25.1.10

À escuta #99

Fomos ver Avatar. Projeccionista ausente e sala toda de óculos a ver o filme em versão normal e com legendas tremidas. Todos felizes menos elas. "Não consigo ler!"
Lá fui pedir para corrigirem e então ah, finalmente, 3D!

Apesar dessa minha contribuição para o interesse geral, é provável que o restante público preferisse outra companhia. Perguntas: este é ele? isto é um sonho? o avatar pode morrer? estes são bons ou maus? como é que fizeram isto? não há montanhas suspensas, pois não? eles são índios? os índios dos outros planetas também podem ter setas? achas que ela gostava dele se soubesse que ele era paralítico? mas ele não ia poder saltar! (e eu, todo o tempo, "falem baixo")

Conclusão filosófica da A.: "Já reparaste que os humanos bons são muito poucos? E ele no final prefere deixar de ser humano... Não é lá muito boa ideia... Não sei como é que este filme vai ganhar um Oscar!" (de resto, depois de qualquer cena violenta, ela repetia a frase: "adeus Oscar!")(eu não sabia que ela já tinha ouvido falar desses prémios e que já era crítica quanto às escolhas da Academia!)

Conclusão pragmática da S.: "É giro! A xxxxx já tinha dito que era muito ecológico! E dura três horas mas nem parece! Mas é claro, eu já sabia, o bonzinho vence todos e casa e vai ser muito feliz. É sempre assim!" (quando a irmã se assustava, dizia-lhe: "isto é tudo a fingir!")

Eu diverti-me.

24.1.10

Quarto com vista para a cidade de Aveiro

Não sei se foi a capela de S. Gonçalinho que inspirou (também) uma forma particular de arquitectura no casario dos bairros de Beira-Mar e Vera Cruz. Ou se aquelas águas-furtadas apenas visavam alcançar um horizonte mais longínquo, cheio de luz e de Ria. Ou se a tradição é tão antiga que já se desconhecem as razões. Talvez a ignorância seja minha. Naquele dia, começava um novo ano. Boa razão para tirar os olhos do chão e olhar para cima. Descobri esta regularidade no topo do mundo de várias casas. Como um sinal de pertença. (mais fotos no Quarto)

Fotos MRF

21.1.10

Mau demais!

Pinto da Costa, Antero Henrique (director-geral da SAD do FC Porto), Valentim Loureiro, João Loureiro, Pinto de Sousa (Presidente do Conselho de Arbitragem), Júlio Mouco (Vogal da Comissão de Arbitragem da Liga), Deco (jogador), António Araújo (empresário de jogadores), Tavares Teles (jornalista), Jacinto Paixão (árbitro), Paulo Silva (árbitro), Augusto Duarte (árbitro) & Companhia (i)limitada.

É mau demais mas não é novidade para ninguém. A máfia portuguesa ligada ao futebol é fatela, fala mal, é estúpida mas tem a mania que é boa, ... e continua impune apesar de todas as provas. As
Escutas telefónicas envolvendo estas ilustres personalidades estão no Youtube. Reportam ao ano de 2004. Estão todos bem, a vida é boa, mandam saudações!

Adenda: As escutas «pertencem a processos conexos ao Apito Dourado, no âmbito dos quais o dirigente portista [Jorge Nuno Pinto da Costa] foi ilibado em tribunal». Como é possível ter sido «ilibado»? Querem convencer-me de que neste processo não há matéria para sentenças punitivas? E só se problematiza o que (também) é óbvio - que foi cometido um cibercrime? Espero que o cibercriminoso seja igualmente (re)compensado.

