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30.4.05

A caminho de Zanzibar

Não, não é para toda a gente, é preciso querer... Nos próximos dias vou andar por aqui.

Mas não pensem que não tive insónias só de pensar nos perigos desta viagem!

InJAZZ - Jazz em Português


MG, O Piano

No total são 6 cidades portuguesas a receber a primeira edição do InJazz. Aveiro é uma delas. Hoje, no Teatro Aveirense, às 21:30, poderemos ouvir Bernardo Sassetti - solo ao piano, e Mário Delgado "Filactera Redux" - com Mário Delgado na guitarra, Alexandre Frazão na bateria e Jesse Chandler em hammond.

Será que o público vai aderir a esta iniciativa? Tem que ser! Concertos ao pé de casa com excelentes músicos portugueses, não é todos os dias!

29.4.05

Stolen moments

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Fancie ou Elisabeth Wood, como quiserem. Canta stolen moments.


Do álbum A negative capability, 2001

À escuta #1


Louise Chin e Ignacio Aronovich

- Às vezes não te apetece apaixonar-te...
- Come a sopa...
- Achas que não é possível apaixonarmo-nos por uma pessoa e sermos felizes só com ela..., viver bem com uma pessoa o resto da vida...
- A sério, come a sopa, o empregado está à espera do teu prato, já está a incomodar-me... Não, eu não conseguia... Os homens não conseguem!


- Apetece-me apaixonar-me perdidamente
- Mas por mim não...?
- Não, por ti não, por favor!
- Oh, não digas isso!
- É claro que não, aliás se fores meu amigo, nem deixas que isso aconteça... Bom, e é isso que fazes todos os dias!


- Tens um coração à prova de balas...
- Claro, um tipo aprende a defender-se!
- Estava eu no meu seminário e leio essa mensagem no telemóvel...


- Mas tu achas que eu sou um malandro?
- Claro que és um malandro!
- Sim, sou um bocado malandro. Mas antes era muito mais.


- Eu sei que devo encarar tudo com leveza...
- Sim, com leveza!
- Aprender a viver o momento...
- Sim...


[Ao casal desconhecido que se sentou ao meu lado naquele balcão peço perdão pela indiscretione. Mas era tão engraçado. Cada um à sua maneira, eram amorosos nos seus ardis e desenganos. Auguri!]

28.4.05


Olha!

- É verdade?
- Porque deveria mentir-te? Anda, deixa-me levar-te lá para fora.
- Não, vai tu à frente. Eu vou atrás.
- Mas estou impaciente para voltar a ver-te.
- Só me verás como eu quiser. Vai à frente e não te vires.

in Italo Calvino
Cosmicómicas
Ed. Teorema, 1990, pp 74

E o desenho é de... ? Já reconhecem o traço?

Solução:
MG

27.4.05

Roma del Popolo


Fontana di Trevi

É claro que atirei a moedinha para a fonte. Quero voltar a Roma, sim! A cidade é troppo bela e alguns dias não bastam para saciar a vontade de conhecer. Mas quando a ocasião chegar vou planear melhor a viagem. E certamente não vou escolher uma data próxima...:
- da entronização de um Papa;
- da entronização de uma Papa alemão: pelo menos 150 mil alemães na cidade! viu-os passar!
- de um fim de semana prolongado, também em Itália - neste 25 de Abril comemoravam os 60 anos do seu Independence day;
- de uma "domenica sportiva" com um jogo de futebol importantíssimo para o campeonato italiano - no Stadio Olimpico de Roma, a Juventus, que disputa a liderança com o Milan, jogava com o Lazio: vencendo por 1-0, igualou os 73 pontos do Milan na Classificação da Série A.

É que, na prática, isto significou: rios de gente na Piazza di Spagna e suas escadinhas, rios de gente na Piazza del Popolo e suas igrejas, via Condotti (a 5ª avenida de Roma) intransitável, vontade de atirar à Fontana di Trevi todos os turistas que, como nós, queriam sentar-se e fotografar-se e refrescar-se, verdadeira Via Sacra entre o Colosseo e o Foro Romano, filas intermináveis e colossais para entrar no Colosseo, no Musei Vaticani e Cappella Sistina, na Basílica di San Pietro,... e já ficaram com uma ideia!

Mas, apesar de toda esta agitação, não deixava de exclamar a todo o momento: belíssimo! Roma não tem arranha-céus nem janelas de alumínio. Roma tem verde, existem imensos parques. Roma tem charme. As fachadas romanas clássicas têm cores ocres, amarelo, pêssego, e estão bem conservadas. A cada esquina a memória do império romano numa pirâmide, numa coluna, numa parede, num obelisco, numa ruína. E a renascença e o romantismo que pintores e escritores que passaram por Roma lá deixaram, não foram destruídos. Roma tem inúmeras fontanas, palazzos, museos, chiesas, piazzas que vivem! E depois os detalhes, que são dicas a não perder: o museo atelier Canova Tadolin, o antigo estúdio do famoso escultor agora transformado em restaurante; o caffè Greco para o melhor cciocholai da vossa vida; e, até 31 de Maio, a XIV Quadriennale d'Arte di Roma na Galleria Nazionale d'Arte Moderna (com almoço ou lanche dentro do museu)!

No Domingo, dia do entronamento, foi definida uma "área rosa" à volta do Vaticano. A missa começava às 10h mas nenhum automóvel podia entrar na área depois das 8h. O Metro foi fechado, os autocarros não podiam circular. Por razões de segurança (não a dos chefes de Estado mas a do popolo, que aos milhares acorria à zona). Assim, a maior parte dos peregrinos deslocou-se a pé para a Basílica. Benedetto XVI foi aclamado. Comentário da RAI: o Papa teve uma postura muito solene! Imagens da RAI (cumprimentos): todos os monarcas presentes com especial destaque para os reis de Espanha, o irmão de Bush (o único que se ajoelhou), o presidente italiano e o disgraciatto Berlusconi&mulher&filho e o "nosso" Durão Barroso. Foi nesse dia que decidi ir para o Coliseu para fugir às multidões... e descobri que (1) tinham instalado por lá um écran gigante, e que (2) todos os italianos em fim de semana prolongado que não tinham ido para os Alpes ou para Porto Fino, escolheram colmatar uma falha imperdoável no seu curriculum vitae, conhecendo nesse preciso dia aquele pedaço de Roma e do tempo.

