instalações de arte contemporânea. Há uma, do Teatro O Bando (João Brites e Rui Francisco), na praça do município: um muro de tijolos e filas com cadeiras de cinema (de veludo bordeaux) de ambos os lados. O que está do outro lado do muro? E do outro lado de nós mesmos? Virados para o muro, de costas para o mundo, frente a quê e a quem? "Tire uma fotografia de costas e envie para geral@obando.pt"

Uma vila deserta ocupada por "alternativos". Em poucas horas, conhecer os donos do café, a Eva, filha da namorada do dono de..., e a prima da Eva, o cão rafeiro Romeu, o mendigo da terra, o Sr. Ferreira, o pessoal do bar que abriu esta semana e que vai ficar aberto até o sol aparecer lentamente no céu___ que continua estrelado.

Comer bôla de chouriço e sandes de carne assada ao relento. Embrulhados em xailes, ou não. Regressar cheia de sono e de rostos.

Foi bom.

Estreia de "LA MUJER DE LA LAGRIMA" de Elena Cordoba, com Elena Cordoba y Maria José Pire , no Teatro Esther de Carvalho. Estreia no 32º CITEMOR, Festival de Montemor-o-Velho, 5 de agosto 2010. Video de Hugo Barbosa e Pamela Gallo para o blogue do festival do Citemor.

3.8.12

Il n'y a pas d'amour heureux

Il n'y a pas d'amour heureux

Rien n'est jamais acquis à l'homme Ni sa force
Ni sa faiblesse ni son coeur Et quand il croit
Ouvrir ses bras son ombre est celle d'une croix
Et quand il croit serrer son bonheur il le broie
Sa vie est un étrange et douloureux divorce



Il n'y a pas d'amour heureux


Sa vie Elle ressemble à ces soldats sans armes
Qu'on avait habillés pour un autre destin
A quoi peut leur servir de se lever matin
Eux qu'on retrouve au soir désoeuvrés incertains
Dites ces mots Ma vie Et retenez vos larmes



Il n'y a pas d'amour heureux


Mon bel amour mon cher amour ma déchirure
Je te porte dans moi comme un oiseau blessé
Et ceux-là sans savoir nous regardent passer
Répétant après moi les mots que j'ai tressés
Et qui pour tes grands yeux tout aussitôt moururent



Il n'y a pas d'amour heureux


Le temps d'apprendre à vivre il est déjà trop tard
Que pleurent dans la nuit nos coeurs à l'unisson
Ce qu'il faut de malheur pour la moindre chanson
Ce qu'il faut de regrets pour payer un frisson
Ce qu'il faut de sanglots pour un air de guitare


Il n'y a pas d'amour heureux


Il n'y a pas d'amour qui ne soit à douleur
Il n'y a pas d'amour dont on ne soit meurtri
Il n'y a pas d'amour dont on ne soit flétri
Et pas plus que de toi l'amour de la patrie
Il n'y a pas d'amour qui ne vive de pleurs


Il n'y a pas d'amour heureux
Mais c'est notre amour à tous les deux


Louis Aragon (La Diane Francaise, Seghers 1946)

La chanson de Maglia

La chanson de Maglia

Vous êtes bien belle et je suis bien laid.
A vous la splendeur de rayons baignée ;
A moi la poussière, à moi l'araignée.
Vous êtes bien belle et je suis bien laid ;
Soyez la fenêtre et moi le volet.

Nous réglerons tout dans notre réduit.
Je protégerai ta vitre qui tremble ;
Nous serons heureux, nous serons ensemble ;
Nous réglerons tout dans notre réduit ;
Tu feras le jour, je ferai la nuit.

VICTOR HUGO (1802-1885)
.

1.8.12

And that’s how people burn to death in hotel rooms



After you’ve been to bed together for the first time,
Without the advantage or disadvantage of any prior acquaintance,
The other party very often says to you,
Tell me about yourself, I want to know
What’s your story? And you think maybe they really and truly do
Sincerely want to know your life story, and so you light up
A cigarette and begin to tell it to them, the two of you
Lying together in completely relaxed positions
Like a pair of rag dolls a bored child dropped on a bed.
You tell them your story, or as much of your story
As time or a fair degree of patience allows, and they say, Oh, oh, oh, oh, oh,
Each time a little more faintly, until the oh
Is just an audible breath, and then of course
There’s some interruption. Slow room service comes up
With a bowl of melting ice cubes, or one of you rises to pee
And gaze at himself with mild astonishment in the bathroom mirror
And then, the first thing you know, before you’ve had time
To pick up where you left off with your enthralling life story,
They’re telling you their life story, exactly as they intended all along
And you’re saying, Oh, oh, oh, oh, oh
Each time a little more faintly, the vowel at last becoming
No more than an audible sigh,
As the elevator, halfway down the corridor and a turn to the left,
Draws one last, long, deep breath of exhaustion
And stops breathing forever. Then?
Well, one of you falls asleep
And the other does likewise with a lighted cigarette in his mouth
And that’s how people burn to death in hotel rooms.

in Tennessee Williams, The Winter of Cities, 1956

Imagem: Nan Goldin, Jen's hand on Clemen’s back, Paris, 2001

À escuta #120


A.: Acho que estou apaixonada pelo homem-aranha... Oh, porquê que ele já tem 29 anos?... Sempre que vou ver um filme apaixono-me... Enfim, é só por uns dias...