O nascimento

Mais um bocadinho de A Vida e Opiniões de Tristam Shandy, de Laurence Sterne (Antígona, pp. 278-279):

«- Vamos lá então a ver, boa mulher, tereis afinal a bondade de me dizer se não pode ser tanto a coxa, como a cabeça da criança? - É de certeza a cabeça, replicou a parteira. Porque, continuou o Dr. Slop (virando-se para o meu pai), por muita certeza que estas velhas senhoras tenham, - trata-se de um questão difícil de saber ao certo, - e todavia da maior consequência que se saiba; - pois, Senhor, se se troca a anca pela cabeça - há a possibilidade (se for rapaz) de o fórceps *******************************************************************************************************************************************************************************************************************
- Que possibilidade seria foi o que o Dr. Slop segredou baixinho ao meu pai, e depois ao meu tio. - Tal perigo não existe, continuou ele, se se tratar da cabeça. - Não, é verdade, disse o meu pai, - mas se a vossa possibilidade já tiver ocorrido na anca, - mais vale é arrancar a cabeça também.»

À escuta #98

S. ao telefone com o pai:
- Sim, papá querido.
- Claro, papá querido.
Eu comento:
- Acho que também vou viajar para passar a ter esse tratamento tão amoroso...
S.:
- Papá querido, a tua mulher está a ter um ataque de ciúmes. Mas ela não sabe que és o meu mais-que-tudo?


[Vou ali ler uns manuais de psicanálise e já venho!]

20.1.10

À escuta #97

A. vê-me nua a andar pela casa (ia tomar banho a seguir!). Comentário:
- Há umas revistas com mulheres nuas, qualquer dia apareces numa...

19.1.10

À escuta #96

- Então, gostaste da viagem de estudo? O que é que gostaste mais?
A - O autocarro passava filmes, foi fantástico!
- Por favor, então vais ao Castelo de Guimarães, à Citânia de Briteiros, e dizes-me que gostaste dos filmes do autocarro?
A - Ok, pronto, gostei muito da Citânia de Briteiros. Mas se não houvesse filmes, a viagem tinha sido uma seca!

17.1.10

A Vida e Opiniões de Tristam Shandy


Espero que tenham lido Memórias Póstumas de Brás Cubas (1880) de Machado de Assis. O tom é irónico e sarcástico e, para nosso deleite, Brás Cubas é até capaz de se revelar hostil com o leitor. Foi através das Memórias Póstumas que cheguei a outra obra, A Vida e Opiniões de Tristram Shandy (1759-1767) de Laurence Sterne. A influência é clara. Enredo (aparentemente) sem estrutura, muito humor, diálogos vis e sarcásticos com o leitor, um narrador proposto a oferecer, ao seu ritmo e com as interrupções que considerar necessárias, a sua extraordinária biografia e obra. Está a ser um verdadeiro prazer conhecer Tristam, este nobre cavaleiro do século XVIII. Se tiverem dúvidas, espreitem só os primeiros capítulos:

«Quem me dera que o meu pai, ou a minha mãe, ou ambos, para dizer a verdade, uma vez que ambos estavam de serviço na ocasião, tivessem prestado mais atenção ao que estavam a fazer quando me conceberam; tivessem eles tomado em devida conta o quanto eu dependia daquilo que estavam a fazer; - já que não estava em causa apenas a produção de um Ser racional, mas possivelmente a boa formação e temperatura do seu corpo, talvez até o seu génio e a qualidade do seu espírito; - e, apesar do que pudessem pensar em contrário, mesmo a fortuna da sua casa podia ser determinada pelos humores e disposições que fossem então dominantes: - Tivessem eles tomado tudo isto em devida conta, e procedido em conformidade, - estou verdadeiramente convencido que eu teria feito outra figura no mundo, muito diferente daquela em que o leitor provavelmente me vai ver. - Podeis acreditar, boas almas, que isto não é assim uma coisa tão insignificante como muitos de vós podereis pensar; - já todos vós, atrevo-me a dizê-lo, tereis ouvido falar dos espíritos vitais, de como eles se transfusionam de pai para filho, etc. etc. - e de muitas coisas desse teor: - Pois bem, podeis crer na minha palavra, nove em cada dez partes do senso ou da sandice de um homem, dos seus sucessos e fracassos neste mundo, dependem dos movimentos e actividade daqueles espíritos, e dos diferentes trajectos e calhas que tomam, de tal modo que uma vez postos em marcha, bem ou mal, não é assunto de meia tigela - ei-los que se lançam com estardalhaço num corropio imparável; e ao pisarem e repisarem sempre os mesmos passos, acabam por fazer deles uma estrada, tão plana e direita como um caminho da horta, da qual, uma vez que a ela se hajam acostumado, nem o próprio Diabo por vezes os consegue afastar.