Palavras que ficaram:
Mussolini era o Homem da Providência Divina, enquanto governou evocava a Glória da Roma Antiga..., de repente percebi como ele era pequeno, foi um choque - Urbano Lazzaro, o soldado que prendeu o ditador em fuga, na RAI (Mussolini e a amante Laura foram executados no dia 28 de Abril de 1945, sem julgamento, e os corpos mutilados foram expostos em Milão)

O meu pai dizia que os políticos são como canas ao vento, se não abanarem, quebram - ilustre passageiro da TAP, reformado, filho de um carabineri que fez parte do corpo de guarda de Mussolini, com quem conversei no vôo Lisboa-Roma.

O fantasma de Nero aterrorizava aquele local onde, diziam, havia uma árvore amaldiçoada. O Papa Pascal II apaziguou a população mandando queimar a árvore e construindo uma capela. (1099, Santa Maria del Popolo)

Confirmações:
Não podemos deitar-nos no chão da Capela Sistina para ver o tecto.

Em Itália não se fuma em restaurantes e cafés.

Os taxistas discutem em todos os países do mundo.

Os franchisings espanhóis de vestuário não invadiram a Itália.

As cidades conhecem-se a pé.

Tenho que ir a um ortopedista.

Regresso:
Não é só chegar do Outro Mundo, e pronto! Reencontramos o fio dos dias como o deixámos, a arrastar-se por aqui, pegajoso, precário. A esperar-nos. in Céline, Viagem ao fim da noite, Ed. Ulisseia, p. 209

nota: Não é tanto assim...:)

22.4.05

Roma



Ao desembarcar em Roma, no século XIX, o romancista francês Stendhal ficou pasmo com esse mosaico montado aleatoriamente pelos séculos. Essa reacção é conhecida hoje por "síndrome de Stendhal". É na expectativa desse efeito que viajo agora para Roma (vou tentar fugir ao "síndrome de Bento XVI").

Amici della blogosfera, até breve !


P.S.: decidi comemorar antecipadamente o Dia Mundial do Livro e o Dia 25 de Abril. Com alguns poemas. Com a lembrança de que em muitos lugares no próximo sábado se celebra o prazer da leitura e com o apelo à festa no dia 25! Para quem esqueceu ou não viveu os tempos da outra senhora, talvez ler, reler os Poemas da Resistência de Joaquim Pessoa, reavive o canto da liberdade. Porque se a pátria é uma herança ela é também o espaço que está à nossa frente (o poema completo de António Ramos Rosa está ali em baixo).

Enquanto lêem vão ouvindo, José Mário Branco. Resistir é vencer é um álbum belíssimo, fantástico, maduro, poético, ... descobri-o e ando a ouvi-lo a ouvi-lo. Canção preferida, já agora: o papão do anão!

O cão da tristeza


Hiroshi Watanabe

A gente faz amor como se a morte doesse mais que a vida e é mentira.

O cão da tristeza está aqui.
Aqui, sem alma, ferrado no meu espanto.
Puxando as verdes charruas do meu pranto
lavrando a dor cinzenta do meu povo.

O cão da tristeza está aqui.
No giz do meu lume, na fogueira acesa
que queima a minha casa, destrói a minha mesa
e magoa o meu sangue e a minha voz.

O cão da tristeza está aqui.
No açaime do medo que nos cala
na sombra do punhal, no frio da bala
apontada ao coração da nossa esperança.

in Joaquim Pessoa, Poemas da Resistência (1968/1971)

Pela liberdade viva


Denny Moers

Neste país sem olhos e sem boca...
Ruy Belo, Homem de Palavras(s)


Meu amor
no teu peito de coragem
feito de pedras e cardos
há um país de viagem
e vinhos de cada cor
verdes maduros bastardos.

Há uma pedra de cal
em cada olhar que respira
há uma dor que já dura
desde que dura a mentira
há um muro levantado
numa seara madura.

Verde mar
verde limão
são os teus olhos de medo
o vento é este segredo
que escreve em cada manhã
o nome dela na erva
numa folha numa pedra
nos bagos de uma romã.

Acendo-te uma fogueira
nas tuas mãos acordadas
dou-te flores de laranjeira
dou-te ruas dou-te estradas
dou-te palavras secretas
dou-te coragem e setas
dou-te os meus dedos crispados
ponho cravos amarelos
à volta dos teus cabelos
dou-te o meu sangue vermelho
e o meu canto proibido

Dou-te o meu nome
raíz
há muito tempo arrancada
dou-te esta calma guardada
nos homens do meu país
dou-te a fome
do meu canto
dou-te os meus braços em cruz
e as mãos feitas num crivo
dou-te os meus pulsos abertos

mas é por outra que vivo.

in Joaquim Pessoa, Poemas da Resistência (1968/1971)

O Filho


Henk Braam, foetus

Em plena guerra, a vida levou-te a ser o amor do soldado...

Ai, filho, sabes, sabes
donde vens ?

Dum lago com gaivotas
brancas e famintas.

Junto à água de inverno
ela e eu levantámos
uma fogueira rubra,
consumindo os lábios
de tanto beijarmos nossas almas,
lançando ao fogo tudo,
queimando as nossas vidas.

Assim vieste ao mundo.

Mas ela, para ver-me
e para ver-te, um dia
atravessou os mares
e eu, para abraçar
sua pequena cintura,
percorri a terra inteira,
por entre guerras e montanhas,
areais e espinhos.

Assim vieste ao mundo.

Vens de tantos lugares,
da água e da terra,
do fogo e da neve,
de tão longe caminhas
ao encontro de nós dois,
desse terrível amor
que nos acorrentou,
que queremos saber
como és, que nos dizes,
porque tu sabes mais
do mundo que te demos.

