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16.5.05

À escuta #4


Larry Wiese

[Lei de Código de Trabalho, Concertação Social]

- Entramos num novo período, estamos a viver uma revolução no comércio mundial. A competitividade aumentou, as deslocalizações são uma ameaça. Neste contexto de globalização é inevitável discutir sobre a necessidade de flexibilização dos horários de trabalho ou dos salários. Mas muitas propostas por parte do patronato não têm sentido. Estas resultam apenas da dinâmica neo-liberal que domina o mundo.
- É preciso desdramatizar, as deslocalizações não existem em massa e não são um problema exclusivo de Portugal. Este é um problema europeu. Em Espanha, a zona da Catalunha está a ser bastante afectada, nomeadamente no sector automóvel. E o Norte de Itália também está em crise.
Mas a tendência é para continuar e o número vai crescer. Então temos que pensar no melhor recurso de Portugal, que são os recursos humanos - todos reconhecem que temos uma caracterítica muito valiosa, que é a adaptabilidade. Muitas empresas já fazem acordos laterais que permitem satisfazer necessidades pontuais, responder a encomendas especiais, etc., através por exemplo do trabalho ao Sábado. Mas é claro que estas soluções ainda são muito caras e há dúvidas quanto à sua legalidade.
- Temos o exemplo da Auto-Europa e não, a lei não proíbe o acordo que foi feito. Em regra, os acordos até são informais e normalmente os trabalhadores disponibilizam-se para isso. Mas a lei geral não deve instituir certos princípios que permitam abusos. Dialogar com os trabalhadores é fundamental, é preciso perceber que existem sempre dois parceiros e que a regra da pressão ou da ameaça não é eficaz. As empresas devem apresentar propostas e estas devem, é claro, incluir contrapartidas que motivem os trabalhadores.
- Há um princípio a ter em conta: não negociar significa fechar as portas da empresa, significa criar desemprego.
- Mas existem poucos empresários com disponibilidade para discutir, apresentar propostas, negociar com os sindicatos.
É necessário desmistificar a imagem da intervenção dos sindicatos. Talvez as pessoas não saibam mas as empresas que têm sindicatos são mais cumpridoras das suas responsabilidades e são mais estáveis.
- A verdade é que a maior parte das empresas já flexibilizaram os seus tempos de trabalho, agora só falta legalizar.
- Sim, mas a competitividade não deve ser feita através da redução de regalias. Muitas vezes, o que é preciso é começar pela reestruturação da empresa. Por exemplo, quando se sabe que as cabelagens vão desaparecer (no sector eléctrico), o que é prioritário é repensar o negócio e não os baixar salários, porque senão está apenas a adiar-se um problema.


- A concertação actual dá ensinamentos. Acho que não se deve ser muito ambicioso. O actual acordo bi-partido tem apenas uma página e meia. Reduziram-se ao mínimo os objectivos e vai controlar-se o mais possível o cumprimento do que ficou estabelecido.
- Existem matérias em que se pode avançar a partir da concertação, é o caso da Formação Profissional.
- Nós precisamos agora do Estado porque é o Estado que legisla.
- O Estado deve tratar com delicadeza o déficit mas não pode esquecer a questão da coesão social. É preciso criar riqueza mas também é necessário pensar na distribuição da riqueza.


[Inspirado num debate moderado por Sérgio Figueiredo na 2: que contou com as presenças de Francisco van Zeller, Presidente da CIP, e Manuel Carvalho da Silva, Secretário-Geral da CGTP-IN. A iniciativa desta concertação bi-partida é para aplaudir. Francisco van Zeller terminava dizendo que "mesmo que não haja acordo, o debate em si foi muito útil". E Carvalho da Silva sabe enquadrar as questões laborais numa óptica macro-económica! ]

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