Dizei-me cá, meu amor, disse a minha mãe, não vos esquecestes por acaso de dar corda ao relógio? ---------- Valha-me D___! gritou o meu pai, lançando uma interjeição, mas tendo o cuidado de moderar a voz ao mesmo tempo, --- Onde é que alguma mulher, desde a criação do mundo, interrompeu um homem com pergunta tão disparatada? Perdão, o que estava o vosso pai a dizer? - Nada.

(...) foi no mínimo uma pergunta muito disparatada - porque disseminou e dispersou os espíritos vitais, cuja função era escoltar e ir de mão dada com o HOMUNCULUS*, conduzindo-o são e salvo ao lugar destinado à sua recepção.»


* Homunculus: "Pequeno Homem", isto é, o espermatozóide, que no século XVIII era concebido como um ser humano completo em formato microscópico. O esperma teria a função de transportar o homunculus na concepção. [Nota do tradutor, Manuel Portela]


in Laurence Sterne (1998). A Vida e Opiniões de Tristam Chandy. Lisboa: Antígona. Parte Primeira - Volumes I-IV. pp. 57-59


Imagem: Retrato de Laurence Sterne da autoria de Sir Joshua Reynolds, 1760.

16.1.10

Haiti


No Haiti, o céu ainda não desabou. Para onde olhar se quisermos esquecer? Dizem que se ouvem cantos nas ruas. Não podemos sequer imaginar. mesmo que as imagens que nos chegam sejam numerosas. Dei nada. Senti-me uma moeda. Mas aconselham-nos a fazê-lo se queremos ajudar.



Foto MRF
Um dia qualquer

13.1.10

Avant de disparaître, Amour...

Le Lignon


«Auprès de l'ancienne ville de Lyon, du côté du soleil couchant, il y a un pays nommé Forez, qui en sa petitesse contient ce qui est de plus rare au reste des Gaules. Depuis des temps fort reculés, les bergers se retrouvent sur les rives verdoyantes et fertiles du plus beau et impétueux des cours d'eau, Le Lignon. Celadon est follement épris d'Astrée et sa passion n'a d'égale que la haine que se vouent leurs péres Alcippe et Alcé. En societé, les amants feignent la distance mais vivent des rendez-vous secrets. Tant d'amour afflige le jaloux Sémire qui sème le doute dans l'esprit d'Astrée.

Un matin de printemps, sur la rive gauche du Lignon, Astrée, se croyant trompée, répudie violemment Céladon. Incappable de prouver sa sincerité, le berger désespéré se jette les bras croisés dans les eaux tumultueuses de la rivière qui l'emporte, ne laissant surnager que son chapeau. Céladon gît, inconscient, sur l'autre rive du Lignon. Les nymphes Léonide, Galathé et Silvie décident de l'emmener au Palais d'Isoure pour le secourir...»

Honoré d'Urfé, L'Astrée, Livre 1 (1607-1628)
Ed. Communauté de Communes du Pays d'Astrée, 2000, p. 7
__________

Foi este Verão que conheci os amores dos pastores Astrée e Céladon. O filme de Eric Rohmer, de que me tornei fã depois de, há já muito tempo, passar noites no Quarteto a ver vários dos seus Contos (ah, primeiro a surpresa que foi Pauline à la Plage!), andava talvez pelo meu espírito. Mas Le Forez não era Rohmer, para mim. Ele era Sul de França, Marselha de preferência. Não, Le Forez era a França bucólica pintalgada de palácios inesperados, como por exemplo
Le Chateau de la Bastie d'Urfé, uma construção medieval que o avô de Honoré, Claude d'Urfé, transformou num faustoso monumento renascentista a partir de 1549. Foi aí, no seu Pays, mais precisamente em Saint-Etienne-le-Molard, que descobri L'Astrée. Rohmer terá andado por lá. Tomou uma bebida nos jardins. Visitou alguma exposição temporária. Certamente passou muito tempo no interior do palácio, local onde Honoré escreveu a sua mais famosa obra. Ou talvez não. Eric Rohmer partiu para o Palais d'Isoure e, contrariamente a Céladon, vai guardar o mistério da sua ausência.



