Experiência III
Dói às vezes partilhar o comum dos gestos
da vida e omitir a sua parte nova e agreste
julgar no dia claro deste Janeiro quente
e seco os passos de viver assim docemente
Crispa a pele seca no corpo o vento em riste
e aceitar o cansaço do ventre a olhar o já visto
receando nós a própria dor do tempo carregado
que dela nos desfazemos amando o corpo amado
mesmo que surja uma palavra a mais ou a menos
naquele gemido que lemos na memória omissa:
que cor têm os cabelos ondeando no beiral
do tempo quando se abrem os braços e se grita?
Paremos, soltemos o nosso passo à desfilada
pensemos, prendamos o braço ao braço que abraçamos
experimentemos ouvir assim as horas na torre
surpreender o esvoaçar da cegonha que observámos
contar com um olhar os pardais no berço da noite
seguir a linha quebrada dos remos fendendo a ria
ou os pontos mortiços das luzes lá no cimo da colina
A respiração sustém-se no momento do passo dado
e já nada nos segue a não ser o nosso próprio riso
eco repetido no chão duro e cego da verdade.
21/1/1981
Eduardo Graça, in Primeiros Poemas
Edição Dezembro 2007
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Eduardo, é assim:
«Nos passos dia-a-dia mais pesados nada transporto
de outros a não ser seus sonhos e meus desejos»
e suas palavras, que tomo minhas por não saber dizer de melhor maneira Obrigada.
Tardou mas chegou ... obrigada.
ResponderEliminarFoi mesmo um grande prazer receber este "objecto". Obrigada pelo gesto. E gostei imenso de o desfolhar, de me reter aqui e ali, com belas imagens. Acho que este poema, Experiência III, é o meu preferido, mas ainda não tenho certezas :)
ResponderEliminarUm grande abraço
Reconfortante ... digo eu!
ResponderEliminarDoce e sábio... digo eu :)
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