Como uma grande
tempestade sacudimos
a árvore da vida
até às mais ocultas
fibras das raízes
e apareces agora
cantando na folhagem,
no mais alto ramo
que contigo alcançamos.

in Pablo Neruda, Os Versos do Capitão

Portugal futuro


Denis Okanovic, escape

E então olhei à minha volta
Vi tanta esperança andar à solta
José Mário Branco

O portugal futuro é um país
aonde o puro pássaro é possível
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
as profundas crianças desenharão a giz
esse peixe da infância que vem na enxurrada
e me parece que se chama sável
Mas desenhem elas o que desenharem
é essa a forma do meu país
e chamem elas o que lhe chamarem
portugal será e lá serei feliz
Poderá ser pequeno como este
ter a oeste o mar e a espanha a leste
tudo nele será novo desde os ramos à raíz
À sombra dos plátanos as crianças dançarão
e na avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será verão
Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o portugal futuro

Ruy Belo

Pátria


Denis Okanovic

Cada um de nós é por enquanto a vida. Isso nos baste.
José Saramago

Pátria é uma palavra que podemos dizer
sem que a maioria do povo a reconheça
Ela não pertence ao léxico das palavras comuns
e se os políticos a referem é quase sempre com a violência
de uma retórica vã
Mas seja qual for a forma e substância dos seus símbolos
bronze ou pedra bandeira chama música ou palavra
nós sabemos que ela está viva e vitoriosa
sobre todos os obstáculos e desastres
grávida de um futuro de comum liberdade

Se a pátria é uma herança ela é também o espaço que está à nossa frente
em que temos de projectar as suas dinâmicas linhas
em que vibrará o ritmo do nosso sangue e da nossa respiração
porque ela será a realidade do que em nós é a irrealidade do nosso ideal

in António Ramos Rosa, Pátria Soberana

21.4.05

Destinatário II


Sokolsky

Camille Laurens, Dans ces bras-là, sobre a relação com os leitores. Continuação.

Houve um tempo em que, sem dúvida, eu esperava uma resposta. Que vocês me explicassem, que vocês me dissessem. Eu interrogava os homens dos livros, poetas, personagens, imaginava que um dia a vida correria sob a ponte dos nossos braços. E depois li esta história que consagra o mundo à escrita: a de um rapazinho que quer que a sua mãe o beije antes de se deitar e que apenas recebe, como resposta à sua carta de amor, estas palavras de solidão: "Não há resposta".
O sentido foi-me comunicado dessa forma, libertando-me também de tanta ausência, de tanta espera. Eu não escrevo para que vós me respondais, não: eu escrevo porque não há resposta. Eu jamais estarei nos vossos braços - nem vocês nos meus - nunca abraçados.

Às vezes, no entanto, sonho com uma forma de nos unirmos. A dormir, sobretudo - Morfeu embala-me e imagino como prolongar este sono amoroso em que o deus é um homem. E então eu vejo-vos - estais na fronteira do esquecimento mas vejo-vos, estendeis os braços para mim, e eu avanço, avanço na direcção de vós que me estais destinado - meu destinatário. Quem disse que sois uma mulher ? Que loucura ! A morte terá os vossos olhos, e é sobre o vosso tronco que inclinarei a minha cabeça, tenho a certeza, e sobre os vossos ombros colocarei as minhas mãos. Sois vós, sois mesmo vós na margem oposta, e a distância entre nós a reduzir-se, logo logo a anular-se, dancemos, eu aproximo-me e tu estreitas-me - ah aperta-me, leva-me - como estamos bem, sim, como estamos bem nestes braços!

Se tu me esqueces


Sokolsky

Quero que saibas
uma coisa

Tu sabes como é:
se contemplo
a lua de cristal, os ramos rubros
do outono lento na minha janela,
se toco
ao pé do lume
a impalpável cinza
ou o corpo enrugado da lenha,
tudo a ti me conduz,
como se tudo o que existe,
aromas, luz, metais,
fossem pequenos barcos que navegam
em direcção às tuas ilhas que me esperam.

Ora bem,
se a pouco e pouco deixas de amar-me,
deixarei de amar-te a pouco e pouco.

Se de repente
me esqueceres,
não me procures,
que já te terei esquecido.

Se consideras longo e louco
o vento de bandeiras
que percorre a minha vida
e decidires
deixar-me à margem
do coração em que tenho raízes,
pensa
que nesse dia,
nessa hora,
levantarei os braços
e as minhas raízes irão
procurar nova terra.

Mas
se em cada dia,
em cada hora,
sentes que a mim estás destinada
com doçura implacável.
Se cada dia em teus lábios
nasce uma flor que me procura,
ai, meu amor, ai, minha,
todo esse fogo em mim se renova,
em mim nada se apaga nem esquece,
o meu amor do teu amor se nutre, amada,
e enquanto viveres continuará nos teus braços
sem abandonar os meus.

Pablo Neruda

20.4.05

Vou no jipe e descubro este cd do bin...

Canta Marcel Khalifa

Já sonho com Ngorongoro VI



Quando foi que te escrevi a última vez? Os dias são longos, perco a noção do tempo. Disse-te que ia ao mercado de Arusha com o Biko? Foi no dia em que o meu grupo de montanha partiu. Estava a sentir-me um bocado perdida e sozinha. Apetecia-me aquele conforto que se encontra apenas com os velhos amigos, o passado comum que nem se evoca, ele está lá e não é preciso descrever ou justificar coisa alguma, bate-papo de quem se reconhece. Na verdade pensava sobretudo na Graça e na Valentina, sabes que fizemos umas viagens muito giras lá mais para o Norte: as três de mochila, sem reservas nem dinheiro para hotéis de luxo, e correu sempre tudo bem. foi espantoso. conhecemos tanta gente boa. Bem, nesse dia faltava-me essa camaradagem e cumplicidade. E depois sou largada pelo Biko no mercado e descubro que é a semana da Mulher! Ao telefone pediste-me impressões, falavas da minha chegada a Nairobi e querias saber do impacto que tudo está a ter em mim desde esse dia. Pois olha que é confuso. Caiem ideias feitas, agravam-se suspeitas, entram novas realidades. No Quénia, e aqui também, há uma enorme miscelânea de ritmos e influências, raízes e impérios, pés nus e t-shirts de contrafacção de marcas, poligamia e a semana da mulher, crianças por todo o lado e uma mesa com contraceptivos no mercado. E essa mistura começa nos nomes das pessoas. Sabes quem são o David Kagai, a Judy Wanjiku, o Tony Githinji ou o Jimmy Kibaki? Pelo último nome foste lá - são os filhos do presidente do Quénia, Mwai Kibaki. Pai Mwai, filho Jimmy. Gostei deste mercado. Nenhuma das mulheres (quase não vi homens) se chamava Judy. E meteram-se comigo, acho que gozaram comigo, riam-se imenso, queriam mesmo perceber o que fazia ali já que estava sozinha. A curiosidade é permitida.