Mas que importância teve a obra que inspirou Eric Rohmer no seu último filme?

L'Astrée conheceu um enorme sucesso literário na época do seu aparecimento (início século XVII). Os amores contrariados dos pastores de Lignon apaixonaram as cortes da Europa. Os seus cinco volumes contêm cerca de 5000 páginas. Honoré d'Urfé (1567-1625) terá deixado a obra inacabada e provavelmente terá sido Balthazar Baro (1600-1650), seu secretário, a redigir o final do V volume. A primeira edição completa do romance foi publicada em 1632 graças ao livreiro Augustin Courbé. Na altura, publicavam-se poucas obras de autor e os livros continham um simples frontispício. L'Astrée é o primeiro romance pastoral composto com retrato do autor e da heroína e um total de 60 gravuras. Em 1647, uma segunda edição inclui ilustrações desenhadas por Daniel Rabel. O sucesso da obra e das gravuras é tão grande que a sua influência se estende a outras artes. No final do século XVII, L'Astrée torna-se um dos motivos favoritos das
faianças de Nevers ou dos tecelões da Flandres. O interesse que Rohmer viu em L' Astrée? Não há nada como as suas próprias palavras:

«J’avais un préjugé contre ce roman pastoral comme on en a eu depuis le xix siècle alors que L’Astrée avait connu un succès immense depuis le règne de Louis XIV jusqu’à la Révolution française. Mme de Sévigné en parle avec chaleur, Rousseau, également, qui l’a lu avec délices dans sa jeunesse. L’Astrée est exactement contemporaine de Don Quichotte, qui est bâti sur une illusion, et les deux oeuvres ont des motifs communs. La vraie découverte que j’ai faite, c’est le style plus encore que la langue ou les thèmes. C’est la qualité des dialogues, leur caractère moderne, ou plutôt intemporel. Ces dialogues sont très compréhensibles aujourd’hui, davantage que ceux, pourtant postérieurs, de Corneille dont la langue est plus archaïque que celle d’Honoré d’Urfé» [Ler entrevista completa no
Magazine Littéraire]

«Une épaisse fumée sort de la fontaine. Um petit Amour brillant de clarté s'élève sur un socle de porphyre tenant une table de marbre noir tandis que lions et licornes se figent en figures de marbre. Avant de disparaître, Amour invite l'assemblée à revenir pour entendre l'oracle.

Astrée, Diane, Céladon et Silvandre perdent connaissance
.»(Ibid: Livre 9, p. 119)

Adeus, Eric Rohmer!


Fotos MRF
Agosto 2009

9.1.10

À escuta #95

S - Não acho justo que só os homens possam casar uns com os outros e as mulheres não!
- Mas as mulheres também vão poder casar-se...
S - Eles só falam em homossexuais. Nunca ouvi falar de mulheres...
- "Homossexual" engloba relações entre pessoas do mesmo sexo, homens e mulheres.
S - Pensei que fosse diferente e que só os homens pudessem casar uns com os outros... até porque não se pode adoptar um bebé. Achas que dois homens vão querer adoptar um bebé?
- Alguns...
S - Poucos! Já as mulheres querem, é claro. Mas se uma mulher sozinha pode adoptar, como é que duas não podem? Até era mais fácil. Uma ia trabalhar e a outra tomava conta do bebé - imagina, por exemplo, se ele ficasse doente. Sozinha é muito mais difícil!
- Tu achas que os casais do mesmo sexo deviam poder adoptar uma criança?
S - Se fossem bons pais...
- Há pessoas que dizem que depois as crianças iam sofrer na escola, que os outros iam dizer «olha, ele tem duas mães»...
S - Mas o menino ou a menina só ia sofrer na escola se fosse muito, mas mesmo muito, ou feio ou parvo. Ninguém liga aos pais.

