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10.5.09

Estragédias


Alguns artigos do «arquivo de imprensa» do ministro da Cultura José António Pinto Ribeiro (numa pesquisa que visava perceber a sua estratégia para a pasta da Cultura):






Pinto Ribeiro e Isabel Pires Lima têm certamente estilos diferentes mas a estratégia para a cultura anda muito próxima. Vejamos:
A ex-Ministra apontava como prioridade a Internacionalização da cultura portuguesa, partindo do princípio de que fazer diplomacia cultural é também fazer diplomacia económica. (Não podíamos concordar mais. Na verdade, já era tempo de alguém evidenciar esse aspecto). O problema é que Pires Lima não avançava com medidas concretas. Pinto Ribeiro pode erguer (para alguns) o acordo ortográfico e caiu bem o apoio às galerias na Arco 2009.
A ex-Ministra apontava a Conservação Preventiva como outra prioridade - não só do património edificado, como do livro antigo, por exemplo - ou seja, mudar a arquivística. (Não podíamos concordar mais). O problema é que Pires Lima não avançava com medidas concretas. Pinto Ribeiro já o fez. Um por cento das grandes empreitadas de obras públicas passarão a reverter para a recuperação de monumentos. Mas qual será o critério na atribuição do alvará para intervenção no património? O Igespar terá os recursos humanos para fiscalizar todas as obras de recuperação? Quem fiscalizará o Igespar? (desculpem, mas depois do processo de «requalificação» do Museu de Aveiro, acho que a última pergunta é legítima).

Outro grande objectivo do Ministério da Cultura, afirmava Pires Lima, era o de incluir Portugal na rota das grandes exposições da Europa. Nesse sentido ocorreram as negociações (que já tinham um histórico de dez anos) para a fixação da colecção de arte do comendador Joe Berardo em Portugal e a sua integração num novo Museu de Arte Contemporânea, em Lisboa. Em 2006, a então ministra da Cultura noticiou também a celebração do
Protocolo Hermitage. (O Museu Hermitage é um dos maiores do mundo e faz circular as suas exposições na Europa e EUA. A partir de 2010, Portugal passaria a ser o terceiro ponto da Europa onde essas exposições poderiam ser vistas). Enfim, o Protocolo estava assinado e ainda não tinha sido criada uma comissão para orçamentar o projecto. O que veio a acontecer? - Em 2008 «Hermitage já não quer ter um pólo permanente em Portugal». Escusando-se a entrar em pormenores, o director do Hermitage [Mikhail Piotrovski] diz apenas que houve "demasiadas discussões" e "dinheiro que não chegava", "questões que normalmente correm sem percalços".
Outra grande aposta estratégica da Ministra era a Descentralização. (Excelente ideia dinamizar a rede de Cineteatros, concertando programação e oferta, optimizando recursos. Porque a cultura "é um veículo de qualificação dos portugueses", é excelente que o Estado aposte nos Serviços Educativos desses organismos e incentive programações para o público escolar). Pois o projecto "
Território das Artes", através do qual o Ministério pretende promover a "descentralização das artes e a formação de públicos", prossegue. Há apenas um senão: os Presidentes de Câmaras Municipais sacodem a vereação da Cultura para o Conselheiro Acácio do burgo (quando não para o Primo Basílio) e estes reproduzem o modelo, nomeando a seu bel prazer os Directores dos Cineteatros. Adeus competência, olá amigo político! É com o não-critério que se descentraliza a arte e qualifica público?

Enfim, não me digam que não há uma estratégia clara para a Cultura. É claro que há! Falta é... acuidade, responsabilização, avaliação? As generalizações são grosseiras mas: pouca coisa se fez bem; o que se fez, fez-se muitas vezes tarde; quer (des)fazer-se o que está (bem) feito. Se Isabel Pires Lima se atolou com as exposições, Pinto Ribeiro está a enterrar-se com os Museus. Se a primeira mudou Direcções (as mais polémicas: Teatro Nacional D. Maria II, Teatro Nacional de São Carlos, Museu Nacional de Arte Antiga) porque "
as instituições precisam de se renovar", o actual (já) exonerou algumas dessas Direcções. E, Senhor Ministro, o Plano Nacional de Leitura está mesmo a correr bem? Como é feita essa avaliação? Para começar, não seria melhor rever a lista dos livros recomendados (ou convém manter boas relações com todas as editoras e mais uma)? Não será melhor acertar agulhas com o Ministério da Educação antes de lançar essa ideia top ten do Plano Nacional de Escrita? Outra coisa: quem não vive em Lisboa (ou Porto), como pode aceder aos filmes da Cinemateca?


P.S.: Que não se conclua destas palavras que responsabilizo unicamente o Estado, ou o PS ou o PSD, pelo «atraso» português em matéria de produções e consumo culturais. O Estado deve regular, legislar, intervir, «democratizar», salvaguardando a identidade histórica mas também projectando novos valores artísticos, sociais, políticos! A um outro nível, a Escola tem também esse papel! E os Media, pois! Mas, na verdade, acho que é tempo de nos responsabilizarmos todos por este estado de situação. Quando escolhemos a TVI, ou a novela brasileira, ou os Circos das Celebridades, quando deixamos o Teatro lá da terra às moscas, não sabemos onde fica o Cineclube local, não lemos mais que um ou dois livros por ano, fazemos uma opção em termos do país (e do mundo) que queremos para nós, ou não? :P


Adenda: Este post já se chamou: «Com o programa das Festas do Munícipio à minha frente, quando se comemora «Aveiro 250 anos», deu-me uma fúria e decidi culpar toda a gente»

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