Os homens falam menos. Sabes isso. Quando vejo a quantidade de jovens que passam os dias na estrada, sentados ao sol, desocupados, à espera de um biscate, percebo esse silêncio... Estarei a fazer um filme? Mas esta terra "esmaga-me". A natureza "esmaga", o que se adivinha da vida destas pessoas também "esmaga".

Preciso do sorriso do Andwele.

A foto que te envio foi tirada no mercado em Arusha. Fiz compras a pensar nesta longa viagem. a pensar também no deserto. Atravessar o Sudão, disseste. Acreditas que vi "jóias" que pareciam fazer parte do tesouro de Méroé ?

P.S.: min fadlik bin, traz-me repelente para os insectos, o meu está a acabar. shukran

Beijos
Maria

19.4.05

Bento XVI Joseph Ratzinger foi eleito novo papa. Tem 78 anos.

O cardeal alemão dirigiu a "Congregação para a Doutrina da Fé" durante 23 anos, o que lhe permitiu «zelar» pela doutrina da Igreja. Puniu 140 teólogos que se distanciaram da doutrina oficial do Vaticano.

Conhecido como o «Guardião do Dogma» teve ainda um comportamento de condenação da homossexualidade e de crítica à participação das mulheres no «ofício» da Igreja.

Pergunto: para quando um Cisma ?

O destinatário


Sokolsky

Camille Laurens falava assim da sua relação com os leitores em Dans ces bras-là. Vou tentar uma tradução razoável. (juro que este post já estava previsto, dia 23 é o dia do livro..., disfarço bem?)

O destinatário recebe o que lhe damos. Ele cala-se, ele não responde. O destinatário não é um correspondente, ele está destinado a calar-se, a permanecer na sombra deste silêncio em que, no entanto, sabemos que ele nos ouve. O acordo por parte do destinatário em relação a este seu destino discreto é essencial, é importante que ele nunca o ponha em causa.

Escrevo para vocês, escrevo-vos. (...) É a vocês [homens] que eu falo, falo-vos de vocês, de vocês e de mim. Não sei quem sois, mas vejo-vos, adivinho-vos, pinto-vos, falo-vos, invento-vos: escrevo-vos.

Quem sois vós? Ignoro-o. Não vos conheço.

Acima de tudo, não me respondais. É inutil. Nós não podemos corresponder-nos, não há correspondência possível entre nós. Vós estais longe, vós sois o outro, vós sois o homem. Aceitei esta distância que flutua entre nós como o trajecto de uma carta que viaja. Não escrevo para que me respondais, e no entanto escrevo-vos. Não fiqueis admirados: eu renunciei a agarrar-vos, mas não ao gesto de vos agarrar. A escrita é esse gesto; escrevo na vossa direcção. É como a mão que agitamos quando o combóio está a partir: inútil, sem que seja vã.

[P.O.L éditeur, 2000, pp 308-309]

Divas & Golpe baixo


Merel Zwart

Durante 5 meses este blogue andou direitinho e graças a leitores respeitáveis ultrapassei as 10000 visitas.
Mas hoje-inho, Senhorias, permiti-me ajavardar por completo o sistema. A ideia não é original. Pois não! Mas vou fazer a experiência.
Amigos do Google, Yahoo, Sapo e de outros motores de busca, com gostos mordazes e algumas parafilias, este post é vosso! Só este. Também vós, perdoai este golpe baixo, mas que sejam muitas as pesquisas falhadas!

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18.4.05

Para o baile

E agora Nyamamusango.
Para o Bin. Tinha que ser... porque, como diz o velho provérbio africano, ao baile das aves leva trigo.

Obra-prima e pés nus


Merel Zwart

Déjà, ils étaient au bord de la tendresse, en chemin vers un baiser. Liberté recula nettement et, avec dépit, lâcha:
- Non, ça ne va pas...
- Quoi?
- Notre dialogue, ce qu'on vient de dire. Vous trouvez ça suffisant pour commencer un amour parfait ? Je me suis trompée... La sincerité trop rapide, c'est déplacé. Il aurait fallu un peu plus de mystère, davantage de sous-entendus. Vous ne pensez pas ?
- Qu'est ce que vous cherchez ?
- Un chef-d'oeuvre... sinon rien.
- Puis-je vous poser une question ?
- Oui.
- Pourquoi êtes-vous nu-pieds ?
- Par plaisir. Je fais toujours ce qui me fait plaisir...

Alexandre Jardin
Mademoiselle Liberté
Gallimard, 2002 (p. 90)

Está claro que vos desejo uma BOA SEMANA?

Já sonho com Ngorongoro IV


Kili visto de Moshi

bin, estou em Moshi numa guest house [+ 255(0)553071]. Todos os outros foram deitar-se porque amanhã bem cedo vêm buscá-los para o regresso a Nairóbi. Eu não tenho sono. Provavelmente nunca mais os voltarei a ver, para além da Gillian, que quer que vá ao casamento dela em Junho (em Bath. já por lá passei, longe de imaginar que um dia voltaria para assistir ao casamento de um casal local. os pais têm um bed&breakfast. não lhe disse que os que conheci eram pavorosos, cheios de flores - no papel da parede, nas alcatifas, nas colchas... Estou a ser má. mais uma vez devaneio para não ficar triste. já tenho saudades dela, deles todos). Encontrei uma cassete vídeo do Paciente Inglês e estive a ver um bocado, depois parei. irritou-me este impulso de urbana europeia! mas anotei um diálogo. pensei "este é o bin!" ;-)

Katharine - I've been thinking about - how does somebody like you decide to come to the desert? What is it? You're doing whatever you're doing - in your castle, or wherever it is you live, and one day, you say, I have to go to the desert - or what?