À escuta #94

A A. nunca mais esqueceu uma notícia que ouviu aquando dos últimos JO sobre a exclusão de cão das ementas dos restaurantes em Pequim. Nunca mais esqueceu... a ideia de que os chineses poderiam ter o hábito de comer cão. Ontem, ao final da tarde, viu passar um casal chinês com o filho, muito felizes a passear com um lindo cãozinho pela trela. Em pânico, exclamou:
- Não achas que aquele cão normalmente já estaria morto?
Tentei acalmá-la:
- Não, claro que não! Aquelas pessoas adoram o cão, vê como o menino o trata bem, e se existem alguns chineses capazes de comer cão, aquelas pessoas já têm outras ideias...
- Não sei, eles estavam a falar em chinês, não podes saber o que pensam...

[Pior mesmo foi dizer-lhe que nós gostamos de coelho e de outros animais e que isso pode parecer estranho a pessoas de culturas diferentes. Acho que vai passar a ser vegetariana.]

7.1.10

Before Sunset #5

I have 3 songs in English. One's about my cat, one's about... my ex-boyfriend, well, ex-ex-boyfriend, well, it's just a... little waltz.

A waltz?

Yeah.

Put the waltz.

I haven't played it in a while, you sure? All right, the waltz.



"Let me sing you, a waltz.
Out of nowhere, out of my thoughts.
Let me sing you, a waltz.
About this one night stand.
You were for me that night,
everything I always dreamt of in life.
But now you're gone.
You are far gone.
All the way to your island of rain.

It was for you just a one night thing.
But you were much more to me, just so you know.
I don't care what they say
I know what you meant for me that day.
I just wanted another try.
I just wanted another night.

Even if it doesn't seem quite right.
You meant for me much more than anyone I've met before.

One single night with you, little...
Jesse... is worth a thousand with any-body.

I have no bitterness, my sweet.
I'll never forget this one night thing.
Even tomorrow in other arms.
My heart will stay yours until I die.

Let me sing you a waltz.
Out of nowhere, out of my blues.
Let me sing you a waltz.
About this lovely one night stand."

5.1.10



Lhasa de Sela

Em 2005, tive oportunidade de assistir a um espectáculo de Lhasa de Sela. Comecei a ouvi-la em 1999/2000. Foi por essa altura porque me lembro que a gravidez (múltipla) das minhas filhas foi embalada pelo som e doçura das canções do Living Road. A sua morte surpreendeu-me e deixou-me triste. Relanço um post que escrevi na altura (Março 2005).


Lhasa de Sela

No início, somos muito pequeninos e por isso temos a impressão de que o espaço à nossa volta é amplo e de que todos os movimentos são possíveis. Aos poucos vamos crescendo, e então o nosso corpo começa a tocar as paredes e as mãos começam a empurrá-las, mas ainda nos sentimos felizes. Até que chega o dia em que não suportamos mais estar fechados ali, sentimo-nos condicionados e, às vezes, quase asfixiamos. De forma mágica, esse mesmo espaço começa a expulsar-nos de forma violenta. Ficamos aterrados e pensamos que vamos morrer. Mas afinal, nascemos!

Com palavras diferentes, quase soletradas em português, esta história. Contada pela Lhasa de Sela no espectáculo fantástico a que pude assistir há poucos meses. Já conhecia a música e a voz dela, mas nesse dia fiquei rendida a Tudo. até o silêncio entre duas canções me pareceu necessário.
Con toda a palavra, amigos! E vejam aqui o último álbum.

Lhasa de Sela: A nómada não canta mais

Lhasa de Sela: A nómada não canta mais
Ípsilon - 05.01.2010 - João Bonifácio

Lhasa de Sela, cantora de culto americana-mexicana que vivia no Canadá, morreu no primeiro dia deste ano, aos 37 anos. A mulher misteriosa dos discos era uma rapariga doce e esquiva, movida por um ímpeto criativo muito distante das normas habituais da indústria

Tão repentinamente como surgiu também assim partiu: Lhasa de Sela, cantora e compositora nascida em Nova Iorque, mas profundamente influenciada pela cultura mexicana, faleceu no dia 1 de Janeiro deste ano, aos 37 anos de idade, de um cancro da mama, contra o qual lutava há 21 meses. Deixou pai, mãe, irmãos, sobrinhos, e um culto de fãs indefectíveis, reflectido no milhão de cópias que os seus três discos venderam.