Almásy doesn't answer. Katharine, who has looked at him for an answer, looks away. There's another long silence.

Almásy - I once traveled with a terrific guide, who was taking me to Faya. He didn't speak for nine hours. At the end of it he pointed at the horizon and said - Faya! That was a good day!

Point made, they lapse again into silence. Katharine boils.
Katharine - Actually, you sing.
Almásy - Pardon?
Katharine - You sing. All the time.
Almásy - I do not.
Katharine - Ask Al Auf.

Almásy asks Al Auf in Arabic. He laughs, nods.

[Esqueço-me que esta carta segue por fax, não pode ser longa]
[Depois falo-te da subida ao Uhuru Peak]

Amanhã vou voltar a Arusha com o Biko (ele tem que preparar a próxima expedição e eu quero ver o mercado_____ tirar umas fotos) e à tarde convidaram-me para ir ver as plantações de sisal, não sei se é muito longe. mas quero ver o produto de maior exportação da Tanzânia! Agora que já tens o telefone daqui, podes sempre ligar - para me dizeres quando chegas/ ou deixa recado.

Obrigada também pela gravação da Rokia Traoré, adoro!

Beijinhos
Maria

The Grande Passion


Al Di Meola

O espírito criador acede então à alma, depois às almas e provoca uma aspiração, um impulso interior.
Wassily Kandinsky
in Gramática da Criação

O guitarrista de New Jersey, do Elegant Gypsy e de tantas outras fusões com a música latina, dedilha em The Grande Passion - World Sinfonia, este Double Concerto de Astor Piazzolla.


Double Concerto (5:55)
Astor Piazzolla
Al Di Meola, acoustic guitar (Roland GR 30-bandoneon) • Mario Parmisano, acoustic piano • Gilad, percussion • Toronto Orchestra, strings and woodwinds • Fabrizio Festa, conductor

Tango


Lex

sacrificaram tudo a deus. e
o que não sacrificaram a deus
sacrificaram pelos vindouros

os quais

sacrificaram tudo a deus. e
o que não sacrificaram a deus
sacrificaram pelos vindouros

os quais

sacrificaram tudo a deus. e
o que não sacrificaram a deus
sacrificaram pelos vindouros

os quais

sacrificaram tudo a deus. e
o que não sacrificaram a deus
sacrificaram pelos vindouros

e assim sucessivamente.

para os vindouros ainda não.
para deus já talvez tenha valido a pena.


Alberto Pimenta
Obra Quase Incompleta
Ed. Fenda, 1990

15.4.05

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deus disse luz. ele disse estrada de Machame.

deus viu que era bom. criaram o primeiro dia.
ele sonhou Shira. deus concordou. adiaram Kili para o sétimo dia.

"Conta-me um conto - digo-te. Como queres que ele seja? Conta-me um conto que nunca contasses a ninguém." (Eva Luna)

Já sonho com Ngorongoro III

Leituras II

A padeira de Aljubarrota e o Francis dos Churrascos mandaram-me um questionário. Pensei que fosse para conhecerem os meus hábitos alimentares, mas afinal é para saberem o que ando a ler! Será que vamos passar a ter menus de livros para acompanhar refeições?
A ideia até que não é má...

Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Metafísica dos Tubos de Amélie Nothomb, para viver eternamente na infância e acreditar que tudo é possível, até ser um deus.

Já alguma vez ficaste apanhadinha(o) por um personagem de ficção?
É um prazer ler um livro e entrar dentro de um personagem. Felizmente aconteceu muitas vezes, dura o tempo da leitura e às vezes um pouco mais.

Qual foi o último livro que compraste?
Não sei, compro livros quase por impulso (que se vão acumulando até os poder ler). Dos últimos: Londres e Companhia, de Luís Amorim de Sousa (dica do Jorge da livraria O Navio de Espelhos), Viagem por um Século de Literatura Portuguesa do Nuno Júdice (já li, reli e aconselho: é um livro pequenino em que se revisita um pouco dos grandes autores, desde a geração de 70 até aos nossos dias), A Cidade no Bolso de Mário Cláudio, Almas Cinzentas de Philippe Claudel (ainda não li os dois últimos).

Qual o último livro que leste?
Até há pouco tempo pegava num livro de cada vez, agora tenho sempre dois ou três (completamente diferentes) na cabeceira. Acabei Primeiras Histórias de João Guimarães Rosa (que o meu amigo Nuno me emprestou, é uma edição antiga da Ed. Nova Fronteira). Botafogo da Leonor Xavier foi o último livro que li-reli-re-reli (para a apresentação em Aveiro).

Que livros estás a ler?
Materna Doçura de Possidónio Cachapa (para devorar), Viagem ao Fim da Noite de Céline (para ir lendo devagar).

Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
Se fosse para uma estadia curta levava o que andasse a ler, mais alguns do "rol de livros que esperam há muito tempo". Se fosse para sempre, não sei mesmo..., preferia levar 5 amigos com quem passaria o tempo a contar e a escrever histórias. Mas Os Universos da Crítica do Eduardo Prado Coelho seria uma hipótese a considerar: nunca consegui acabar de o ler, é grosso (dá para almofada), é pesado (serve de arma), é denso (sempre útil para esquecer o isolamento) e teria certamente a sensação de aprender qualquer coisa nova todos os dias.

A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
Vou passá-lo às meninas do baby lónia, Plasticina, Plan(o)Alto, Sol&Tude, Sentidos e Tou na Lua (sim, são mais que três, é a contar com as desistências) porque têm blogues muito bons que merecem ser visitadíssimos!

14.4.05

Já sonho com Ngorongoro

Continua a troca de correspondência.



Bin, esta foto e texto vão chegar-te via um padre católico de Likoni (que tendo nascido em Goa, fala português), ele decidiu regressar mais cedo a Arusha, não se estava a dar bem com a altitude. Tinhas razão quanto ao espírito de grupo e às amizades que se criam nestas aventuras. O padre Tonino falou-me tanto de Likoni e da sua missão que fiquei com vontade de passar por lá. mesmo se me falou de realidades muito difíceis, a Sida a assomar, gente pobre que é preciso alimentar, a dificuldade que teve para criar um dispensário, e sei lá que mais! Em Likoni há uma comunidade de católicos, penso que no total são 8 mil em cerca de 300 mil habitantes.