Desde a primeira vez que a sua voz se ouviu em disco que Lhasa surgiu aos melómanos como um ser vindo de outro mundo. Do seu álbum de estreia, La Llorona, composto a meias com o magnífico músico Yves Desroisiers, constavam apenas baladas cambaleantes, que versavam mitos pagãos mexicanos, amores de faca e alguidar, o sangue, a morte e as cartas que trazem a fortuna e a desgraça e nos traçam o destino.

Era um disco centrado na guitarra acústica de Desroisiers, com apontamentos de acordeão e banjo, mas que estava longe de ser "bonitinho", muito por força da voz de Lhasa, que dominava - ou assombrava, se quisermos ser exactos - cada canção: possuidora de uma voz grave mas ampla, Lhasa tão depressa conseguia soar ébria como apaixonada como vingativa como sensual. La Llorona cantava os mais velhos dos assuntos e Lhasa cantava-os como se existisse desde sempre, como se aquelas canções estivessem ali, há séculos, à espera de serem ouvidas. Não parecia ter 26 anos: parecia ser mais velha que Chavela Vargas, a diva mexicana com quem na altura foi comparada. Podia ter uma voz de veludo, mas aquele veludo conhecia todo o tipo de nódoas.

Irrequietude natural O êxito de La Llorona foi rápido e surpreendente, em particular tendo em conta que em 1997 o mundo não estava propriamente virado para canções acústicas cantadas em espanhol. Mas além das canções, a própria Lhasa contribuiu para o sucesso do disco: não só era tremendamente bonita como tinha igualmente uma história pessoal incomum que contribuiu, nesses dias pré-YouTube, para o mito de "mulher misteriosa" que sempre a seguiu.

Filha de pai mexicano e mãe americana-judia-libanesa, Lhasa não cresceu como a maior parte das raparigas. Os seus pais eram nómadas, e ela passou os primeiros anos de vida com eles e os irmãos on the road entre os Estados Unidos e o México. Todas as noites, em vez de ver televisão, os irmãos faziam um teatrinho ou cantavam. Isto marcou-a ao ponto de após a digressão de La Llorona se ter juntado a um circo em França.

A sua história de vida valeu-lhe o epíteto "cantora nómada", mas quem teve oportunidade de privar com ela tem a impressão de o nomadismo não se dever a uma qualquer mania aventureira, antes a uma irrequietude natural e à incapacidade de conviver com a indústria musical. Numa entrevista à Roots World, na altura do lançamento do seu segundo disco, The Living Road, em 2003, Lhasa confessava que depois da digressão do primeiro disco abandonara tudo para ir para França porque se sentia "a morrer". "Fiz tudo menos rapar o cabelo e tornar-me freira", acrescentou. A vida no circo, rodeada de alguns dos irmãos, era simples e repleta de tarefas, o que lhe agradava: "Acordo todos os dias com a minha sobrinha a dizer-me que me ama", dizia, com candura.

The Living Road era um disco mais complexo, com guitarras, banjos, melódicas. Mesmo sendo um disco mais opulento, com arranjos imaculados, soava ainda a uma carroça a desconjuntar-se na beira de uma estrada poeirenta, e voltou a merecer os encómios da crítica.
[Continuação do artigo]

Before Sunset #4

I was thinking... For me it's better I don't romanticize things as much anymore. I was suffering so much all the time. I still have lots of dreams, but they're not in regard to my love life. It doesn't make me sad, it's just the way it is.

Is that why you're in a relationship with somebody who's... never around?

Yes, obviously, I can't deal with the day to day life of a relationship. Yeah, we have, you know, this exciting time together and then he leaves and I miss him, but at least I'm not dying inside. When someone is always around me, I'm like suffocating!

No, wait, you just said that you need to love and be loved...