Disperso-me. Ou não consigo ainda falar-te da minha própria viagem. Acho que vou demorar algum tempo a digerir tantas emoções e cores e odores e brisas e horizontes sem limite. Cheguei a lamentar não ter optado pela estrada de Marangu (duvidava da minha boa forma física). Mas agora que me aproximo do Pico de Uhuru sinto que a estrada de Machame, o planalto de Shira, Kibo, a floresta, esta subida gradual, até a chuva (pois é, ou não estivéssemos em Abril..., eu pensei que a época das chuvas fosse só em Maio e Novembro!), a neve a 3° graus do equador, o rosto de cada um dos meus companheiros, o de Andwele que não vou nunca esquecer,... tudo isso, bin, eu tinha que viver.

Partilho a tenda com uma inglesa que se chama Gillian, morena e baixinha (julgam sempre que sou eu a inglesa :-) e a Gillian a portuguesa), e ontem estávamos exaustas mas não conseguíamos deixar de falar sobre as imensas coisas que temos vivido nestes dias, recapitulávamos... e depois paramos e as duas tivémos vontade de chorar. mas era um choro bom, eu acho que compreendes.

Amanhã vou fazer a subida pelo "Barranco hut" e não pelo "Arrow Glacier Camp" (conheces?). Medi as minhas forças e as pernas tremem. Temos que aceitar os nossos limites - outra lição de vida ;-)

Penso muito nas horas que se vão seguir. Sinto frio e calor. O Andwele adivinhou estes meus medos secretos - que convivem com o encantamento e a euforia - e, de tempos a tempos, descubro-o a olhar para mim, e então sorri daquela maneira e eu sei que "tudo vai correr bem".

Por ondes andarás agora? Encontramo-nos em que lugar? O "por lá" agora é imenso...

Ngorongoro a seguir... é bom demais!

mas bin, antes do Serengeti, podemos descansar uns dias em Zanzibar? acho que vou precisar de fazer uma pausa na marcha.
ficar deitada na areia.

beijos
Maria
P.S. Ando a ouvir Hukwe Zawose

13.4.05

Há alguns anos atrás tive um sonho recorrente. Via um homem sentado em frente a um cavalete. Um homem que estava cansado. Olhava fixamente para o que acabara de pintar e a exaustão que sentia misturava-se com a angústia de quem reconhece o inacabado e busca uma particular perfeição. faltava um qualquer rasgo de genialidade e sossego.

Concentro-me na tela. vou percebendo sob várias camadas de tintas e traços o perfil de um homem sentado num banco. de costas. e à sua volta uma mulher que o abraça. dois dorsos sobrepostos num afago.

Observava imóvel o pintor que eu amava. que não dera pela minha presença. Confortá-lo torna-se uma urgência. aproximo-me e, lendo aquela tela como um pedido, envolvo-o.

Desponta então o pesadelo. Descubro que também eu sou pintora. e a vontade de fixar aquele instante começa a dominar-me. Que ângulo seria o melhor? o dos meus braços sobre os seus braços... as coxas fortes semi-abertas suportando o peso dos dois corpos... o rosto quente que eu sentia mas não via... e a questão técnica vai-se sobrepondo aos sentidos. e com ela a ausência na figura presente. e a mentira e a culpa nascem naquele momento de irrepetível intenção amorosa.

Acordava mal disposta. Mas na noite seguinte voltava ao instante do abraço e à obsessão do ângulo que melhor traduziria a beleza original daquele encontro.
Esse sonho esgotou-se mas durante meses continuei a sonhar que era pintora e havia sempre uma qualquer solução que não encontrava. Houve a série "diferentes usos de distintas cómodas", "guernica da bomba atómica na Indonésia", "como pintar o azul do mar sem ter vertigens", etc..
Depois passou.

Hoje agradeço ao meu subconsciente nocturno a criatividade nos scripts, sabendo o quão difícil deve ser encontrar pontes para transferência de recalcamentos. mas ele fê-los belos e poéticos.
E diverte-me que até o meu subconsciente goze com a minha falta de habilidade para desenhar.

Podem agora os homenageados do dia compreender a admiração que me suscitam!

1. MG

Alguém perguntou quem é MG? Ele responde assim:


Sou MG

12.4.05

Songs from the trilogy


Philip Glass

Talvez se lembrem da banda sonora do filme The Hours. Eu descobri-o no século passado depois de ver Mishima (de Paul Schrader), também com música original de Philip Glass. Ele é um dos fundadores do minimalismo americano, a sua música é hipnótica e repetitiva. e intensa. Mas o que me fez ajoelhar (exagero. dobrar-me) foi a ópera. Philip Glass é um dos mais sublimes compositores contemporâneos de ópera.

Em 1977 compôs Einstein on the Beach, em 1980 Satyagraha e em 1983, Akhenaten. As três formam uma trilogia de óperas-retrato. Todas se centram num grande sábio ou, como explicou Glass, num homem cuja visão pessoal tenha revolucionado o pensamento do seu tempo pelo poder das ideias e não pela força das armas.

Einstein, Satyagraha-Gandhi (a ópera incide mais nos primeiros anos de actividade política na África do Sul) e Akhenaten, rei egípcio, considerado o primeiro monoteísta.
Deixo-vos um cheirinho de cada uma destas óperas da trilogia.

11.4.05


MG, Vale a pena

Às vezes pensamos a vida assim. Hesitar entre a perfeição e o desastre (O Livro da Dança, Gonçalo M. Tavares). MG risca Vale a pena. E eu quero segui-lo.

10.4.05

Nada é mais fantástico do que a realidade


Ricardo França (via Expresso do Oriente)

Dostoievsky - Ricardo França - Bhixma dão o mote e Thomas Bernhard, na Extinção, inclemente, vampiriza, destrói, extingue o sonho:

"Fotografar é um vício abjecto, que a pouco e pouco se vai apoderando de toda a humanidade, porque esta não está só apaixonada, mas também doida pela distorção e pela perversidade e, de tanto fotografar, toma efectivamente, com o tempo, o mundo distorcido e perverso pelo único que é verdadeiro. (...) Fotagrafar é uma paixão infame, que alastrou por todos os continentes e todas as camadas da população, uma doença que atacou toda a humanidade e da qual já não há possibilidade de cura. (...) Nunca vi em nenhuma fotografia uma pessoa natural, isto é, real e verdadeira. A fotografia é a maior infelicidade do século XX." (pp 37-38)

Drama

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Eu não vos vou contar a história em detalhe porque isso não se faz..., como não se conta um filme que alguém vai ver... Digo-vos apenas que Botafogo se centra na vida de um homem humilde, Joaquim Lourenço, nascido a 9 de Abril de 1922 na Sobreosa, que decide emigrar para o Brasil.

A primeira vez que ouvi falar da Sobreosa foi neste livro, Colorido a Preto e Branco, numa crónica chamada História de Natal. Image Hosted by ImageShack.us
Mas engano meu, o Botafogo não é de todo um Conto de Natal.


A Leonor Xavier é associada uma certa brasilidade, porque viveu 12 anos no Brasil e nunca cortou os laços com esse país. Ela define muito bem Brasilidade - pela negativa e pela positiva (pp 117, ainda no Colorido a Preto e Branco): "não é filosofia de conhecimento livresco, ..., não é uma espécie primária de cultura situada no sul do Equador..., não é colorido de escolas de samba, nem é só feijão com arroz e farofa. A brasilidade implica um respeito, uma intuição, uma aprendizagem de transfiguração para encarar a vida. Tem códigos especiais, princípios definidos, exige interpretação de significados....Talvez possa ser um mistério de fé...".

É esta aprendizagem de transfiguração, esta descodificação, que Joaquim Lourenço nunca vai conseguir realizar por completo. E por isso este romance é um drama, nascido de uma inextinguível portugalidade.

Loiras filósofas


Versão da Didas

Ele há com cada padeira... melhor que a de Aljubarrota!

A solu-são original das loiras

...é:
- Passou um sinal de stop, deixe-me ver a sua carta de condução por favor.
- Espere um momento enquanto procuro na minha mala... Como é que é?
- É rectangular... e tem uma fotografia sua...
- Ah... (retira espelho de bolso)
- Aqui está!
- Tome.
- (verifica)
- Pode continuar e desculpe-me. Não sabia que também era polícia.
- ah?

Mad e Helder, não sois nada loiros!

7.4.05

Loiras?



Depois do Sartre, decidi continuar nesta linha muito intello (ah...!?). Deixo-vos um quebra-cabeças dificílimo... para as loiras: que diálogo travam as personagens desta história?

6.4.05

Os dados estão lançados II


Sokolsky

- Ah!, ei-los!... Estão atrasados cinco minutos.
- Não nos teríamos enganado? - pergunta Pedro - Esperava-nos?
A velha senhora abre o livro grande numa página que está marcada com um sinal, e começa a ler com uma voz de escrivão, fria e sem timbre:
- Artigo 140: Se, em consequência de um erro unicamente imputável à direcção, um homem e uma mulher, destinados um ao outro, não se tenham encontrado em vida, poderão pedir e obter autorização de voltar à terra sob certas condições para aí poderem amar-se e viver a vida em comum de que tenham sido injustamente privados.
Terminada a leitura, levanta a cabeça e olha através do lorgnon o casal pasmado.
- É mesmo por isso que estão aqui?
Pedro e Eva olham-se e no seu espanto há uma grande alegria.
[in Sartre, Jean-Paul, Os dados estão lançados, Ed. Presença, 1983, pp 75]

Poder sonhar com essa possibilidade!... ou não ser necessário por, eventualmente, no nosso caso, a direcção não ter caído no erro descrito no Artigo 140! (esqueço-me que ainda estou na Terra e que acredito pouco no destino)

Os dados estão lançados


Guy Bourdin

Olham-se e dançam em silêncio por um momento.
- Diga-me - pergunta Pedro de repente -, o que é que se passa? Não pensava senão nos meus aborrecimentos há bocado e agora estou aqui. Danço e não vejo senão o seu sorriso... Se isto fosse a morte...
- Isto?
- Sim, dançar consigo sempre, só a ver a si, esquecer tudo o resto...
- E depois?
- A morte valia mais que a vida. Não acha?
- Aperte-me com força - diz ela baixinho.
Os rostos estão muito perto um do outro. Dançam ainda um instante e ela repete:
- Aperte-me com mais força...
Bruscamente, o rosto de Pedro entristece-se. Pára de dançar, afasta-se um pouco de Eva e exclama:
- É uma comédia. Nem sequer cheguei a tocar a sua cintura...
[in Sartre, Jean-Paul, Os dados estão lançados, Ed. Presença, 1983, pp 72-73]


Partilhar as memórias da leitura deste livro
com ela (leiam "Depois do ócio...o elogio do amor"), foi um prazer. Entretanto, ele lembrou-nos que este ano temos mais um pretexto para falar de Sartre (aqui e aqui) e para reeditar este livro em Portugal! Esta obra-prima, manifesto de consciência de classe, furioso arranca-corações, guião de cinema, livro de culto, anda desaparecida há tanto tempo...

Influência dos pais

Venho de uma daquelas famílias em que a minha mãe tinha um rolo extra de papel higiénico em cima do autoclismo, atrás da sanita, metido num saquinho de lã com um pompom. Não sabia se aquilo servia para as pessoas não saberem que tínhamos um rolo extra de papel higiénico ou se a minha mãe achava que até o papel higiénico tinha vergonha de ser o que é. O papel higiénico tinha um chapeuzinho, o cão tinha uma camisola e os braços e as costas do sofá tinham uns paninhos a protegê-los. Nunca senti necessidade de experimentar drogas. A minha realidade já estava alterada.


in Jerry Seinfield
Linguagem Seinfield
Gradiva Produções Fictícias, 2004

Os contrários


Paul Rapp

O livro parece inocente, tem imagens coloridas, apelativas, os desenhos são amorosos. Li-o várias vezes às minhas filhas. Hoje voltei a pegar nele e de repente percebi como, sem querer, exercemos condicionamentos (quase ideológicos) sobre as nossas crianças. Através de uma sucessão de ilustrações legendadas, o que me parecia ser muito pedagógico, tornou-se perigoso. Exemplos daquilo a que Bourdieu chamava "violência simbólica":