Yeah, but when I do, it quickly makes me nauseous! It's a disaster... I mean, I'm really happy only when I'm on my own. Even being alone... it's better than... sitting next to a lover and feeling lonely. It's not so easy for me to be a romantic.
You start off that way, and, after you've been screwed over a few times... You... you forget about all your delusional ideas, and you just take what comes into your life. That's not even true, I haven't been... screwed over, I've just had too many... bla relationship. They weren't mean, they cared for me, but... they were no real... connection, or excitement. At least, not from my side.

God, I'm sorry, is it...

Is it really that bad? It's not, right? You know... it's not even that, I was... I was fine. Until I read your fucking book! It stirred shit out from you,... It reminded me how... genuinely romantic I was, how I had so much hope in things and... now it's like... I don't believe in anything that relates to love, I don't feel things for people anymore. In a way... I put all my romanticism into that one night and I was never able to feel all this again. Like... somehow this night took things away from me and... I expressed them to you and you took them with you! It made me feel cold, like if love wasn't for me! I... I don't believe that. I don't believe that. You know what? Reality and love are almost contradictory for me. It's funny... Every single of my ex-es... they're now married! Man go out with me, we break up, and then they get married! And later they call me to thank me for teaching them what love is, and... that I taught them to care and respect women!

I think I'm one of those guys.

You know, I want to kill them! Why didn't they ask me to marry them? I would have said "No", but at least they could have asked!!! But it's my fault, I know that
it's my fault, because... I never felt it was the right man. Never!

But what does it mean the right man? The love of your life?

The concept is absurd, the idea that we can only be complete with another person is... EVIL! Right?

Can I talk?

You know, I guess I've been heart broken too many times. And then I recovered. So now, you know, form the starts, I make no effort. Because I know exactly what hap...
You can't do that. You can't do that, you can't live your life trying to avoid pain,
at the expense of en...
Ok, you know what? Loose our words! I've gotta... I've gotta get away from you... Stop the car, I want to get out!

No, no, no, don't... don't get out... You know, it's being around you... Keep talking...

Don't touch me! You know, I wanna get on a cab... Monsieur... Monsieur, arrêtes vous!

No, no, no, don't, keep going...
No, listen, I'm just so happy... thank you, just keep going...
All right. Look, I'm just so happy, all right... to be with you. I am. I'm so glad you didn’t' forget about me.

No, I didn't... and it pisses me off, ok? You come here to Paris, all romantic and married. Ok? Screw you! Don't get me wrong, I'm not trying to get you, or anything. I mean, all I need is married man! There's been so much water under the bridge, it's... it's not even about you anymore, it's about that time, that moment in time, that is forever gone, I don't know!


Richard Linklater
Julie Delpy
Ethan Hawke
(Before Sunset, 2004)

3.1.10

Before Sunset #3

I remember thinking at the time, that... so many of the men that I admire most, you know, that their lives were... were dedicated to something greater than themselves...

So, you got married because men you admire were married?

No, no, no, it... It's more like I have this... this idea of my best self! You know? And I wanted to pursue that... even if might have been overwriting my honor other self! You know what I'm saying? I mean, it's funny like... in the moment, I remember thinking that it didn't much matter the "Who?" of it all... I mean, that nobody is gonna be everything to... And that ultimately, it's just a simple action of committing yourself, you know, meeting your responsibilities that... that matters. I mean, what is love? Right, if it's not respect, trust, admiration? And I... I felt all those things! So, cut to the present tense, I feel like I'm running a small nursery with somebody I... used to date. I mean, I'm like a monk, you know. I mean, I've had sex less than... 10 times in the last 4 years.

What?

What, what? Are you laughing at me?

No.

It sounds pathetic?

What monastery you know where monks have sex 10 times?

Ok, I'm doing better than most monks. All right? But I do, I feel like if somebody were to touch me, you know, I would dissolve into molecules.


Richard Linklater
Julie Delpy
Ethan Hawke
(Before Sunset, 2004)

1.1.10

... e regresso a casa

X

EPIGRAMA II

Uma boa notícia chegou de longe,
num dia qualquer, tarde demais
far-se-á justiça; e regresso a casa

Eduardo Graça, in Poemas Manuscritos
Edição de Autor, Novembro 2009