A melhor amiga da Marta chama-se Dina. Qual é o nome da menina de pele escura?
O avozinho e a tia Teresa vieram aos anos da Marta. Qual dos dois é o mais magro?
A Marta tomou um duche. Os cabelos estão molhados. O que é que a mamã da Marta deve fazer para lhe secar os cabelos?
A mãe muda a fralda que cheira mal. A Marta está a cheirar água-de-colónia. Ela está a sentir um cheiro bom ou mau?
A mamã prepara os legumes. Alguns comem-se cozidos e outros crus. Como é que tu gostas de comer as batatas?
Com o que é que apanhamos os cabelos? Apanhamos ou não os cabelos, antes de os pentear?
A Marta recebeu no Natal um urso novo mas o que ela prefere está muito usado/O Hugo está a fazer construções...
A Marta é simpática e empresta a boneca à Inês. Porque é que o Hugo é mau? (o Hugo arrancou a boneca à Inês e puxa-lhe os cabelos)


É claro que existem outras ilustrações que são neutras e divertidas e muito úteis. Mas talvez valesse a pena comprar outro livro de "Os Contrários"!!! ...se não se desse o caso da literatura infantil reproduzir sistematicamente este modelo, em termos de perfis, tarefas e papéis sociais, para cada um dos géneros. Não há menina que escape à superestrutura dominante nem rapazinho que não se sinta mal se não gostar de "construções"!
[Os Contrários, Dicionário por imagens dos pequeninos
Ed. Fleurus
]

3.4.05

O primeiro de todos os meus sonhos



O primeiro de todos os meus sonhos era sobre
um amante e o seu único amor,
caminhando devagar(pensamento no pensamento)
por alguma verde misteriosa terra
(E.E. Cummings)

Quando elas nasceram, ainda um pouco trôpega, comecei por vê-las assim, pouco nítidas. Pensava Finalmente vou conhecê-las! Reconheci de imediato uma delas, era o meu bébé imaginado. Depois fixei a irmã, Olha o meu bébé surpresa!

Mudaram quase tudo na minha vida. Logo cedo, percebi duas coisas: que amor e paixão podem andar juntos uma vida inteira. e que amar pode conter-se na palavra Dádiva (o conceito defensivo do amor como uma troca esmoreceu).

As horas levantam-se e o amanhecer deixou de se despir de estrelas. Neste amanhecer vou olhar para as minhas estrelas com uma canção na boca. Tesouros são os meus tesouros, as minhas meninas de oiro.

nascidas entre as 12h:00 e as 12h:02 há 5 anos!



PS: Obrigada

sou uma pequena igreja(não uma grande catedral)

sou uma pequena igreja(não uma grande catedral)
longe da opulência e imundície das apressadas cidades
---não me preocupo se os dias mais breves se tornam brevíssimos,
não tenho pena quando sol e chuva fazem abril

a minha vida é a vida do ceifeiro e do semeador;
as minhas orações são orações da terra onde desajeitadas lutam
(encontrando e perdendo e rindo e chorando)as crianças
cuja qualquer tristeza ou alegria é meu tormento e meu aprazimento

à minha volta surge um milagre incessante
nascer e glória e morte e ressureição:
sobre o meu ser adormecido flutuam flamejantes símbolos
de esperança,e eu acordo para uma perfeita paciência de montanhas

sou uma pequena igreja(longe do alucinado
mundo com o seu enlevo e angústia)em paz com a natureza
---não me preocupo se as noites mais longas se tornam longuíssimas;
não tenho pena quando a calma se torna canto

de inverno a primavera,ergo a minha espiral diminuta para
o misericordioso Ele Cujo único agora é para sempre:
permanecendo erecto na verdade imortal da Sua Presença
(acolhendo humildemente a Sua luz e orgulhosamente as Suas trevas)


E.E. Cummings
in livrodepoemas

Voltou à casa do Pai

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Nem todos têm o desígnio de ser artistas no sentido específico da palavra. Mas, segundo a expressão do Génesis, a cada homem é confiada a tarefa de ser artífice da própria vida; de certo modo, deve fazer dela uma obra de arte, uma obra-prima.

João Paulo II (1920-2005)

2.4.05

A hora que te espreita é só tua

Às vezes acontecem-nos coisas bonitas, simples. MG enviou-me um desenho. Eu não o conheço nem ele me conhece. Mas uma amiga já me falara do seu talento. Uma vez por semana MG oferece-lhe um desenho. Já vi alguns. É só por isso que sei que este desenho que me chegou por email é dele.

MG, dr posso entrar


MG, a hora que te espreita é só tua!
E obrigada!

1.4.05

Dia 1 de Abril não é o Dia das Mentiras. É o dia em que a minha irmã faz anos! Parabéns Carla!

Notícia de última hora ou Hitchcock em Aveiro

Depois de Bodega Bay, na Califórnia, foi a vez de Aveiro, na Beira Litoral (Portugal), viver momentos de terror, quando milhares de pássaros se instalaram na cidade e começaram a atacar pessoas.

Daphne Du Maurier, uma escritora inglesa a residir nesta cidade, estava à varanda de sua casa às 8:00, poucos minutos antes do início do ataque e não se apercebeu de nenhum sinal. "Ouvi apenas um sussuro de notas agudas, como um cântico celestial, o céu estava lindo..., lembro-me de dizer à minha filha Rebecca que era um bom dia para fazermos um passeio no Canal".


MRF, Aveiro
Alfred, empregado da barberia It's Cock, confessou ter ficado assustado com a violência do ataque. "Ninguém previa que uma coisa destas pudesse acontecer, eu por exemplo, dada a calmaria de clientes, estava a passar pelas brasas... até que fui despertado por gritos".

MRF, Aveiro
Evan Hunter só se apercebeu da passagem dos pássaros quando viu o estado em que deixaram a casa Major Pessoa.

MRF, Aveiro
Os pássaros começaram a concentrar-se ao pé do Hotel Arcada e rapidamente definiram como seu esse território.

MRF, Aveiro